Colunas de Rodrigo De Losso

Por Rodrigo de Losso e Fernando Fernandes — São Paulo


Parafraseando Fama e French, criadores do que se chama fatores de risco, observa-se que, apesar das inovações havidas na literatura científica e no mercado de capitais, boa parte do mercado financeiro, dos bancos de investimento e dos reguladores ainda estão presos ao Capital Asset Pricing ModelCAPM – para precificação de ativos, formulado independentemente por Sharpe em 1964, Lintner em 1965 e Black em 1972, logo modelo conhecido como SLB. Esse modelo marcou o nascimento da teoria de precificação de ativos, resultando no Prêmio Nobel em Economia para Sharpe em 1990.

Mais de cinco décadas depois, o CAPM ainda é amplamente utilizado no mercado, para estimar o custo de capital para empresas e avaliar o desempenho das carteiras de ativos. É a peça central do MBA de cursos de investimento, bem como dos cursos básicos de economia financeira. Verdade seja dita, muitas vezes é o único modelo de precificação de ativos ensinado nesses cursos, pois a atração do CAPM é que ele oferece recursos poderosos e previsões intuitivas sobre como medir o risco, e a relação entre ele e o retorno esperado.

Infelizmente, o desempenho empírico do modelo é pobre, a ponto de ser efetivamente rejeitado pela teoria, de forma a invalidar sua aplicação. Os problemas empíricos do CAPM refletem as hipóteses muito simplificadoras sob as quais foi derivado. Essa prática é usual, e dela se evoluiu para modelos mais sofisticados. Entretanto, mesmo empiricamente falseado e com alternativas bem melhores, o CAPM continua sendo largamente utilizado.

Com efeito, diversos autores vêm apontando suas inúmeras inconsistências em relação à capacidade do CAPM explicar empiricamente os retornos dos ativos, sugerindo métricas ignoradas não capturadas por ele:

  • Tamanho das empresas;
  • A razão entre o valor contábil e o valor de mercado da empresa – book to market price;
  • Alavancagem.

Em 1992 e em 1993, os mesmos Kenneth French e Eugene Fama resolveram compilar tais estudos e testar de maneira robusta esses achados dispersos na literatura, aparentemente desafiando os até então consagrados alicerces da academia que raríssimos ousavam enfrentar, sedimentando e consolidando de maneira definitiva a constatação que o CAPM de SLB estaria incompleto. Em outras palavras, os retornos das empresas seriam explicados por diversas variáveis, em vez simplesmente de um parâmetro beta que ajusta os retornos dos ativos ao excesso de retorno de uma carteira diversificada que represente satisfatoriamente os retornos do mercado como um todo – modelo básico este que quase todo profissional de finanças é exposto ao longo de sua formação.

Após o sucesso imenso dessas publicações, estudos derivados começaram a “pipocar” na academia e na indústria financeira por duas razões: primeiro porque reproduziam os resultados observados empiricamente e, também, pela facilidade de implementação computacional – basicamente basta saber um pouco de programação para formular os algoritmos, especialmente os backtests. Diversos autores, seguindo a mecânica proposta por Fama e French, foram estendendo essa análise para incorporar aparente contradições em relação aos modelos ajustados, de tal sorte que toda uma “fauna” de fatores emergiu em um processo de evolução empírico-acadêmico quase que desenfreado, a ponto de surgir o epíteto “Zoológico de Fatores” – Factor Zoo. Tanto fatores macroeconômicos quanto de estilo passaram a explicar cada vez mais e mais as idiossincrasias dos retornos associados às empresas, surgindo novos fatores, ficando mais famosos os seguintes:

  • Momentum: hiato entre empresas que tiveram os maiores retornos versus aquelas que tiveram os menores;
  • Risco: empresas com menor volatilidade versus empresas com maior volatilidade;
  • Qualidade: empresas com melhores indicadores operacionais versus empresas com piores indicadores operacionais;
  • Agressividade nos Investimentos: empresas que investem de maneira mais conservadora versus empresas que investem mais agressivamente;
  • Correlação das empresas com variáveis macroeconômicas como inflação, desemprego e atividade econômica.

Esses novos “fatores de risco” passaram a explicar as especificidades de cada empresa e revolucionaram a maneira que passamos a enxergar o desempenho delas e, principalmente, dos gestores.

Em um artigo publicado em 2018 no Financial Analyst Journal, intitulado "Buffett’s Alpha" (ou o alpha de Buffett), os autores, vinculados à AQR, explicam o porquê, no longo prazo, o megainvestidor Warren Buffett entregou resultados consistentemente superiores aos do mercado – o tal do “alpha” – que era a parcela dos retornos não explicados dentro do modelo clássico SLB, passou a ser explicado por, nas palavras dos autores (tradução nossa), “[...] sua preferência por ações baratas, seguras e de alta qualidade combinadas com seu uso consistente de alavancagem para ampliar os retornos enquanto sobrevive às inevitáveis grandes perdas absolutas e relativas que isso implica”.

Por conseguinte, é inegável a tamanha revolução que tal compreensão do mercado passou a gerar a todos os agentes. Gestores passaram a ser desmistificados, em larga medida, e novos veículos passaram a ser desenvolvidos baseados no conceito de factor investing e smart beta, replicando facilmente na indústria essas metodologias desenvolvidas na academia. Em outras palavras, uma exposição barata e sistemática, fazendo uso massivo de dados e razoável diversificação, de maneira equilibrada entre os fatores, possibilita gerar retornos superiores à média do mercado. E uma florescente indústria de produtos passou a nascer a partir daí.

Diversas casas de investimento no exterior, e um pouco mais recentemente no Brasil, passaram adotar essa metodologia para compor suas estratégias de investimento. A título de curiosidade, lá fora, em geral, cobra-se apenas e tão-somente taxas de administração, uma vez que não faz sentido remunerar o desempenho de alguém que faz a gestão de uma carteira por se expor invariavelmente a fatores de risco conhecidos e documentados. Com efeito, já existe uma grande gama de Exchange-Traded Funds – ETFs –, cujo propósito é reproduzir determinadas carteiras de ativos, podendo ser transacionados como se fossem ativos individuais. Essa modalidade de investimento reduz o custo de transação de maneira segura.

Também é importante lembrar que essa revolução não ficou restrita aos mercados financeiros e aos investidores. Colhemos significativos frutos em outras esferas de interesse do público em geral. Por exemplo, essa mesma metodologia pode ser aplicada ao longo do processo de privatização e aumento da participação do setor privado no desenvolvimento da infraestrutura pública do Brasil. Estes autores aplicam essa mesma metodologia para calcular o quanto os investidores de empresas que investem nos diferentes setores de infraestrutura demandam por rentabilidade – com base em fatores de risco tanto de estilo, quanto macroeconômicos –, de forma a determinar a justa remuneração dos entes privados nas concessões de rodovias, de transporte público, saneamento, resíduos sólidos e outros.

Pois bem, se sabemos, por meio de fatores de risco, o quanto o acionista lá na ponta da empresa demanda racionalmente por remuneração, sabemos, fazendo engenharia reversa e descontando outros fatores de risco tratados em contrato, qual deveria ser a tarifa justa de pedágio de uma grande concessão de rodovias, sem mais nem menos, garantindo maior transparência nas relações público-privadas.

O legado de Fama e French, bem como de todos os autores que lhes sucederam, é imenso; e a revolução que isso causou na indústria financeira é ainda imensurável. A literatura nesse campo continua em evolução. Aposentados, pensionistas, usuários de infraestrutura pública, governantes e acadêmicos temos, pois, motivos a comemorar e agradecer pelo insight de Fama e French, e não somente os megainvestidores.

Rodrigo De Losso é PhD pela Universidade de Chicago e professor titular da FEA-USP.
Fernando Fernandes
é pós-doutorando no Departamento de Economia da FEA-USP.

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