Teresa Ruas - Vida de Prematuro

Por Teresa Ruas

Doutora em Ciências da Saúde, especialista em desenvolvimento infantil, fundadora do @prematurosbr e mãe de dois prematuros

 

São Paulo


Contato pele a pele desde o começo da vida de nossos prematuros: eis o tema mundial que demarca a campanha de 2022 para o Novembro Roxo, dirigida aqui no Brasil pela ONG Prematuridade.com e apoiada por várias instituições de saúde e educação, associações, empresas, projetos sociais (como o @prematurosbr), perfis do Instagram, famílias de prematuros e equipes neonatais.

Ter e sentir o nosso bebê prematuro em nossos colos, corpos e mãos faz com que nós, mães, preenchamos os nossos úteros e braços vazios. O vazio de um corpo, alma e corações que desejam somente estar conectados à cria é uma dor imensurável e muito profunda. Os pais não têm a dor de não mais carregarem e abrigarem os seus bebês nos úteros, mas carregam sentimentos muito difíceis por, também, apresentarem os seus braços e colos vazios. E todos esses sentimentos podem aumentar ainda mais, gerando até transtornos psíquicos (depressão, ansiedade, pânico) quando os pais ainda são vistos e tratados como visitas em muitas UTIs neonatais espalhadas em nosso país.

 — Foto: Getty Images
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Contato pele a pele para mim é um conjunto pleno de três aspectos fundamentais: CIÊNCIA, AFETIVIDADE E ESPIRITUALIDADE, que se interligam entre si em prol da manutenção e promoção da vida e saúde materno-infantil, saúde parental e de todos os envolvidos no cuidado íntimo e duradouro de um prematuro, envolvendo também a figura do pai, parceiros (as), avós e, por muitas vezes, até mesmo os irmãos mais velhos.

Já caminhamos muito e já realizamos muitas mudanças e movimentos em prol da conscientização do que, de fato, significa nascer antes do tempo. Lembro-me que há mais de 20 anos, os profissionais que desejavam estudar o valor terapêutico e real significado de humanização eram vistos como “loucos”. O amor, a afetividade, o cuidado íntimo e duradouro dos pais, o poder da experiência, a presença parental nas UTIs neonatais não eram compreendidos como elementos de extrema importância, fundamentados pela ciência e recursos humanizados em prol da manutenção, garantia e promoção da vida de tantos bebês prematuros, de baixo peso e de risco.

Felizmente e acredito que, diante da minha própria história de ter nascido de 29 semanas gestacionais na década de 80, quando me aventurei pelo mundo áspero/biológico da saúde, sempre estive envolvida em ações, propostas e pesquisas que desejavam unir os profissionais de saúde que demonstravam seus corações aflitos por mais empatia, acolhimento afetivo e humanização nos contextos de UTI neonatal e suas mentes "loucas", que buscavam afirmar o quanto o amor e a presença materna e paterna, junto aos seus prematuros internados, podiam curar.

Carrego uma imensa gratidão por tantas almas que desejaram o mesmo objetivo e que lutaram arduamente para fazer com que os pais pudessem se adentrar e permanecer no contexto hospitalar. Muitas já não estão mais aqui nesse mundo terrestre, mas plantaram a semente da humanização e de muitas mudanças científicas em prol da manutenção da vida prematura, que nasce no limite da vida e morte ao mesmo tempo.

Atualmente, a ciência consegue manter a vida de prematuros muito extremos, com as suas poucas 22, 23 semanas de vida e suas pouquíssimas gramas - 300, 400... Caminhos árduos, com muitas batalhas, mas também com muitas vitórias. E uma das maiores vitórias é, com certeza, verificar que o mundo todo no dia 17 de novembro de 2022 reflete sobre a importância do contato pele a pele desde o nascimento (se possível clinicamente), a presença dos pais como os principais cuidadores de todo e qualquer prematuro, independentemente de sua condição e estabilidade clínica, e sobre a importância do amor e da afetividade em prol de todos os envolvidos no contexto prematuridade (bebês, mãe, pai, irmãos, avós).

A prematuridade e os seus multifatores socioafetivos e econômicos que lhe influenciam é prática de saúde pública em nosso país. A compreensão de que a prematuridade não se finaliza com a alta hospitalar está sendo cada vez mais ampla em nossos programas públicos e da saúde da família que prezam pelo seguimento ambulatorial do prematuro. Cuidar e acolher a saúde psíquica materna e paterna têm sido fonte de atenção em muitas UTIs neonatais e serviços voltados aos pais prematuros. Práticas de humanização em nosso país que transformam o ambiente “seco” e “frio” de nossas UTis neonatais têm trazido, cada vez mais, cores, alegria, músicas, sorrisos, acolhimento, diálogos, abraços e encantamentos para a produção de vida/sentimentos positivos em um contexto marcado pela dor, angústia, incertezas e medo.

É gratificante, não somente como profissional de saúde, mas também como mãe de dois prematuros e que luta, diariamente, por essa causa, juntamente com tantos outros colegas e famílias, verificar que o poder do amor se cientificou, se podemos dizer assim. Para mim, o amor pelo simples e intenso amor sempre curou e transformou vidas. Mas a ciência demanda e precisa de respaldos! O contato pele a pele, o método canguru, as práticas de humanização e a presença dos pais como reais cuidadores são algumas das provas concretas para a ciência de que o amor pode vencer muitas batalhas, promover a vida, garantir mais saúde e gerar bem-estar.

Ainda temos muitos caminhos a serem trilhados e conquistados. Muitas batalhas a serem vencidas. Atualmente, uma das maiores batalhas ainda tem sido alcançar a garantia da presença de mãe, pai, parceiros(as) nas UTIs neonatais sem hora marcada para a permanência, e não sendo vistos como visita. O contato pele a pele de forma íntima, duradoura e com poder regenerador somente acontecerá se os pais estiverem presentes, sendo parte integral e indispensável do cuidado de seu(s) filho(s) nascido(s) prematuramente.

Porém, o sentimento de gratidão é muito maior e pulsou em meu coração durante toda a escrita desse texto. Queria agradecer imensamente a toda força e luta travadas e dirigidas pela ONG Prematuridade.com, pela equipe interdisciplinar do projeto social @prematurosbr e pela revista CRESCER em ter desenvolvido a nossa coluna Vida de Prematuro. Em nome de todas as famílias, prematuros e equipes interdisciplinares que tenho a honra de conhecer e acompanhar, deixo aqui o meu agradecimento a @asvittoriasdaanna como representante de todos vocês.

Seguimos e não vamos parar de lutar em prol das famílias, seus prematuros e equipes. Enquanto eu estiver com vida terrestre, o meu propósito de vida em unir ciência, afetividade e espiritualidade em prol dos prematuros, famílias e equipes continua. Isso será o meu grande norte para futuras e sólidas direções. E estarei unida a muitos colegas da saúde, profissão, alunos, famílias, bebês, instituições e programas para que os caminhos sejam trilhados em direção ao norte mais seguro.

Com afeto, Teresa Ruas.

Teresa Ruas, mãe de dois prematuros, Maitê e Lucca, especialista e consultora em desenvolvimento infantil, mestre em Educação Especial com foco na prematuridade. Fundadora da equipe interdisciplinar @prematurosbr, sócia e coordenadora da primeira infância do programa parental @beequaloficial  — Foto: Arquivo pessoal
Teresa Ruas, mãe de dois prematuros, Maitê e Lucca, especialista e consultora em desenvolvimento infantil, mestre em Educação Especial com foco na prematuridade. Fundadora da equipe interdisciplinar @prematurosbr, sócia e coordenadora da primeira infância do programa parental @beequaloficial — Foto: Arquivo pessoal

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