• Bruna Menegueço
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Two girlfriends meeting in a coffee shop, talking (Foto: Getty Images/Westend61)

(Foto: Getty Images/Westend61)

Minha bebê tinha oito meses quando eu saí pela primeira vez a sós com meu marido. Tudo foi orquestrado nos mínimos detalhes com muita antecedência. Minha filha ficou com meus pais por 24 horas (do meio-dia de sábado até o meio-dia de domingo) para irmos até Limeira, no interior de São Paulo, para o casamento de uma grande amiga.

Entre decidir ir à festa e finalmente entrar no carro, eu passei por uma montanha-russa de sentimentos. Pensei que estava abandonando a minha filha para ir dançar. Será que eu tinha esse direito? Ao mesmo tempo, não via a hora de me sentir mulher novamente e sentar no banco da frente do carro ao lado do meu marido. Veja só, eu sentia falta de algo tão simples.
Quando a entreguei para minha mãe, saí aos prantos, com a sensação de estar cometendo o maior de todos os pecados. Mas assim que cheguei ao salão de beleza para me arrumar, me senti bem, conversei, dei risada. Há tanto tempo eu não me permitia esse prazer! E assim foi, até aquele momento da festa em que bate o cansaço e todo mundo senta na mesa para recuperar a energia. Eu sentei e chorei. De saudade e de culpa.

O SHOW TEM QUE CONTINUAR

Vida de mãe é mesmo uma confusão de sensações. Uma hora você busca qualquer possibilidade para respirar longe dos filhos. Logo depois, conta os segundos para abraçá-los novamente. “A verdade é que, por mais que você sonhe com a maternidade, a vida se transforma tanto que não é possível prever uma rotina ou preparar a mente e os sentimentos. A maternidade acontece todos os dias, em todos os minutos, e mexe com todas as células do nosso corpo. Há os hormônios que buscam estabilidade após o parto, a insegurança, a solidão, o amor que desabrocha intensamente. Mas há também a vida que precisa continuar, que não para só porque seu bebê chegou.Há o casamento, os amigos, o trabalho, a vida social, que, apesar de diferente, precisa acontecer justamente para que vocês se tornem pais e mães melhores e mais felizes”, explica a psicoterapeuta familiar Mônica Genofre, professora do Instituto de Terapia Familiar de São Paulo.

São tantas situações novas que é praticamente impossível não se sentir sobrecarregada – daí a necessidade de contar com rede de apoio constante. E, embora neste mês haja uma data para homenagear as mães, é preciso muito mais. Por isso, CRESCER lançou o desafio #tododiaédiadasmães, justamente para gerar empatia, solidariedade e sororidade pelas mães.

QUE VIDA SOCIAL?

Quando a mulher se torna mãe e se depara com tamanha mudança na rotina, é natural que busque estar próxima de outras mães. Ao começar a procurar histórias para esta reportagem, fiz um post em um grupo de maternidade, em uma rede social. “Vamos falar sobre vida social após os filhos?”, perguntei. Em menos de 30 minutos, mais de 150 comentários, respostas e desabafos, como: “Meu sonho é apenas ir ao cinema”. Ou ainda “Social? Só conheço aquela bolachinha”. Muitas mães relatando que a vida social se limita a ir a festas e programas infantis.

“Trabalhar e ir ao médico é o que faço no meu tempo livre”, foi a resposta da secretária executiva Paula Rossdeutsch, 37 anos, mãe do Lucas Klauss, 6 anos, que recebeu mais de 50 curtidas. Para ela, que trabalhava com eventos antes de ter filhos, a mudança foi total. Atualmente, ela prefere receber os amigos em casa. “Dá para conversar enquanto as crianças brincam. Vez ou outra, organizo um happy hour rápido após o trabalho, com as amigas da faculdade”, conta.

E não são só as mães que ganham em ter os amigos por perto.  Um estudo recente da Universidade do Tennessee (EUA) mostrou que, quanto mais conexões sociais as mulheres tiverem fora do ambiente familiar, melhor para todos, inclusive para os filhos. Bebês e crianças que são expostos ao círculo de amizades da mãe desenvolvem mais habilidades de se relacionar com os adultos, por exemplo.

A group of friends toasting with beer mugs at a pub (Foto: Getty Images)

(Foto: Getty Images)

NOSSA, COMO CRESCEU!

Para a empresária Débora Rossi, 42 anos, o choque da maternidade se deu com o sumiço dos amigos. “Antes de engravidar, minha vida social era muito ativa. Ia do happy hour direto para a balada e minha casa vivia cheia de gente. Organizávamos churrascos e outras comilanças. Mas na gravidez já senti a distância de alguns amigos. Eu fiz tratamento para engravidar e, no início, não tinha disposição para receber em casa. Quando minha filha nasceu, eles sumiram de vez. Atualmente, apenas comentam nas fotos que posto nas redes sociais. Aquele famoso ‘nossa, como ela cresceu!’”, diverte-se Débora. Assim como muitas de nós, ela fez novos amigos, dessa vez, casais com filhos pequenos. “Dividimos o interesse pelo espaço kids nos restaurantes, mesmo que o cardápio não seja dos melhores”, diz.

Parece até contraditório. Muitas mulheres sentem-se sozinhas após o nascimento dos filhos. É compreensível, afinal, com um bebê em casa realmente não dá para acompanhar o pique dos amigos sem filhos, que não se preocupam com horários, refeições e silêncio. Além disso, a mudança também está em você. “O cérebro da mãe é ativado de um jeito que não tolera mais algumas coisas, que antes lhe pareciam normais. E isso varia de pessoa para pessoa: pode ser um barulho muito alto, como o dos lugares que você costumava ir, aquele comportamento mais agitado de um colega, que você acha excessivo para a paz do seu bebê, o cigarro daquele melhor amigo, que nunca incomodou, mas que agora é sinal de perigo completo. E isso é mais intenso logo que o bebê nasce”, explica o psicólogo Ricardo Monezi, pesquisador do Instituto de Medicina do Comportamento da Unifesp.

No entanto, apesar de compreensível, não pode ser algo para se conformar. “A maternidade será solitária se você se comportar assim. Na maioria dos casos, o abandono e a solidão são causados pela própria mãe, que se isola para proteger a cria”, alerta a psicóloga Eliana Melcher Martins, coordenadora no Centro de Estudos em Terapia Cognitivo-Comportamental da Unifesp. Que tal, então, tomar a iniciativa e ligar para aquela sua amiga, convidando-a para ir até a sua casa? Ela pode estar pensando que você não quer recebê-la quando, na verdade, algumas boas horas de conversa farão muito bem – às duas!

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Aliás, esse é o primeiro passo para manter as amizades em dia: compreender o momento do outro. E não adianta só achar que são os seus amigos que precisam entender que você agora tem um filho e ele é a coisa mais importante da sua vida. Você também precisa exercitar a empatia e aceitar aqueles que não estão dispostos a conviver com o mundo infantil. Além disso, por mais linda que seja sua experiência, nada de cobrar os outros para terem filhos ou falar que eles só vão ser assim ou assado quando forem pais. Isso é chato e acaba, mesmo, afastando algumas pessoas.

MENOS REGRAS E MAIS LEVEZA

Foi exatamente o que a influenciadora digital Elaine Violini, 36 anos, aprendeu na prática. Mãe de Valentina, 5 anos, Luigi, 3, e Vittorio, 1, ela conta que abriu mão de algumas regras da maternidade para aproximar as pessoas. “Coloque-se no lugar do seu amigo, que chega em sua casa e encontra uma pessoa completamente transformada. De repente, você pede para ele se lavar, passar álcool em gel, cobre sua roupa com uma fralda e pede que fale baixo. Ora, tudo que é chato afasta as pessoas. Nenhum bebê morreu até hoje por conta de uma risada mais alta”, desabafa. Elaine conta que, ao longo dos anos como mãe, também aprendeu a lidar com a culpa. “Eu até sinto, mas não deixo de fazer nada por conta dela. Enfio-a embaixo do braço e sigo em frente.”

Culpa, aliás, é uma palavra que entra para o nosso vocabulário diariamente após a maternidade. “Vamos fazer uma reflexão sobre ela?”, convida a psicoterapeuta Mônica Genofre. “Ao sair com os amigos ou com o seu companheiro, pense. Você teve interesse em fazer mal a alguém? Se a resposta é negativa, a palavra culpa não deveria encaixar. Temos de buscar outra forma de descrever esse sentimento. Não se pode sentir culpa por algo que é necessário, que faz bem e que, no longo prazo, vai ajudar a manter seu círculo de amigos e o seu casamento saudável, o que, inclusive, é valioso para os filhos. Vou além: em quem você vai descontar o seu desprazer diante de tamanha privação?”, analisa Mônica.

Para sair com o marido e amigos, Elaine aciona sua rede de apoio. “Peço ajuda para minha mãe, tia ou comadres. Sem peso nenhum na consciência. E o mais importante: deixo que a pessoa que está cuidando dos meus filhos assuma totalmente o comando. Ela tem liberdade para tomar as decisões sem me consultar. Dessa forma, eu demonstro a minha total confiança e gratidão”, diz.

Mother and daughter are walking on the street (Foto: Getty Images/iStockphoto)

Mother and daughter are walking on the street (Foto: Getty Images/iStockphoto)

Rede de apoio também é a solução para a publicitária Camila Fornasier Von Adamek, 41 anos, mãe de Pedro, 1 ano. Ela conta com a ajuda da babá e dos seus pais, e não abre mão dos jantares a dois e dos encontros semanais com os amigos. E pensar que a maternidade para ela foi uma surpresa! Camila nunca quis ter filhos. Era daquelas que viajavam cinco vezes ao ano para o exterior. Adorava refeições regadas a bons vinhos. Até que entre uma troca de DIU e o agendamento da cirurgia de vasectomia do marido, o preservativo furou e ela engravidou do seu primogênito, aos 40 anos. “Quando o bebê chega, morre aquela mulher e nasce outra. O segredo é se acostumar com a nova realidade, ter equilíbrio e buscar ajuda para não perder a sua identidade”, conta Camila.

Dessa forma, todo mundo sai ganhando. Os pais, que podem aproveitar esse tão desejado momento sem pressa, sem preocupações, sem horários rígidos. E as crianças, claro, que acumulam novas experiências, no aspecto físico e emocional, e têm mais repertório para enxergar o mundo de formas diferentes. “Ao permitir que a avó seja avó sem a sua presença, você oferece um novo contexto para o seu filho”, afirma a psicóloga Eliana.

ESCOLHA O COPO MEIO CHEIO

Por isso, há sim, quem garanta que a vida social melhorou após os filhos. Para a relações-públicas Lara Giannotti, mãe do Nicolas, 1 ano, leveza é a palavra que guia o seu maternar. “Sempre tivemos uma vida social agitada e, quando engravidamos, um dos principais planos era que o bebê fizesse parte do nosso estilo de vida. Um dos melhores exemplos para nós é o Carnaval. Amamos a data e sempre curtimos muito. No ano passado, mesmo na reta final da gravidez, não ficamos em casa nenhum dia. Neste ano, a estreia do Nicolas foi em um bloquinho infantil. Ele não gostou muito. Ficou agarrado no colo, não quis saber de confete nem serpentina. Mas insistimos. A cada bloquinho, ele aprendia a se soltar mais. O olhar desconfiado deu lugar a um folião de respeito, que dança, batuca nos instrumentos e joga confete. Jamais imaginei que o nosso feriado preferido do ano fosse ficar ainda mais legal com a chegada de um filho, mas isso aconteceu!”, conta. Lara também recebe os amigos em casa ou programa encontros na praça e em outros lugares kids friendly: “Temos a imensa sorte de estarmos cercados de amigos na mesma fase que nós. Isso favorece as reuniões, que só ficaram mais barulhentas e coloridas”, completa.

Eu, no entanto, confesso que ainda estou buscando esse equilíbrio na maternidade. Ainda vivo o sobe e desce de emoções. Busco momentos a sós, com o meu marido e com os amigos, mas quando, finalmente, consigo, sinto um aperto no peito de saudade da minha filha. Há pouco mais de um mês, eu e meu marido viajamos sozinhos pela primeira vez. Novamente, minha bebê ficou com os meus pais e passamos 48 horas longe dela. Dessa vez, fiquei ansiosa e contei os minutos para o dia da viagem. Comprei roupa nova, arrumei a mala calmamente e curti cada segundo. No dia do retorno, claro, quis acelerar o tempo para voltar para casa. Saudade e culpa se misturaram no meu peito. Mas quando cheguei e nos abraçamos por longos minutos, eu percebi que a nossa conexão não se perde nem diminui. E é por isso que, todos os dias, eu busco o bom senso para tomar as melhores decisões e ser uma mãe melhor. E, muitas vezes, elas passam pelo meu lado mulher e profissional. Ainda bem! Porque cultivar as relações com colegas e amigos – e ser feliz também no meu círculo social – é muito valioso.

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