Dante Alighieri (1265-1321) é um dos nomes mais consagrados da literatura italiana, sendo conhecido principalmente por A Divina Comédia, um longo poema narrativo que apresenta aspectos filosóficos e autobiográficos. Embora o livro seja do século 14, a obra é celebrada até hoje – bem como seu autor que, recentemente, teve o rosto recriado por um designer brasileiro.
O trabalho foi feito pelo designer 3D Cícero Moraes e publicado em 1º de janeiro na revista OrtogOnLineMag. O estudo teve participação também do cirurgião dentista Thiago Beaini, Professor Assistente na Faculdade de Odontologia da Universidade Federal de Uberlândia, em Minas Gerais.
Moraes recorreu à técnica de reconstrução facial forense (RFF), também chamada de aproximação facial forense (AFF), cujo objetivo é reconstituir a face de uma pessoa a partir do crânio. Trata-se de um procedimento valioso especialmente nos casos em que há poucas informações para, de fato, identificar como o indivíduo era.
![Por meio da técnica de deformação anatômica, deformou-se o crânio do doador para que se aproximasse do crânio de Dante — Foto: Cicero Moraes](https://cdn.statically.io/img/s2-galileu.glbimg.com/PXDJ_ClCjfmPzIjv2MVerLncqoM=/0x0:1250x883/984x0/smart/filters:strip_icc()/i.s3.glbimg.com/v1/AUTH_fde5cd494fb04473a83fa5fd57ad4542/internal_photos/bs/2024/p/Q/mbsBfhQpOqFONm0SOvfQ/dante-illu-skull-defo-2-deformacao-da-malha.png)
“O processo de modelagem foi efetuado no software Blender 3D, rodando o add-on OrtogOnBlender e seu submódulo ForensicOnBlender”, declara Moraes no artigo. A recriação do rosto de Dante foi baseada ainda em uma série de informações, incluindo dados referentes aos ossos do escritor e imagens classicamente atribuídas ao italiano.
O primeiro passo consistiu em projetar as linhas principais do crânio. Depois, a partir da caixa craniana de um doador, a imagem foi transformada para 3D. Utilizando a técnica de deformação anatômica, a estrutura craniana do doador foi alterada para que se aproximasse da estrutura de Dante.
Como resultado, o designer apresentou duas abordagens da face de Dante: uma mais objetiva e outra mais artística. A primeira é cinza e foca sobretudo na anatomia do rosto. Veja:
![Recriação mais objetiva da face de Dante Alighieri — Foto: Cicero Moraes](https://cdn.statically.io/img/s2-galileu.glbimg.com/Z3Eam4iU08wtmDM5vSSRHQvqnvc=/0x0:3500x3500/984x0/smart/filters:strip_icc()/i.s3.glbimg.com/v1/AUTH_fde5cd494fb04473a83fa5fd57ad4542/internal_photos/bs/2024/U/A/MMy7Z3SgmyfabL585dBg/dante-grey-1-face-objetiva.jpg)
Ainda que as imagens coloridas contenham características especulativas acerca da aparência do escritor, por se tratar de um trabalho que será apresentado ao público geral, o resultado "fornece os elementos necessários para que passe um aspecto vivificado do indivíduo, muito difícil de se viabilizar apenas com a exposição do crânio e pobre de apelo visual na imagem objetiva em escala de cinza", explica Moraes.
![Abordagem mais artística da face de Dante — Foto: Cicero Moraes](https://cdn.statically.io/img/s2-galileu.glbimg.com/vy4xWqm0jD7XzNK_J66l6l4tSxs=/0x0:3500x3500/984x0/smart/filters:strip_icc()/i.s3.glbimg.com/v1/AUTH_fde5cd494fb04473a83fa5fd57ad4542/internal_photos/bs/2024/I/K/5UqoPSSoeOsAgQiIqFaQ/dante-final-3.jpg)
Conforme o artigo publicado pelo designer, os restos mortais de Dante foram sepultados em 1321 na Capela della Madonna, cidade de Ravenna, na Itália. Nos anos subsequentes, a cidade de Florença tentou recuperar o corpo, sendo a primeira solicitação formal efetuada em 1396 e barrada pela oposição dos moradores de Ravenna.
Em 1519, com o apoio do Papa Leão X (membro da poderosa família Médici), uma carta assinada por 20 personalidades florentinas foi redigida, solicitando o envio do cadáver. Dentre os signatários, estava a figura o célebre pintor italiano Michelangelo, que se comprometera a criar uma cúpula para Dante.
![Lateral da face de Dante recriada pelo designer brasileiro Cicero Moraes — Foto: Cicero Moraes](https://cdn.statically.io/img/s2-galileu.glbimg.com/tUzVFzJZYyhlwvmib-WD6bwYcV8=/0x0:3500x3500/984x0/smart/filters:strip_icc()/i.s3.glbimg.com/v1/AUTH_fde5cd494fb04473a83fa5fd57ad4542/internal_photos/bs/2024/r/j/lwO7sDSOeuAstJsSkr4g/dante-final-5-face-colorida-lateral.jpg)
Sabendo do grupo que estava a caminho para se apossar do corpo, é provável que frades franciscanos tenham escavado uma pequena galeria, acessado a capela e roubado os restos. Quando a delegação florentina chegou e abriu o túmulo, deparou-se somente com três falanges e algumas folhas de louro.
Em 23 de junho de 1865, um grupo de trabalhadores descobriu uma caixa com as inscrições e os poucos ossos do poeta. Os restos foram analisados pelos cirurgiões Giovanni Puglioli e Claudius Bertozzi.
Confirmou-se que os despojos eram de um homem com cerca de 1,66 metro, com idade compatível a de Dante no momento da morte. De lá para cá, novas análises trouxeram ainda mais pistas sobre a aparência do escritor em vida — o trabalho de Moraes é um dos mais impressionantes.