• Sabrina Ongaratto
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"Meu nome é Mariane Knupp, mas atualmente sou mais conhecida como a 'mae do Artur'", diz a dona de casa e estudante de enfermagem de Manhuaçu, Minas Gerais, ao se apresentar para a reportagem. Ela, que tem uma menina de 6 anos, lembra com detalhes do dia 11 de agosto do ano passado, quando o caçula chegou. "Contar a historia de Artur é reviver o dia 11 de agosto de 2020, mais precisamente às 8h16 da manhã, onde, por um parto cesáreo, chegou o meu segundo amor. Um bebe tão lindo, cheio de vida, grande, saudável e muito, muito amado e desejado", diz.

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Artur, segundo a mãe, era um bebe "nomal". "Mamava no peito como a maioria das crianças de sua idade, reflexos presentes, consultas ao pediatra... Estava, até então, tudo dentro do normal. Comemoramos o primeiro mesversário com muita alegria e nem passava por nossas cabeças que já, já, nosso 'calmo mar' seria atingido por uma tempestade", disse. Foi com 45 dias de vida, que o menino começou a dar sinais de que algo não estava bem. "Ele estava muito molinho, embora achássemos que fosse pelo seu tamanho, era um bebê muito grande e pesado para a idade. Mas a respiração de Artur também estava ofegante e ele se sentia cansado. Levamos ao pediatra, que já pediu exames. Logo, ele foi internado com pneumonia. A partir daí, nosso céu já se coloriu de cinza", lembra.

Artur completará 1 ano em agosto (Foto: Reprodução/Instagram)

Artur completará 1 ano em agosto e depende do oxigênio diariamente (Foto: Reprodução/Instagram)

Primeiros mesversário do Artur, antes do diagnóstico (Foto: Reprodução/Instagram)

Primeiros mesversário do Artur, antes do diagnóstico (Foto: Reprodução/Instagram)

Diagnóstico: AME

"De um dia para o outro", conta Mariane, Artur foi para a UTI. "Eu só chorava, fazia orações, meus olhos estavam inchados, cabelos despenteados e uma aflição sem fim. Dias depois, novos exames foram feitos, mas não se chegava a uma conclusão. Até que o pai de Artur, consultando a internet, suspeitou de uma doença chamada AME", conta. "Lembro que, da sala da UTI, eu via o médico conversando com os plantonistas e nada de falar comigo. Aquilo me consumia, pois eu sabia que ele estava lá somente para tratar de Artur. E, então, veio o possível diagnóstico: AME. Confesso que quando o médico falou sobre a doença, nem uma lágrima escorreu dos meus olhos. Aguentei firme. Fomos para o hospital de referência dentro de uma ambulância, desesperada para chegar ao local. Lá, vieram 13 profissionais da saúde, entre médicos, enfermeiros, fisioterapeutas e eu ali, com meu filho nos braços, olhando aquele alvoroço todo — pois se tratava de uma suspeita de uma doença grave e rara", conta.

Artur foi levado para a UTI e pediram para que Mariane esperasse na porta. "Levaram meu filhinho, tão pequenininho, tão indefeso e tão lindo. Ver ele adentrando aquele CTI sozinho... achei que não fosse aguentar. Os minutos eram intermináveis. Quando me chamaram para vê-lo, eu o ouvia chorar. Assim que entrei, meu Deus, que desespero! Meu filho estava com um respirador, sem roupinha, todo monitorado e com uma sonda no narizinho. Meu peito cheio de leite e meu filho não podia mamar. Foi coletado o exame da bochechinha para detectar a suspeita médica e somente depois de 15 dias — que pareciam uma eternidade —, veio a confirmação. Meu filho, justamente o meu filho, é portador de AME (Atrofia da Medula Espinhal). Uma doença rara, degenerativa e cruel. Nesse dia, meu céu foi transformado em uma tempestade real. Passei pelo luto do filho idealizado — que vai andar, falar, correr, brincar, comer como toda criança. Passei pela fase da aceitação da doença e, por fim, depois de três meses, levei Artur para casa", lembra.

Medicamento mais caro do mundo

Hoje, com 2 anos, Mariane conta que evita sair de casa com o filho. "A AME é muito imprevisível. Ele pode ter uma manhã bem, mas sem garantia de um anoitecer bem. Além disso, quando saímos, as pessoas o veem com olhar de espanto, de piedade, de julgamentos", conta. "Hoje, meu filho continua sendo muito amado. A condição dele não o faz diferente para mim. E é por isso que eu luto para que ele tenha a chance de viver o que a AME não permite que ele viva", diz.

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A família hoje luta para adquirir um dos medicamentos considerados mais caro do mundo. "Estamos falando de US $ 2,125 milhões. É o Zolgesnma. Algo surreal para 98% da população brasileira", diz. Mas ela não desiste. Com uma campanha em andamento, o objetivo é fazer com que Artur tenha direito ao tratamento. "Temos amigos que ajudam na campanha na qual chamamos de anjos. Artur hoje faz terapia ocupacional, acompanhamento com fonoaudiólogo, fisioterapeuta, além da equipe médica que o acompanha. Abrimos um processo para contra a Uniao, pois sabemos que várias crianças já ganharam o medicamento pelo SUS, mas o direito de viver do meu filho foi negado duas vezes. Mesmo assim, continuamos recorrendo e gritando por essa criança. Embora às vezes cansada, sigo muito esperançosa por dias melhores. Hoje eu entendo que não foi Deus quem me escolheu para cuidar de Artur, mas, sim, Artur quem nos escolheu e Deus permitiu", finalizou.

Informações sobre como ajudar na campanha de Artur você encontra diretamente no perfil @ame.artur no Instagram e no site Vakinha

Artur com a família, durante internação (Foto: Reprodução/Instagram)

Artur com a família, durante internação (Foto: Reprodução/Instagram)

Artur com a irmã, Pietra, 6 anos (Foto: Reprodução/Instagram)

Artur com a irmã, Pietra, 6 anos (Foto: Reprodução/Instagram)

Sobre a AME

A atrofia muscular espinhal é uma doença rara degenerativa, que ocorre quando a criança não recebe nenhum gene SMN1, nem do pai, nem da mãe. Segundo Adriana Banzato, neuropediatra do Hospital Pequeno Príncipe (PR), esse gene é responsável pela produção da proteína SNN, que dá força para os neurônios motores. As pessoas deveriam possuir duas cópias do gene SMN1 e duas cópias do gene SMN2, mas, caso o indivíduo tenha uma cópia do SMN1, isso já é suficiente para produzir a proteína. Quando a criança não tem nenhuma cópia do SMN1, ela não produz a proteína SNN e seus neurônios motores vão morrendo com o tempo, então, ela vai perdendo os movimentos dos membros inferiores e, em um quadro mais avançado, pode evoluir para uma tetraplegia. O primeiro sinal a que os pais precisam estar alertas é o atraso no desenvolvimento, como demora para levantar o pescoço e se sentar, dificuldade para agachar e fraqueza muscular. Com o tempo, as crianças também podem ter dificuldades para movimentar a musculatura respiratória e precisar do suporte de respiradores.

Um dos tratamentos disponíveis no Brasil é com o Spinraza, que é oferecido pelo SUS. De acordo com a neuropediatra, essa medicação é aplicada pelo procedimento de punção lombar. Ela é responsável por incentivar o gene SMN2 produzir a proteína para os neurônios motores que ainda não morreram. Esse remédio consegue retardar a doença, mas não recupera os neurônios que já morreram. Além disso, é um remédio contínuo que dever ser aplicado durante toda a vida. Já a terapia gênica com Zolgensma, considerada a medicação mais cara do mundo, sendo comercializada nos Estados Unidos por cerca de US$ 2,125 milhões, faz com que o gene SMN1 seja desenvolvido e produza a proteína necessária para fortalecimento muscular. Ela também não vai recuperar os neurônios motores que já morreram, mas vai fornecer a proteína para os neurônios motores adormecidos e será aplicada apenas uma vez.

A especialista explica que o ideal é fazer os tratamentos o quanto antes para evitar uma perda neural maior. Além do tratamento medicamentoso, a neuropediatra ressalta que as crianças precisam fazer fisioterapia para fortalecer a musculatura. Caso não faça nenhum tratamento, os pacientes vão perdendo suas funções motoras, perdem a mobilidade do trato intestinal e do coração e podem até mesmo morrer.