A carteira de mercado agrega, em tese, todos os ativos da economia. Essa carteira é importante como referência em diversas situações teóricas e empíricas. Por exemplo, teoricamente o CAPM (sigla para Capital Asset Pricing Model) é um modelo que tem a carteira de mercado como referência para estimar o prêmio de mercado e a quantidade de risco. Empiricamente, fundos de investimento com gestão ativa tomam a carteira de mercado como referência para indicar se conseguiram “bater o mercado” e calcular a remuneração por desempenho (a taxa de performance). Semelhantemente, fundos passivos ao mercado devem mostrar um desempenho similar ao da carteira de mercado.
A carteira de mercado pode ter várias composições, mas cada país tipicamente elege aquela mais representativa de sua economia. Enquanto nos EUA a carteira de mercado típica é o S&P 500, no caso do Brasil a carteira de mercado mais típica é o Índice Ibovespa. Mas será que o Ibovespa tem as características requeridas para uma carteira de mercado?
Na década de 1970, Roll já levantava uma limitação de carteiras de mercado por não conterem capital humano, pois o capital humano dos indivíduos, em princípio, não pode ser convertido em ações que deveriam compor essa carteira. Há formas de contornar essa limitação, na medida em que o valor das empresas que compõem a carteira de mercado reflete o valor agregado do capital humano que as constituem, mas, para nossos propósitos aqui, mais importante que limitações teóricas sobre a composição das carteiras de mercado, convém discutir suas limitações empíricas.
O Ibovespa representa no Brasil a carteira de mercado mais relevante por várias razões. Primeiro, porque foi criado em 1968 juntamente com a forma atual da bolsa de valores, ou seja, é o índice mais longevo que temos. Por essa razão, há derivativos que geram considerável volume de recursos associados a esse índice, como contrato futuros, contratos de opções e ETFs (fundos negociados em bolsa que replicam sua carteira). Contudo, a forma de compor o Índice Bovespa não é a mais adequada.
Como seria uma carteira de mercado representativa? Ora, deveria ser suficientemente diversificada de maneira pertencer ao que se chama de Fronteira Eficiente de Markowitz. Para um mesmo nível de retorno, podem-se montar várias carteiras com mais ou menos risco. Assim, a Fronteira Eficiente de Markowitz é aquela em que estão as carteiras com menor nível de risco para um dado retorno. A figura a seguir representa essa ideia:
O que é preciso notar, reforço, é que, para cada nível de retorno esperado há uma infinidade de carteiras com vários níveis de risco, contidas no lado interior da curva mostrada no gráfico. A Fronteira Eficiente representa as combinações de ativos com menor risco para cada nível de retorno esperado. Carteiras do lado externo da curva no gráfico são infactíveis, ou seja, impossíveis de serem obtidas.
Por razões históricas, o Ibovespa foi montado com base na liquidez dos ativos da bolsa. Por conseguinte, foi criado um índice de negociabilidade que ordena os ativos que farão parte da carteira. O resultado disso é um índice muito concentrado em determinados ativos. Com isso, a volatilidade do Ibovespa acaba sendo mais elevada do que outra combinação para o mesmo nível de retorno, ou seja, o Ibovespa seria um ponto interior à Fronteira Eficiente, já que, em tese, haveria uma outra carteira com o mesmo nível de retorno, porém com volatilidade menor que o Ibovespa.
Importante dizer que já foram feitos testes evidenciando que o Ibovespa não está na Fronteira Eficiente, diferentemente do S&P 500, por exemplo, que estaria para o caso dos EUA. É pelas dificuldades de se considerar o Ibovespa como uma carteira de mercado típica que outros índices de ações foram criados no Brasil, a saber, o IBrX e o MSCI Brasil, por exemplo. Essas carteiras são mais diversificadas, por isso, menos voláteis que o Ibovespa. Assim, teriam mais chances de estar na Fronteira Eficiente e representar melhor uma carteira de mercado.
Rodrigo De Losso é PhD pela Universidade de Chicago e professor titular da FEA-USP.