Milly Lacombe

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OpiniãoEsporte

O que a seleção masculina veria se tivesse coragem de olhar o espelho

Quem aguentou assistir até o final ao jogo da seleção brasileira nesse 2 de julho talvez mereça um prêmio. Uma partida tenebrosa do Brasil, um time recuado, tedioso e medroso que ouviu o estádio praticamente inteiro gritar "olé" em duas ocasiões nas quais a Colômbia tocava para lá e para cá. Faz anos que a seleção masculina confunde raça com brutalidade. Quanto mais se sentiam humilhados em campo, mais batiam, reclamaram, gesticulavam.

Quem acompanha de perto esses jogos sabe que não estamos falando de um jogo isolado: o Brasil é isso em campo faz muitos anos.

Para resolver um problema a primeira coisa a fazer é detectá-lo e nomeá-lo. A CBF ainda não fez isso apesar dos sinais fartos. Sabemos que não fez porque as entrevistas dizem isso claramente: somos os maiores. Todos temem nos enfrentar. Essa camisa pesa. Com a gente não tem firula, vamos para cima.

A camisa de fato pesa, mas seu valor vem diminuindo a cada jogo.

Hoje somos tristes e apequenados. Não driblamos e, quando driblamos, o recado é: "precisava?". Não somos arrojados, nem solidários, nem criativos. É um monte de indivíduos com a bola nos pés, um "cada um por si" melancólico.

O "jogo bonito" que tanto foi associado ao nosso nome e à nossa camisa escafedeu-se. Temos problemas de base que deveriam ser endereçados: não formamos mais meias, formamos volantes. Não falamos mais em beleza, falamos em defesa. Não temos uma filosofia de jogo, temos essa busca sempre triste por "eficiência". Endrick, a maior revelação em bastante tempo, não entra ou entra tarde. Vai ser titular quando tiver sido devidamente acalmado: menos, meu filho. Bem menos. Pra que essa alegria aí? Contenha-se.

É, sob muitos aspectos, o time de Neymar - com ou sem Neymar. É o espírito de Neymar que está em campo. Individualista, confrontador, egoísta. Qualquer crítica é recebida com rancor e a missão passa a ser revidar.

Estamos muito mal. Já estávamos antes do 7x1. Depois, ao escolhermos ignorar a tragédia e apontá-la como acidente, pioramos.

Uma seleção deveria refletir o que somos culturalmente. Essa seleção nos define institucionalmente: é careta, conservadora, medrosa, raivosa, confrontadora, tediosa. Um time que depende de Vini Jr. inspirado. Pode ganhar a Copa América? Eu diria que é bastante improvável, mas não impossível. Temos bons jogadores que, em seus piores dias, podem fazer coisas boas se ousarem se soltar da amarra do jogo posicional. Então, impossível não é. Mas, ainda que vença, todo o diagnóstico acima se mantém: o Brasil não é mais o Brasil com a camisa amarela.

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A CBF tem o poder político para virar esse jogo. Resta saber se tem o desejo.

Opinião

Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do UOL.

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