Arqueólogos desenterraram restos de caçadores-coletores pré-históricos junto de uma raposa da espécie Dusicyon avus na região da Patagônia argentina. Eles acreditam que os antigos habitantes tinham uma relação profunda com o mamífero, considerando-o um animal de estimação, segundo estudo publicado nesta quarta-feira (10) na revista Royal Society Open Science.
Os ossos dos antigos habitantes, datados em cerca de 1.500 anos atrás, foram encontrados no sítio de Cañada Seca, descoberto em 1991, a cerca de 210 quilômetros ao sul da cidade de Mendoza, no oeste da Argentina. O local guarda ossos de pelo menos 24 pessoas, incluindo crianças, e seus pertences pessoais, como colares, ferramentas de pedra e tembetás ou enfeites labiais.
“Ou [a raposa] era um animal simbólico para a comunidade, ou foi enterrado quando morreu com seus donos, ou com as pessoas com quem tinha uma relação particular”, disse Ophélie Lebrasseur, da Universidade de Oxford, que é coautora do artigo junto com Cinthia Abbona, do Conselho Nacional de Pesquisa Científica e Técnica da Argentina, em entrevista ao jornal britânico The Guardian.
Os pesquisadores dizem que os restos mortais eram de antes da chegada dos cães domésticos ao país, há cerca de 500 anos. As evidências também sugerem existir uma relação profunda da raposa com os tutores, a ponto de serem enterrados juntos.
Inicialmente, os pesquisadores identificaram a raposa como pertencente ao gênero Lycalopex. Após uma nova análise genética, concluíram que os ossos eram da espécie Dusicyon avus. Ela foi extinta há 500 anos e tinha aproximadamente o tamanho de um cachorro da raça pastor alemão.
Antes do estudo, não se sabia da sua presença no noroeste da Patagônia. As conclusões sobre a relação entre o animal e os humanos são dificultadas pelo fato de que, antes da escavação original, ocorriam saques no local.
Os ossos da Dusicyon avus foram datados por radiocarbono e a equipe realizou análises com isótopos estáveis, técnica que permitiu investigar a dieta da raposa. Os cientistas concluíram que ela tinha uma alimentação semelhante à dos humanos locais e até consumia plantas, apesar de ser um animal carnívoro.
“Considerando que há casos apoiados por evidências substanciais que sugerem que os cães pré-coloniais podem ter desfrutado de um status especial entre os caçadores-coletores que viviam no atual território argentino, faz sentido que espécies semelhantes em momentos anteriores possam ter estabelecido essa relação particular com os patagônicos”, observa Alejandro Serna, especialista em caçadores-coletores patagônicos da Universidade de York, que não esteve envolvido na pesquisa, ao The Guardian.
Conforme Lebrasseur, as novas descobertas revelam uma semelhança com um antigo estudo sobre os restos encontrados em cemitérios de Buenos Aires, também na Argentina, datados do segundo milênio a.C. Nesses ossos, a Dusicyon avus também estava na sepultura com os tutores, e o autor do estudo afirmou ter uma relação semelhante à de um animal de estimação.