Gastar Bem

Por Beatriz Pacheco, Valor Investe — São Paulo


Casar ou não casar, eis a questão. Pois os apaixonados com planos para uma festança têm pela frente o (sacrificante) exercício para fazer esse projeto grandioso caber no orçamento - cada vez mais apertado para o cidadão comum. O gasto médio por festa de casamento no Brasil subiu 26,7%, para R$ 57 mil, entre o começo de 2019 e o fim de 2022, de acordo com dados da plataforma Casar.com.

A alta está dentro dos parâmetros da inflação geral, acumulada 26,9% nesse mesmo período, segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Então até aí tudo bem, certo? Mais ou menos. O mérito pelo orçamento das festas ainda ter ficado dentro dessa "régua da alta" é todo da criatividade brasileira, que buscou o famoso "jeitinho" para manter os planos, mesmo diante de preços que chegaram a subir 97% nesse período. Se dependesse só do mercado, casar estaria bem mais caro.

"Mesmo que o orçamento para a cerimônia tenha ficado mais alto, de maneira geral, as festas de casamento ficaram mais simples ou menores do último ano para cá", revela Fabio Camillo, fundador e diretor-presidente (CEO) do Casar.com. Por isso o cidadão brasileiro médio que queira casar, com direito a festa regada a música, comes e bebes em 2023 - ou mais para frente - precisa preparar bem o bolso ou estar disposto a mudar os planos.

Para Gabriel Schüler e Gabriella Szpoganicz, que começaram a planejar sua festa de casamento e contratar fornecedores em meados de 2019, a organização financeira os livrou de um susto e tanto. Ele, diretor de marketing da Terra Investimentos, e ela, gestora de projetos em uma agência de marketing, tinham um planejamento de anos e decidiram que era chegado o momento de celebrar o matrimônio.

O casal já havia juntado dinheiro suficiente, mais até do que estimava para a festa, porque assim teria mais poder de barganha. Dito e feito: os dois fecharam contratos e pagaram muitos serviços à vista, ainda em 2019, por valer mais a pena. Foi assim que escaparam da escalada dos preços com a liberação da demanda represada no mercado no pós-pandemia, além da própria inflação nesse período.

Nos anos mais críticos da covid-19, que postergaram a cerimônia de Gabriel e Gabriella, os custos com preparativos de casamento dispararam. As flores, por exemplo - clássico na decoração dos matrimônios -, dobraram de preço. Gastos com comes e bebes? Pelo menos 30% mais caros.

O Valor Investe teve acesso em primeira mão ao levantamento da plataforma Casar.com com a Assessoria VIP do quão mais caro ficou cada componente comum em festas de casamento nesses três anos.

A alta média fica em 28,3%, mas esse dado desconsidera que os serviços têm pesos diferentes na composição dos custos. As flores, por exemplo, que consomem 10% dos gastos médios totais, e a decoração, que tem uma fatia de 12% do orçamento médio, estão bem mais caros. Já os preços de contratos que representam menos de 2% no todo, como a reserva da igreja ou o serviço de um celebrante, subiram em torno de 11% - bem abaixo da alta inflacionária.

O aumento dos custos para casar (por serviço)

Serviço Valor (mediana) Variação*
Flores R$ 6.900,00 97,1%
Som e iluminação R$ 4.400,00 41,9%
Estrutura R$ 2.200,00 37,5%
Doces e Bolos R$ 1.350,00 32,5%
Coquetelaria (bar de drinks) R$ 3.900,00 32,1%
Bebidas R$ 2.350,00 30,3%
Local da recepção R$ 7.798,00 30,0%
Convites e papelaria R$ 990,00 28,6%
Decoração R$ 8.000,00 27,0%
Lua de mel (viagem) R$ 4.496,00 26,3%
Assessoria e organização R$ 3.000,00 25,0%
Beleza e "dia da noiva" R$ 1.600,00 23,1%
Banda, DJ e atração musical R$ 2.920,00 21,7%
Filmagem R$ 3.650,00 21,7%
Alianças R$ 2.900,00 20,8%
Fotografia R$ 4.500,00 16,3%
Vestido R$ 4.000,00 14,3%
Igreja R$ 950,00 11,8%
Celebrante R$ 1.500,00 11,1%

*entre 2019 e 2022

Os números do levantamento refletem o mercado geral e podem, por isso, parecer distantes de outros orçamentos. Só na capital paulista, por exemplo, a locação de um espaço de eventos que comporta uma festa com até 100 pessoas (os casamentos menores, que o setor passou a vender como "mini weddings") pode custar entre R$ 2 mil e R$ 50 mil.

Além de diferenças regionais relevantes, é preciso considerar ainda que as festas têm suas particularidades que afetam essa composição de custos. Essa diferença é tamanha que pode fazer com que a inflação pese muito mais para eventos planejados em espaços maiores e para mais pessoas, o que exigirá mais investimentos em decoração e em comidas e bebidas (segmentos com inflação expressiva) do que uma festa menor.

O casal Gabriel e Gabriella não precisou mudar o projeto, uma vez que boa parte da sua festa já estava quitada com fornecedores. "A vantagem para nós foi que fechamos muitos contratos naquela época [2019] e com antecipação dos valores. Pagamos muitos serviços 100% à vista", conta Gabriel.

Mas alguns ainda quiseram repassar a alta inflacionária desses quase três anos de intervalo para os pombinhos. "Estávamos protegidos pela lei porque tínhamos os contratos assinados e os recibos de pagamento. Eu entendo que foi um período difícil, mas o desequilíbrio dessa cobrança é que nós nos descapitalizamos naquele período e, de certa forma, esse recurso ajudou as empresas a financiar seus custos quando estiveram paradas durante a pandemia", pondera.

O casal, que à época morava em Florianópolis (SC), tinha orçado uma celebração entre R$ 40 mil e R$ 50 mil, mas no fim os gastos alcançaram R$ 80 mil. E se não tivessem garantido os pagamentos ainda em 2019, a festa teria facilmente ultrapassado os R$ 100 mil.

"Este é um setor em que os fornecedores operam muito alavancados com o dinheiro do cliente. Depois de quase dois anos sem demanda, o ano passado foi repleto de entregas, e o problema foi que várias empresas já tinham gastado o dinheiro que receberam antes", conta Camillo. "É um mercado delicado, então as pessoas precisam ter o cuidado até de pesquisar a saúde financeira e como foram as últimas entregas desses fornecedores que recebem antecipado. Mesmo passado o período mais crítico, o risco ainda é alto [de uma quebra ou problemas de fornecimento]."

Felizmente para o casal de profissionais do marketing, depois da espera, a celebração enfim aconteceu, em fevereiro de 2022, do jeito que tinham planejado inicialmente: para 160 convidados, em salão com vista para a praia, decoração de flores naturais, mesa de bolo e doces, serviço de coquetelaria, pista de dança e tudo mais que tinham contratado.

Só que esta não é mais a realidade para boa parte dos brasileiros que retomaram os planos para a cerimônia do último ano para cá. Com os preços nas alturas, adaptação é a palavra de ordem para sintonizar sonho e realidade.

Mudanças de planos

A frustração para a maior parte dos casais que sonhava com uma festa grande foi ter que reduzir o projeto e, principalmente, cortar a lista de convidados. Luana*, que pediu à reportagem para não ser identificada, conta que desde a adolescência desejava um casamento "de filme da sessão da tarde", mas ela e a noiva precisaram mudar esses planos quando se depararam com os orçamentos para este ano.

"Somos de duas famílias grandes e, se incluíssemos todos os nossos amigos, precisaríamos fazer uma cerimônia para 250 pessoas, chutando baixo. Isso sem contar que muitos são de fora da cidade onde moramos hoje, o que demandaria mais esse investimento em estrutura para receber nossos convidados", diz.

As duas passaram a morar juntas na pandemia e ficaram noivas no começo de 2021, sem inicialmente uma perspectiva de data para a festa, em função do estágio da vacinação no país.

A celebração só vinha sendo planejada mesmo desde o fim do ano passado, sem que ninguém tivesse sido avisado ainda. "Por esse lado foi bom, porque não precisaremos desconvidar pessoas. O ruim é que a festa será bem menor do que queríamos e que muitos amigos ficarão de fora", revela Luana.

Os preços atuais obrigaram o casal a rever muitos dos planos para a festa, e o "casamento de sessão da tarde" de Luana vai ficar "por conta da noiva, que é a pessoa que eu amo e com quem quero estar."

"Esperamos uma desaceleração do ritmo inflacionário no setor neste ano, para algo mais próximo de 10%, mas no acumulado de todo o período, da pré-pandemia para agora, estamos falando de uma inflação composta bem relevante", diz Camillo.

Ele atribui a disparada dos preços em 2022 à liberação de uma demanda bem relevante, após dois anos praticamente estagnados, o que provocou até um congestionamento de datas dos salões e igrejas.

O Brasil chegou a ter mais de 585 mil celebrações de matrimônio no ano passado, alta de 30% sobre o ano de 2019, que teve em torno de 450 mil casamentos, de acordo com os dados da plataforma.

Os sábados eram o dia da semana preferido pelos noivos até antes da pandemia, mas "no ano passado, vimos muitas celebrações acontecendo durante a semana e até no domingo, que são dias alternativos que ajudam a baratear os casamentos porque os custos de locação costumam ser mais baixos", conta o CEO da Casar.com.

Antes, os casais também fugiam de celebrar as cerimônias em meses que as pessoas costumam tirar férias (dezembro, janeiro, fevereiro e julho), mas isso também mudou, porque essas janelas de menor procura também tendem a ser mais baratas e, principalmente, estão mais disponíveis.

Apesar de todos esses ajustes, a mudança mais relevante diante da alta dos custos foi no tamanho das festas no Brasil, ainda mais ao considerar que o número de convidados está atrelado a serviços com peso bem maior na composição do orçamento: serviço de buffet, estrutura do salão e a quantidade de bebida e comida contratada.

"Isso, claro, de modo geral. As pessoas com muita grana continuam fazendo casamentos grandes e eu diria que essas festas ficaram até mais luxuosas, é um nicho de mercado que movimentou muito dinheiro no ano passado", pondera o CEO da Casar.com. Sob esse aspecto, este é mais um fator pressionando a alta dos gastos médios por festa em 2022, apesar dos esforços da maioria para driblar a inflação no mercado.

Para essa maioria, os casamentos ficaram mais simples ou menores, caso da festa de Luana e de sua noiva. "Por isso, esse aumento dos gastos médios com os casamentos refletiu, basicamente, a inflação geral do país e não mais. Se as pessoas tivessem mantido os planos e o porte das festas que eram feitas até 2019, teríamos uma inflação desse mercado bem maior", diz Camillo.

Mas e cancelamentos? Poucos casais desistiram da festa pela alta dos preços, na experiência de Camillo à frente da Casar.com e no contato com assessorias de casamento em todas as regiões do Brasil. "Houve muitas remarcações, o que até colaborou para essa concentração das festas no último ano e neste, mas a nossa percepção é que as pessoas passaram a valorizar mais esses encontros presenciais e as celebrações depois do período mais crítico da pandemia", avalia. Teve até mesmo os que tenham feito duas festas: uma pequena reunião para familiares mais próximos em 2021 e terão sua festa dos sonhos agora.

Por fim, outra figura no mercado de casamentos e que vem se consolidando como uma tendência por aqui, justamente pelo apelo como alternativa ao casamento tradicional no Brasil, são os destination weddings (casamentos de destino, em tradução livre). É um formato de casamento que a cerimônia é realizada fora da cidade onde os noivos moram.

Na prática, é uma viagem em grupo com festividades muitas vezes menores e mais simples para celebrar a união do casal. Em grande parte dos casos, os custos com a viagem (passagem e hospedagem) são arcados pelos próprios convidados, e os noivos bancam a festa e propõem atividades no destino.

O destination wedding foi a escolha do próprio Fabio Camillo, fundador da Casar.com, e de sua noiva. "Essa decisão reflete muito quem nós somos e vem muito do fato de querermos promover uma experiência mais longa com os convidados. Serão três dias com atividades diferentes para curtirmos juntos. Como o custo desse tipo de casamento não é tão alto, conseguimos sair do tradicional", revela.

Em vez de uma grande festa com decoração ostensiva e o cerimonial, Camillo e sua noiva montaram um cronograma de atividades na cidade eleita, no litoral sul da Bahia, e vão celebrar esse momento com os convidados em noite de drinks nos jardins do hotel, luau com música, festa na piscina, almoço e passeios.

"Não há o custo com a montagem de uma grande estrutura, porque a ideia nesse formato de casamento é curtirmos o que a praia já oferece e a estrutura do hotel, além do fato de estarmos em um lugar desses junto com amigos e familiares", diz.

A agente de relações públicas Júlia Kalili também optou por um casamento fora de São Paulo, onde ela e seu parceiro moram atualmente, mas o destino deste casal é mais estratégico: Rio de Janeiro, onde reside a família do noivo.

Com a cerimônia planejada para 2024, os dois têm pela frente vários desafios de negociações: hotéis na região em que querem ficar ainda não têm as taxas de hospedagem para o próximo ano, e alguns garantem que, para reservas antecipadas, as estimativas são de 20% a 30% sobre os valores atuais.

"Neste caso, recomendo aguardarem um pouco para fechar contratos, porque essas projeções estão muito altas, especialmente para um pagamento à vista e antecipado", declara Camillo.

*o nome da entrevistada foi alterado para preservar sua identidade.

Quem casa quer...desconto: Como brasileiros estão driblando as altas dos custos para casar? — Foto: Unsplash
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