• Texto: Larissa Beani | Edição: Luiza Monteiro
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A Lei de Cotas aproximou estudantes pobres, negros e indígenas das universidades públicas (Foto: Getty Images)

A Lei de Cotas aproximou estudantes pobres, negros e indígenas das universidades públicas (Foto: Getty Images)

Com o incentivo dos pais, Júlia Souza Reis sempre sonhou em estudar em uma universidade pública. Aluna desde o ensino fundamental l da rede estadual de São Paulo, a jovem de Santo André, na região metropolitana da capital paulista, estampava nos boletins notas excelentes. “Entrar em uma universidade pública, para mim, era uma oportunidade de melhorar as condições de vida da minha família”, conta ela, hoje com 25 anos.

O problema é que, em uma sociedade meritocrática, a justiça nem sempre está do lado de quem mais precisa. Júlia foi percebendo isso no segundo ano do ensino médio, quando prestou o Enem como treineira e se decepcionou com a pontuação obtida, muito distante das notas de corte dos cursos para os quais prestaria no ano seguinte.

A explicação para esse resultado estava na defasagem da educação que havia recebido até então. O que o histórico escolar repleto de boas notas não mostrava é que, para ela e tantos outros alunos da rede pública, muitas vezes faltam materiais e professores nas escolas. Com docentes sobrecarregados e dando aulas a turmas lotadas, a discrepância entre o ensino privado e público é enorme. Tamanha desigualdade foi discutida por décadas até uma medida concreta ser adotada a nível nacional.

Em 29 de agosto de 2012, foi aprovada uma norma federal para promover mais equidade no ingresso ao ensino superior público. Conhecida como Lei de Cotas, a lei nº 12.711 previa que 50% das vagas em instituições federais de ensino técnico e superior vinculadas ao Ministério da Educação fossem reservadas a estudantes que cursaram o ensino médio em escolas públicas integralmente. Além disso, metade delas seria destinada a alunos cuja renda familiar fosse igual ou inferior a um salário mínimo e meio.

Quatro anos depois, em 28 de dezembro de 2016, foi aprovada a lei nº 13.409, que incluiu na Lei de Cotas mais grupos minoritários. A norma passou a dispor que aquelas vagas destinadas a alunos vindos do ensino médio público também seriam repartidas entre candidatos autodeclarados pretos, pardos e indígenas, além de pessoas com deficiência. A ideia é que a composição das turmas espelhe a população do estado ao qual a instituição de ensino pertence.

Após estudar quase dois anos em um cursinho popular gratuito, Júlia conseguiu realizar seu sonho e de sua família. Em 2017, ingressou no curso de Relações Internacionais da Universidade Federal do ABC (UFABC), em São Bernardo do Campo (SP), graças à reserva de vagas destinadas a estudantes que concluíram o ensino médio na rede pública. Parda (mas que na época não se declarou como tal por entender que seu tom de pele era muito claro) e filha de trabalhadores que não tiveram oportunidade de fazer uma faculdade, Júlia faz parte de uma nova leva de estudantes que têm mudado o perfil do universitário brasileiro.

A  educação superior do Brasil é historicamente branca e rica, mas nem sempre foi a principal preocupação do país (Foto: Getty Images)

A educação superior do Brasil é historicamente branca e rica, mas nem sempre foi a principal preocupação do país (Foto: Getty Images)

Trajetória de privilégios

Para entender por que a educação superior do Brasil é historicamente branca e rica, vale a pena voltar alguns séculos e analisar a formação desse sistema de ensino no país, que é muito jovem comparado ao de outras nações. Grandes centros de formação superior já existiam na Ásia, África e Europa desde a antiguidade, mas a concepção moderna de uma universidade nasceu em 1088, com a criação da Universidade de Bolonha, na Itália. Desde então, a Europa inaugurou algumas das mais renomadas universidades do mundo, como as de Oxford (1096), Salamanca (1134) e Cambridge (1209).

Quando os europeus vieram para as Américas, construir universidades não era bem uma prioridade, mas mesmo assim algumas foram inauguradas a partir do século 16. A primeira foi a Universidade São Tomás de Aquino, em 1538, na atual República Dominicana. Hoje, a entidade é conhecida como Universidade Autônoma de Santo Domingo. Em menos de 20 anos, os espanhóis também fundaram a primeira universidade da América do Sul: a Universidade de San Marcos, no Peru, em 1551. Já no século 17, os ingleses passaram a construir suas academias na América do Norte, sendo a primeira delas a Universidade Harvard, de 1636.

Os portugueses só foram se preocupar em investir na formação superior de sua colônia por aqui no século 19. Em 18 de fevereiro de 1808, menos de um mês após a chegada de D. João VI ao Brasil, foi fundada a Escola de Cirurgia da Bahia, a primeira instituição de ensino superior do país. Depois dela, várias outras surgiram, mas nenhuma concentrava cursos de diferentes áreas para serem consideradas universidades. A palavra “universidade” tem origem no termo em latim universitas, que significa “universalidade”. Para que uma instituição acadêmica receba esse nome, portanto, precisa abranger um universo de diferentes cursos, sobre temas variados.

Foi só no século 20, mais precisamente em 1909, que o Brasil inaugurou sua primeira universidade — embora ela não tenha recebido esse título na época. A Escola Livre de Manaus oferecia formação militar e cursos de agronomia, ciências jurídicas, farmacêuticas, sociais e naturais, engenharia civil, entre outros. Na década de 1920, porém, a instituição teve alguns cursos fechados por falta de verba. Levou 42 anos até que voltasse a funcionar plenamente, já sob o nome de Universidade Federal do Amazonas (UFAM).

Entre os centros de ensino superior pioneiros no país também estão a Universidade Federal do Paraná (UFPR), de 1912, a primeira a ser concebida como uma universidade de fato; e a Universidade de São Paulo (USP), que em 1934 tornou-se a primeira universidade brasileira baseada nos pilares de ensino, pesquisa e extensão.

Ao longo desses dois séculos de existência, o ensino superior do Brasil foi formado por um corpo discente majoritariamente branco e rico, que deixou de ter que cruzar o Atlântico em busca de formação na Europa e passou a ocupar as salas de aula de universidades públicas por aqui mesmo. Parte da elite brasileira foi, inclusive, a principal beneficiada pela primeira Lei de cotas aprovada no país.

Conhecida como Lei do Boi, a lei nº 5.465 foi aprovada em 3 de julho de 1968. A princípio, ela estabelecia que 50% das vagas de cursos de agronomia e veterinária mantidos pela União fossem destinados a “candidatos agricultores ou filhos destes, proprietários ou não de terras, que residam com suas famílias na zona rural” e 30% para aqueles com o mesmo perfil, mas que morassem em cidades ou vilas sem acesso ao ensino médio. Acontece que, após anos de aplicação, constatou-se que os principais beneficiados eram filhos de grandes fazendeiros, que tinham condições de frequentar o ensino superior sem cotas. A Lei do Boi esteve em vigor até 1985.

Somente com o fim da ditadura militar brasileira que a preocupação com o  ensino superior a quem precisa se fortaleceu. (Foto: Getty Images)

Somente com o fim da ditadura militar brasileira que a preocupação com o ensino superior a quem precisa se fortaleceu. (Foto: Getty Images)

Foi só com o fim da ditadura militar e o início da redemocratização que a luta pelo acesso ao ensino superior a quem precisa se fortaleceu. “Em 20 de novembro de 1995, tivemos a Primeira Marcha Zumbi contra o Racismo, pela Cidadania e pela Vida em razão dos 300 anos do assassinato de Zumbi dos Palmares, um dos maiores líderes da resistência negra brasileira”, lembra Joaze Bernardino-Costa, professor associado do Departamento de Sociologia da Universidade de Brasília (UnB). Reunindo cerca de 30 mil pessoas na capital do país, a manifestação chamava atenção para a falta de políticas públicas voltadas à população negra.

O acesso ao ensino superior era uma das principais demandas. “A partir desse evento, o governo FHC [de Fernando Henrique Cardoso, presidente do Brasil de 1995 a 2002] criou um grupo de trabalho interministerial que começou a estudar propostas de ações afirmativas e organizou um seminário sobre multiculturalismo e antirracismo para elaborar medidas de enfrentamento ao racismo no Brasil.” O assunto havia entrado na pauta do governo federal graças ao movimento negro, mas foram necessários muitos mais anos de luta para que estudantes pretos conseguissem ter maior acesso ao ensino superior público do país.

Um passo à frente

Antes mesmo da aprovação das leis federais, alguns estados e universidades já haviam se adiantado na discussão sobre cotas e criado suas próprias regras. A primeira instituição pública de ensino superior a implementar cotas sociais e raciais no ingresso de seus estudantes foi a Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ). Com a aprovação da lei estadual nº 3.524 em 2000, foram reservadas 50% das vagas para pessoas que cursaram integralmente o ensino médio em escolas da rede pública municipal e estadual.

Já em 2001, a lei estadual nº 3.708 marcou a criação de cotas destinadas à população negra para as vagas de graduação da UERJ e da Universidade Estadual do Norte Fluminense (UENF). Nos anos seguintes, as cotas foram sendo remanejadas e ampliadas, incluindo a criação de reservas para candidatos indígenas e pessoas com deficiência.

“Qualquer pessoa que esteve na universidade [UERJ] antes das cotas vê uma mudança racial e econômica drástica no corpo discente”

Luiz Augusto Campos, professor do IESP-UERJ

Se em 2003 a UERJ recebeu 3.056 cotistas em seu primeiro vestibular com reservas de vagas, em 2020 esse número chegou a 7.553 alunos. “Qualquer pessoa que esteve na universidade antes das cotas vê uma mudança racial e econômica drástica no corpo discente”, afirma o cientista político Luiz Augusto Campos, professor do Instituto de Estudos Sociais e Políticos (IESP) da UERJ e coordenador do Grupo de Estudos Disciplinares de Ação Afirmativa (Gemaa) da universidade.

Outra instituição que esteve à frente das discussões sobre cotas foi a UnB, a primeira universidade federal a criar vagas para enfrentar a exclusão étnico-racial existente no ensino superior e também a primeira a fazê-lo por conta própria, sem uma demanda exigida por lei. Quem estabeleceu o primeiro plano de cotas da UnB foi o Conselho de Ensino, Pesquisa e Extensão (Cepe), que aprovou em 2003 a reserva de 20% das vagas da graduação para estudantes negros e criou 20 vagas adicionais para indígenas, que são acessadas pelo Vestibular Indígena. Realizado em parceria com a Fundação Nacional do Índio (Funai), esse processo seletivo é adaptado ao tipo de educação ministrada em tribos Brasil afora.

Em 2003 a UERJ recebeu 3.056 cotistas em seu primeiro vestibular com reservas de vagas, em 2020 esse número chegou a 7.553 alunos. (Foto: Getty Images)

Em 2003 a UERJ recebeu 3.056 cotistas em seu primeiro vestibular com reservas de vagas, em 2020 esse número chegou a 7.553 alunos. (Foto: Getty Images)

O engenheiro florestal Poran Potiguara, de 32 anos, ingressou na UnB em 2009 graças a esse vestibular. Nascido e criado na Baía da Traição — trecho do litoral norte da Paraíba que foi palco da resistência potiguara contra os portugueses desde 1501 —, Poran levou consigo a força e os ideais de seus ancestrais para estudar em Brasília. “O nosso território sofre muito com o desmatamento, e eu comecei a perceber isso desde pequeno. Meu avô contava que tínhamos muita mata, era tanta que deixava os lugares até mais escuros. Mas não fui vendo isso conforme eu crescia”, lembra. “Decidi ser engenheiro para devolver as matas à nossa terra e construir uma política de preservação local.” E deu certo.

Após se formar, em 2019, Poran retornou a sua comunidade na Paraíba e criou o projeto Águas Potiguara, que visa recuperar os rios que passam pelas aldeias de Alto do Tambá e Forte. A trajetória até receber o diploma, porém, não foi fácil. Para conseguir concluir a graduação, o engenheiro teve que ingressar na universidade duas vezes.

Na primeira ocasião, aquela de 2009 pelo Vestibular Indígena, precisou correr atrás de muitos conteúdos para suprir as matérias de matemática e ciências que não tivera no ensino médio, além de lidar com dificuldades financeiras para sobreviver na capital federal por falta de verba destinada a sua permanência ali. Por opção, resolveu prestar o vestibular mais uma vez, retornando à UnB em 2014, em vaga de ampla concorrência, conquistando o 12º lugar na prova do curso.

“Com a criação de cotas e a presença indígena, negra, quilombola, as universidades começam a mudar e se aproximar das comunidades. Tornam-se verdadeiramente brasileiras”

Poran Potiguara, engenheiro florestal indígena formado pela UnB

Com melhores condições de permanência estudantil nessa segunda vez, graças ao ativismo no  qual ele mesmo se engajou durante o primeiro ingresso na instituição, Poran concluiu a graduação em engenharia florestal tendo participado de pesquisas em sua área e também de estudos sobre os avanços das cotas para indígenas. “As universidades precisam começar a se descolonizar e abranger, de fato, muitos universos”, avalia. “Com a criação de cotas e a presença indígena, negra, quilombola, elas começam a mudar e se aproximar das comunidades. Tornam-se universidades verdadeiramente brasileiras”.

Na Universidade de Brasília, esse processo de mudança no perfil discente pode ser visto em números. Em 2012, havia cerca de 10,7 mil estudantes pretos, pardos e indígenas entre os 41,7 mil alunos. Já em 2020, esse grupo somava mais de 15,5 mil indivíduos dentre quase 43 mil pessoas que estudam na UnB.

Pública para todos

Resultados como esses revelam que as universidades públicas brasileiras têm se tornado cada vez mais diversas. Mas a organização e produção de números e estatísticas sobre cotas ainda são escassas. Para suprir a falta de dados sobre o assunto, foi criado o Consórcio de Acompanhamento das Ações Afirmativas 2022, coordenado por Luiz Augusto Campos, da UERJ, e pela professora Márcia Lima, do Departamento de Sociologia da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas (FFLCH) da USP. “A ideia do consórcio é produzir dados e análises sobre a política de cotas no país, realizar estudos de caso, pesquisas quantitativas e qualitativas”, explica Campos.

Segundo o sociólogo, uma das principais dificuldades encontradas ao pesquisar o tema é a falta de uma base de dados integrada que organize e centralize informações de todas as universidades, para que se tenha uma visão mais ampla dos avanços promovidos pela Lei de Cotas. Além disso, alegações como raça/cor são consideradas dados pessoais sensíveis pela Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais (LGPD) e, portanto, não são divulgadas por algumas instituições.

Segundo o estudo, pretos, pardos e indígenas representavam 60 31% dos estudantes de universidade federais em 2001 (Foto: Getty Images)

Segundo o estudo, pretos, pardos e indígenas representavam 60 31% dos estudantes de universidade federais em 2001 (Foto: Getty Images)

Mesmo com esses desafios, porém, os pesquisadores conseguiram produzir um panorama do assunto. Em um seminário realizado no início de agosto no Museu Afro-Brasil, em São Paulo, Campos apresentou os principais resultados do levantamento feito pelo Consórcio. Segundo o estudo, pretos, pardos e indígenas representavam 31% dos estudantes de universidade federais em 2001.

Em 2020, eram 52%. Entre os membros das classes C, D e E, o salto foi ainda maior: de 19% para também 52% no mesmo período. Alunos cotistas têm, ainda, menor taxa de evasão do que aqueles que ingressaram pela ampla concorrência, e o desempenho acadêmico é semelhante ou superior ao segundo grupo, mesmo que ao entrar as notas nos vestibulares sejam menores.

Outro relatório — este publicado em julho pela associação civil Ação Educativa e pelo Laboratório de Estudos e Pesquisas em Educação Superior (Lepes) da Faculdade de Educação da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) — conclui que, entre 2013 e 2019, houve um aumento de 115% no número de estudantes provenientes do ensino médio da rede pública nas universidades federais.

Somando a escolaridade à renda familiar igual ou menor do que 1,5 salário mínimo, o acréscimo foi de 105%. Entre aqueles que vêm de escola pública e também se encaixam em alguma minoria racial, o crescimento foi de 147%. E para aqueles que se enquadram nos quesitos escolar, racial e de renda, o aumento foi de 205%.

“Dez anos de políticas afirmativas é um período significativo, mas ainda é pouco para que a gente possa falar sobre equidade do ensino superior público brasileiro”, pontua Dyane Brito Reis, professora associada da Universidade Federal do Recôncavo da Bahia (UFRB) e coautora do relatório lançado em julho. Ela considera que a produção de dados sobre o assunto é relevante para atestar o sucesso e a necessidade de permanência da política de cotas. Sobretudo neste ano, em que a medida pode ser revista — para pior.

“Dez anos de políticas afirmativas é um período significativo, mas ainda é pouco para que a gente possa falar sobre equidade do ensino superior público brasileiro”

Dyane Brito Reis, professora associada da Universidade Federal do Recôncavo da Bahia

A luta continua

Conforme o artigo 7º da Lei de Cotas, uma revisão das ações afirmativas deveria ser realizada após dez anos da publicação, marco atingido no último dia 29 de agosto. Acontece que o texto não indica qual órgão é o responsável por fazer essa análise e, assim, a revisão da lei tem sido deixada de lado. Entre os motivos para isso estão a proximidade das eleições de outubro de 2022 e o fato de que o governo federal não preparou nenhum levantamento sobre o tema para fazer qualquer tipo de avaliação acerca dos resultados da norma.

Mas, mesmo que a revisão não seja feita neste ano, isso não quer dizer que a lei não sofra ameaças de retrocesso. Segundo levantamento do  Observatório do Legislativo Brasileiro (OLB) e do Gemaa, no último semestre, 19 propostas acerca da Lei de Cotas tramitavam na Câmara dos Deputados, sendo nove delas a favor das políticas afirmativas, outras nove contra e uma neutra. Entre os projetos que se opõem à norma atual, a maioria critica o terceiro artigo, que garante a reserva de vagas para pretos, pardos e indígenas.

Em resposta a essa ameaça, ao menos dois projetos de lei (PL) sugerem que a revisão da lei 12.711 seja adiada em algumas décadas. O PL nº 1788, apresentado em maio de 2021 pelo deputado federal Bira do Pindaré (PSB/MA), propõe que a lei seja reavaliada após 30 anos de sua publicação, ou seja, em 2042. Já o PL nº 3422, criado em outubro do ano passado pelo deputado federal Valmir Assunção (PT-BA), sugere que a revisão seja feita apenas em 2062, quando a lei completar 50 anos.

Para estudiosos da área, caso haja alguma modificação na lei 12.711/2012, ela deve ser no sentido de ampliar as conquistas (Foto: Getty Images)

Para estudiosos da área, caso haja alguma modificação na lei 12.711/2012, ela deve ser no sentido de ampliar as conquistas (Foto: Getty Images)

Na academia, a revisão neste momento é vista como precipitada por alguns. “Se essa lei fosse derrubada agora, poderíamos perder todo avanço que conquistamos com o ingresso de estudantes da rede pública, negros e indígenas nas universidades”, ressalta Campos, que pondera: “Mas também é importante pontuar que as universidades podem manter seus programas de cotas mesmo sem a lei federal.”

Para estudiosos da área, caso haja alguma modificação na lei 12.711/2012, ela deve ser no sentido de ampliar as conquistas que já foram alcançadas. Na visão de Joaze Bernardino-Costa, da UnB, seria importante que o texto também incluísse instituições de ensino superior ligadas ao Ministério da Defesa, e não apenas as vinculadas à pasta da Educação.

Outro ponto que precisaria ser tratado é a existência de bancas de heteroidentificação para garantir que as vagas estejam sendo ocupadas por pessoas às quais elas realmente se destinam. “Também é necessária a ampliação das políticas de permanência estudantil e a adaptação dos processos seletivos para indígenas e quilombolas, que recebem uma educação diferente da urbanizada, para a qual o vestibular comum é voltado”, acrescenta Bernardino-Costa.

Há quem defenda que as cotas também se estendam para a pós-graduação, assegurando a continuidade dos estudos e ascensão na carreira acadêmica dos cotistas. “É importante que esses estudantes continuem se vendo dentro da universidade, inclusive almejando postos de lideranças, como professores e diretores”, observa Dyane Reis, pesquisadora negra que é também diretora do Centro de Artes, Humanidades e Letras da UFRB.

Para que se tenha uma melhor compreensão dos primeiros avanços e desafios das cotas, seria importante mapear, ainda, a inserção no mercado de trabalho de cotistas egressos. A impressão geral é de que o acesso à graduação pública já surte efeitos positivos na vida socioeconômica dos estudantes. Com os conhecimentos adquiridos na universidade, Poran retornou ao seu território para pôr em prática o plano de recuperação ambiental que tanto sonhava.

Já Júlia em breve se formará em Relações Internacionais com diversos estágios em grandes empresas no currículo. “A Lei de Cotas realmente mudou a minha vida e eu espero que cada vez mais estudantes tenham acesso ao ensino superior e a possibilidade de melhorar as condições de suas famílias também”, deseja a futura internacionalista.