Paula Daidone

Por Paula Daidone

Colunista | Jornalista de vinhos, sommelière, especialista em marketing de vinhos e idealizadora da plataforma Reserva85

Vinho seco e suave são classificações que indicam a quantidade de açúcar presente no vinho. O seco seria um vinho sem percepção de açúcar; e o suave um vinho doce. Entre esses extremos, existe o meio seco. Como você pode observar na tabela de doçura, a categoria seco é super restritiva, enquanto a meio seco é mais abrangente e engloba desde vinhos sem percepção de açúcar até os bem doces.

A categorização causa muita confusão, para não dizer problemas, pois é exclusiva do Brasil. Outros países produtores usam classificações diferentes. Na União Europeia, por exemplo, a classe dos vinhos secos abrange até 9 g de açúcar, mais do que o dobro permitido no Brasil. Com isso, frequentemente, produtos europeus ganham novos rótulos quando importados ao país.

A classificação brasileira de doçura do vinho é mais rigorosa que nos outros países — Foto: Divulgação
A classificação brasileira de doçura do vinho é mais rigorosa que nos outros países — Foto: Divulgação

A Alemanha sofre com essa questão. Muito renomada na produção de vinhos brancos com a uva Riesling, os "Trocken" (como são chamados os vinhos secos) viram meio secos quando chegam aqui. É o caso do Riesling Kabinett Foster Mariengarten 2020 Eugen Müller (R$ 170, Decanter) e do Dr. Loosen Trocken Qualitatswein Riesling Dry (R$ 119, Inovini), que, no rótulo da frente, consta seco e no contra-rótulo, incluído no Brasil, meio seco.

MITO: Vinho suave e meio seco não são bons

Além da questão da rotulagem, os meios secos e suaves enfrentam outro problema: a dúvida da qualidade. Propaga-se por aí que essas categorias não prestam. Mas não há, tecnicamente, qualquer ligação entre qualidade e teor de açúcar.

Inclusive, algumas das regiões vinícolas mais importantes do mundo produzem vinhos com uma quantidade de açúcar que extrapolam o limite do "seco" no Brasil, como a Puglia, na Itália; o Alentejo, em Portugal; e a Califórnia, nos EUA.

A diferença entre vinho fino e de mesa diz respeito a origem das uvas usadas na fabricação — Foto: Freepik / Creative Commons
A diferença entre vinho fino e de mesa diz respeito a origem das uvas usadas na fabricação — Foto: Freepik / Creative Commons

O famoso Primitivo di Manduria, produzido na Puglia, é um ótimo exemplo. É um vinho com qualidade reconhecida mundialmente, comercializado a preço elevado e possui uma quantidade de açúcar maior. Os rótulos Terre di San Vicenzo Dal 1947 Primitivo di Manduria (R$ 354, La Pastina) e o Primitivo di Manduria Menhir Salento (R$ 218, Total Vinhos) foram enquadrados como meio secos quando desembarcaram no Brasil.

O vinho suave é uma categoria que sofre ainda mais preconceito. Muita gente acredita que suave é sinônimo de vinho de mesa. Mas não é! Vinho suave é um vinho com alto teor de açúcar, que pode ser elaborado com uvas finas ou de mesa.

VERDADE: Vinho suave e meio seco são ideais para começar a gostar de vinho

Para quem não gosta de vinho seco, provar um com níveis elevados de açúcar pode ajudar a mudar essa percepção. Nós, brasileiros, temos o paladar naturalmente adocicado. Desde pequenos, somos acostumados a consumir açúcar.

Por isso, quando provamos um vinho seco pela primeira vez, há um estranhamento. O primeiro gole é ruim, agressivo. Você já deve ter passado por isso quando provou café sem açúcar. Mas, assim como no café, é natural irmos reduzindo o dulçor gradativamente, até encontrarmos nosso ponto favorito.

Os vinhos suave e meio seco são ideais para quem ainda está acostumando o paladar à bebida — Foto: Freepik / Creative Commons
Os vinhos suave e meio seco são ideais para quem ainda está acostumando o paladar à bebida — Foto: Freepik / Creative Commons

Algumas vinícolas perceberam essa característica local e estão importando vinhos com maior quantidade de açúcar, a fim de atrair o consumidor. É o caso das chilenas Santa Carolina, com um blend branco e outro tinto, ambos suaves (R$ 35 cada, Casa Flora), e Santa Rita, um rosé suave (R$ 42). A Sur Valles, também do Chile, acaba de lançar no Brasil uma linha completa na categoria meio seco, a Sentimiento Por (R$ 60 cada, WBlends).

As vinícolas brasileiras também estão se rendendo ao vinho suave e criando produções com uvas finas. A Casa Valduga possui uma linha inteira nessa divisão, a Naturelle (R$ 60); a Pizzato tem o Fausto Violette (R$ 59) e a Rio Sol um exemplar de Cabernet Sauvignon, além de um Syrah meio seco (ambos a R$ 33).

VERDADE: Vinho suave e meio seco combinam com comida brasileira

Rótulos com índice superior de açúcar, além de serem uma excelente porta de entrada para o mundo dos vinhos, também acompanham muito bem a gastronomia brasileira. Nossa comida costuma ser muito condimentada ou açucarada, por isso, é necessário que o vinho apresente níveis altos de açúcar que equilibrem o prato. É importante lembrar que a nossa culinária tem muita influência portuguesa e italiana, onde o vinho possui naturalmente níveis elevados de açúcar.

Experimente harmonizar vinhos suave e meio seco com pratos brasileiros — Foto: Pixabay / Creative Commons
Experimente harmonizar vinhos suave e meio seco com pratos brasileiros — Foto: Pixabay / Creative Commons

Faça alguns testes e experimente provar receitas brasileiras com vinho meio seco e suave: sirva um baião de dois ou uma feijoada com um tinto meio seco; e um bobó de camarão ou um acarajé com um branco suave. Você perceberá que o vinho, acompanhado da comida certa, cria uma explosão de sabores na boca e transforma a refeição em um momento mágico.

Você pode viver esse tipo de experiência no dia a dia. Basta deixar todo e qualquer preconceito de lado e trazer cada vez mais o vinho, seja ele seco, meio seco, seja suave, para a nossa mesa!

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