Comportamento

Por Por Yara Guerra


A força de mordida de um cachorro é medida em pounds per square inch (PSI) — Foto: ( Unsplash/ CreativeCommons/ Kobi Kadosh)
A força de mordida de um cachorro é medida em pounds per square inch (PSI) — Foto: ( Unsplash/ CreativeCommons/ Kobi Kadosh)

Músculos tensos, olhar desconfiado e rosnados intimidadores. Seja com chihuahuas pequenos ou rottweiler ferozes, você provavelmente também já sentiu medo de um cão. E essa preocupação com animais aversivos está constantemente ligada a um fator: a sua mordida.

Quando esse é o tema, muitos se perguntam qual cachorro tem a mordida mais forte. Por muito tempo, cientistas e pesquisadores têm se empenhado em resolver esta questão. Há hoje alguns estudos respeitáveis publicados sobre o assunto, mas é importante dizer que praticamente todos apresentam falhas.

Isso porque é difícil fazer com que um animal morda com força total sob um comando. Os métodos utilizados nas pesquisas foram vários, como a utilização de dispositivos de medida escondidos em couro cru ou estimulação dos músculos mandibulares a partir de corrente elétrica, sob anestesia. Nestes casos, a metodologia dispensa a intenção por trás da mordida, o que provavelmente distorce os resultados.

Já outros pesquisadores optaram por análises in vitro, utilizando medições com crânios secos de cachorros. No entanto, eles não imitam com precisão as medições de força de mordida consciente.

De forma geral, hoje em dia, se mede a força de mordida de um cão a partir da escala Pound force per Square Inch (PSI) – ou seja, libra-força por polegada quadrada.

Há muitos fatores que influem em uma mordida forte; a anatomia é um deles — Foto: ( Pexels/ Blue Bird/ CreativeCommons)
Há muitos fatores que influem em uma mordida forte; a anatomia é um deles — Foto: ( Pexels/ Blue Bird/ CreativeCommons)

Segundo a médica-veterinária Thamara Cozzi, mestranda e membro do Laboratório de Pesquisa Morfológica Animal da UFRA, esta medida depende diretamente da volição do bicho. "A força com que o animal pode morder depende da consistência do objeto e da intenção a que é submetido, como brincadeira, defesa, proteção, competição, etc", diz.

Esta força é gerada a partir da interação entre um conjunto de elementos: músculos mastigatórios, mandíbulas e maxilas, articulações temporomandibulares (ATMs) e dentes. E, como é de se esperar, cachorros com crânios e mandíbulas diferentes apresentarão forças distintas.

Um pouco de anatomia

Mas Dra. Thamara acrescenta que a aptidão e treinamento do animal têm muita importância na medida de força. "A genética influencia na expressão de aptidão do animal e o treinamento o direciona para realizar determinada atividade. Sendo assim, não significa que todo pit bull será agressivo e causará acidentes com mordeduras. Em geral, cães de guarda possuem maior musculatura e porte físico, decorrente do processo evolutivo das raças. Animais de caça desenvolvem focinhos maiores, com potencial de maior farejamento", diz.

Ela explica ainda que existem raças que podem ser, simultaneamente, de caça e guarda, como o pastor alemão. Largamente usado no exército e polícia, o bicho possui focinho longo e porte físico robusto.

Pesquisadores e cientistas defendem que a força mandibular está diretamente associada ao tamanho do crânio — Foto: ( Pexels/ Pixabay/ CreativeCommons)
Pesquisadores e cientistas defendem que a força mandibular está diretamente associada ao tamanho do crânio — Foto: ( Pexels/ Pixabay/ CreativeCommons)

Já para Carlos López Plana, professor da Faculdade de Medicina Veterinária da Universitat Autònoma de Barcelona e um dos autores do Atlas dos Músculos do Cão, há muita diferença de força entre as raças e uma relação direta com a anatomia.

"Os músculos da mastigação têm a função de elevar a mandíbula, aproximando-a do crânio, e, por isso, são fundamentais na mordida. Esses músculos são os temporais, masseteres e pterigóides. Destes, o osso temporal é o maior e talvez o mais funcionalmente importante em espécies carnívoras, como o cão", explica.

Ele defende que a área de inserção muscular nos ossos do crânio é claramente maior em raças de cães com maior força de mordida. Além disso, a forma dessas áreas de inserção também é variável entre as raças.

"Por exemplo, a crista sagital externa, localizada nos ossos parietal e occipital, é muito marcada em raças como o rottweiler ou várias raças de mastim, enquanto é praticamente inexistente no beagle. A existência de uma crista sagital externa marcada e grande implica uma maior superfície de inserção muscular para o músculo temporal. Consequentemente, o beagle terá uma força de mordida menor do que um rottweiler", diz o especialista.

Cães de guarda x cães de caça

Os cães de guarda, a exemplo de pastor alemão, rottweiler, fila brasileiro e dogue alemão, apresentam um conjunto de características que os colocam no topo da lista de mordidas mais fortes.

Eles têm o masseter (músculo do maxilar inferior) muito forte e os ossos da maçã do rosto (chamados de arco zigomático) adaptados para sustentá-lo. Além disso, a mandíbula costuma ser curta e funciona como uma espécie de alicate. A área do focinho onde se localizam as narinas é mais curta do que a área onde fica a boca – tudo isso adaptado para que eles sejam excelentes mordedores, com mordidas que podem ser até 10 vezes mais fortes que a do homem.

Por causa da posição do nariz, eles também conseguem manter a presa em sua boca por mais tempo sem que haja interferência na respiração.

Enquanto cães de guarda são adaptados para segurar a presa por mais tempo na boca, cães de caça têm o olfato mais apurado devido ao focinho longo — Foto: ( Pexels/ Darcy Lawrey/ CreativeCommons)
Enquanto cães de guarda são adaptados para segurar a presa por mais tempo na boca, cães de caça têm o olfato mais apurado devido ao focinho longo — Foto: ( Pexels/ Darcy Lawrey/ CreativeCommons)

Já os cães de caça, como beagle, basset hound, setter irlandês e cesky terrier, apresentam características opostas. O focinho é mais avantajado e o nariz é projetado para frente, o que facilita o faro.

"Em um cão de caça, a capacidade olfativa é altamente desenvolvida. Ela depende em grande parte do número de células nervosas olfativas que estão localizadas na mucosa olfativa da cavidade nasal. O número de receptores olfativos (que, nos cães, são estimados em até 300 milhões) pode explicar as diferenças na capacidade olfativa das várias raças caninas. Outros aspectos, como a forma do focinho e da cavidade nasal, o formato, o tamanho e a mobilidade das narinas também podem ser uma vantagem em algumas raças de cães em relação a outras", diz o Dr. Carlos.

Raças de cachorro com maior força de mordida

De acordo com Dra. Thamara, boa parte das raças com maior força mandibular são aquelas de aptidão de guarda.

"Anatomicamente, estes animais possuem mandíbulas avantajadas. Em geral, estas raças são usadas no exército, na polícia ou para segurança de estabelecimentos. No Brasil, as que possuem maior força de mordedura medida por PSI são rottweiler, dobermann, pastor alemão e pit bull", diz.

Assim, mordida mais forte não significa, necessariamente, tamanho maior ou cachorro mais estressado. O que vale aqui é realmente a potência dos músculos, o tamanho do crânio, a interação entre os elementos maxilares e mandibulares e a aptidão de cada animal.

Confira abaixo uma lista com os 10 cães de PSI mais alto no mundo:

1. Kangal (PSI 743)

O kangal pode lutar com animais como lobos, leões, ursos e chacais — Foto: ( Unsplash/ CreativeCommons/ Jozef Fehér)
O kangal pode lutar com animais como lobos, leões, ursos e chacais — Foto: ( Unsplash/ CreativeCommons/ Jozef Fehér)

O kangal, ou pastor kangal, é a única raça entre os sete primeiros que não é um mastim de algum tipo. Em vez disso, é um cão turco, cujas origens remontam à Ásia Central. Eles são usados como cães de pastoreio e espera-se que lutem contra leões, lobos, ursos e chacais, então não é nenhuma surpresa que suas mandíbulas sejam super fortes.

Os kangais também podem ser bons animais para se ter em casa, mas sempre estarão alertas.

2. Bandog (PSI 730)

Acredita-se que o bandog seja uma mistura entre o pit bull terrier e o mastim napolitano — Foto: ( HLeeRobinson/ Wikimedia Commons )
Acredita-se que o bandog seja uma mistura entre o pit bull terrier e o mastim napolitano — Foto: ( HLeeRobinson/ Wikimedia Commons )

Esta raça (também conhecida como mastim bandog) remonta à Inglaterra e acredita-se que seja uma mistura do pit bull terrier e do mastim napolitano. É provável que haja outro DNA misturado, sendo o buldogue alemão uma das possibilidades mais citadas.

Esta raça é rara e geralmente não é reconhecida por clubes de canil ou outros órgãos governamentais. O nome vem do fato de que eles foram acorrentados até serem necessários como cães de guarda ou de guerra. Apesar disso, a raça pode ser emocionalmente carente.

3. Cane corso (PSI 700)

Apesar de ser um tipo de mastim, o cane corso é mais musculoso que outros cães do mesmo grupo — Foto: ( Unsplash/ CreativeCommons/ Reid Naaykens)
Apesar de ser um tipo de mastim, o cane corso é mais musculoso que outros cães do mesmo grupo — Foto: ( Unsplash/ CreativeCommons/ Reid Naaykens)

O cane corso é o mastim italiano. Esses cães já foram incrivelmente comuns em todo o país, mas agora são relegados principalmente à região sul da Puglia.

Cane corsos não são tão grandes quanto outras raças do tipo mastim, pois geralmente pesam “apenas” 50 kgs ou mais. No entanto, eles tendem a ser muito mais musculosos do que seus primos, o que explica por que eles são capazes de colocar tanta força em suas mordidas.

4. Dogue de Bourdeaux (PSI 556)

O dogue de Bourdeaux costumava ajudar com trabalhos em fazendas — Foto: ( Ewa Ziemska/ Wikimedia Commons )
O dogue de Bourdeaux costumava ajudar com trabalhos em fazendas — Foto: ( Ewa Ziemska/ Wikimedia Commons )

O dogue de Bordeaux (o mastim francês) é uma raça antiga que remonta, pelo menos, ao século 14. Esses cães enormes foram colocados para trabalhar em fazendas como guardas do gado ou puxadores de carroças.

Trata-se de uma das raças do tipo mastim mais antigas do planeta, e muitas pessoas acreditam que eles descendem diretamente do extinto molossus grego, um cão de guerra gigante.

5. Tosa inu (PSI 556)

O tosa inu pode ser bastante mal humorado durante a interação com outros animais — Foto: ( Pleple2000/ Wikimedia Commons )
O tosa inu pode ser bastante mal humorado durante a interação com outros animais — Foto: ( Pleple2000/ Wikimedia Commons )

O tosa inu, ou mastim japonês, é tão grande e intimidador quanto qualquer um de seus primos. No entanto, estes cães tendem a ser reservados e vigilantes, enquanto muitos outros cães do tipo mastim são mais patetas e brincalhões.

Os tutores devem prestar atenção especial à forma como eles interagem com outros cães, pois podem ser violentos e mau humorados com animais que consideram ameaças às suas famílias ou propriedades.

6. Mastim inglês (PSI 552)

Apesar de terem muita força mandibular, os mastins ingleses não gostam de machucar alguém — Foto: ( Radovan Rohovsky/ Wikimedia Commons )
Apesar de terem muita força mandibular, os mastins ingleses não gostam de machucar alguém — Foto: ( Radovan Rohovsky/ Wikimedia Commons )

O mastim inglês é geralmente referido apenas como “o mastim” pela maioria dos clubes de canil, então eles são frequentemente usados como a linha de base do que um cão do tipo deve ser. Isso provavelmente se deve ao fato de que os kennel clubs começaram na Inglaterra, em vez de qualquer tipo de reivindicação histórica de primazia pela raça.

Os mastins ingleses são cães de temperamento equilibrado e, embora sejam capazes de machucar alguém com suas mandíbulas, geralmente detestam fazê-lo. Como resultado, é raro encontrar esses cães sendo utilizados por militares ou policiais, embora possam ser ótimos cães de guarda em virtude de seu tamanho intimidador.

7. Presa canario (PSI 540)

O presa canario pode pesar até mais de 250 kgs — Foto: ( Unsplash/ CreativeCommons/ Damir Spanic)
O presa canario pode pesar até mais de 250 kgs — Foto: ( Unsplash/ CreativeCommons/ Damir Spanic)

O presa canario, ou mastim espanhol, há muito é valorizado por sua estatura assustadora. Esses cães geralmente pesam mais de 250 kgs e foram usados como cães de guerra, de guarda e até de combate ao longo de sua história.

8. Dogo argentino (PSI 500)

Apesar de ter sido criado com a intenção de proteger a casa, o dogo argentino é bastante social — Foto: ( Smok Bazyli/ Wikimedia Commons )
Apesar de ter sido criado com a intenção de proteger a casa, o dogo argentino é bastante social — Foto: ( Smok Bazyli/ Wikimedia Commons )

Este cão sul-americano é frequentemente confundido com pit bulls ou buldogues americanos, mas, na verdade, eles têm pouco em comum com ambas as raças. Eles foram originalmente criados quando o agora extinto cão de combate de Córdoba foi combinado com outras raças grandes, como dogues de Bordeaux, wolfhounds irlandeses e mastins dos pirineus.

A raça foi criada com o objetivo de ajudar nas caçadas e proteger a casa, mas é muito social e hoje pode servir também como cão de companhia e terapia.

9. Leonberger (PSI 399)

O leonberger pode ser usado como cão de resgate e fins de busca — Foto: ( Dafping/ Wikimedia Commons )
O leonberger pode ser usado como cão de resgate e fins de busca — Foto: ( Dafping/ Wikimedia Commons )

Gigantes e peludos, estes cachorros não pertencem à raça mais popular e conhecida, mas, devido ao seu tamanho (geralmente pesam mais de 70 kgs), não é surpresa que eles possam machucar a cada mordida. Ao contrário de muitas outras raças nesta lista, os leonbergers são usados principalmente para fins de busca e resgate, em vez de serviço de guarda ou trabalho policial.

10. Rottweiler

Se não forem adestrados, os rottweilers podem ser intimidantes e perigosos — Foto: ( Unsplash/ CreativeCommons/ Joel Moysuh)
Se não forem adestrados, os rottweilers podem ser intimidantes e perigosos — Foto: ( Unsplash/ CreativeCommons/ Joel Moysuh)

Das três raças (rottweilers, pit bulls e pastores alemães) que são mais comumente suspeitas de ter as mordidas mais fortes no mundo dos cães, na verdade é o rottweiler que pode colocar mais força por trás de cada mordida. Eles mal chegaram ao top 10, no entanto.

Estes cães são animais grandes e intimidadores, e podem ser perigosos (especialmente para estranhos) se não forem treinados e socializados adequadamente. Mas também podem ser amorosos e pegajosos com os seus tutores.

Mais recente Próxima Tutores procuram casas maiores para acomodar seus pets, aponta pesquisa
Mais do Vida de Bicho

No vídeo, que bombou no Tiktok, o cachorro Harvey aparece deitado na varanda lambendo um cubo de gelo para tentar manter a temperatura do seu corpo fresca.

Cachorro lambendo cubo de gelo em vídeo hilário viraliza na internet

Saiba identificar se o seu pet é feliz!

Como saber se cães e gatos são felizes? Elencamos os principais sinais

Quando frequente e associado a outros sinais, o comportamento pode denunciar um distúrbio físico ou psicológico no bicho

Cachorro esfregando o rosto: o que pode ser?

Problemas nas articulações podem afetar a qualidade de vida de cães e gatos; saiba como evitá-los

Artrite x artrose nos pets: entenda as diferenças entre as doenças

As espécies listadas aqui entram em estado de torpor para economizar energia durante o inverno

Muito além dos ursos: conheça 10 animais que também hibernam

O alimento cru traz riscos para a saúde canina, mas é possível ofertá-lo de outras formas. Confira!

Cachorro pode comer pé de galinha? Veterinários alertam para os riscos

Conheça alguns bichos que possuem marcas únicas na pele, usadas para identificar os indivíduos

Impressões digitais: 11 animais que possuem padrões exclusivos na pele

Além da fisionomia, a personalidade dos animais também pode ser semelhante a do responsável; entenda o motivo!

Por que os pets são parecidos com os seus tutores? Desvendamos o mistério!

Diferentemente do que muitos pensam, é possível, sim, ensinar cães adultos a fazer as necessidades no local correto

Saiba como ensinar um cachorro mais velho a fazer xixi no lugar certo

A lambedura serve para perceber o mundo e tem diferentes significados dependendo do contexto em que é utilizada

Os cães usam a boca e a língua para 'enxergar' o mundo e se comunicar; entenda como!