Malu Gaspar
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O deputado federal Chiquinho Brazão (sem partido-RJ) destinou R$ 7 milhões em emendas parlamentares e planejava mandar outros R$ 3,5 milhões neste ano para entidades que entraram na mira da Polícia Federal (PF) durante o curso das investigações do caso Marielle Franco (PSOL). Os valores foram compilados nos sistemas da Câmara dos Deputados por técnicos da Casa, a pedido da equipe do blog.

Na última quinta-feira (23), a PF solicitou ao Supremo Tribunal Federal (STF) a abertura de um inquérito para apurar “indícios veementes da suposta destinação de verbas oriundas de emendas parlamentares” destinadas a ONGs por Chiquinho e outro parlamentar, Pedro Augusto (PP-RJ), “para fins de obtenção de vantagens indevidas”.

Denunciado pela Procuradoria-Geral da República (PGR) como um dos mandantes do assassinato de Marielle, Chiquinho destinou R$ 7 milhões apenas para a ONG Instituto Carioca de Atividades (ICA), que se apresenta em seu site como uma entidade voltada para projetos de “assistência social, culturais, esportivos e entre outros”.

Antes de ser preso, Chiquinho apresentou propostas para encaminhar emendas a outras duas ONGs sob suspeita, a Contato e o Instituto de Formação Profissional José Carlos Procópio (Ifop), que receberiam R$ 1,5 milhão e R$ 2 milhões, respectivamente, com verbas do Ministério das Mulheres. Elas ainda não foram analisadas pela Câmara.

Além de Chiquinho, a PGR denunciou o conselheiro do Tribunal de Contas do Estado Domingos Brazão, irmão do deputado, e o delegado da Polícia Civil Rivaldo Barbosa como mandantes do crime.

Os Brazão também são investigados por ligação com grilagem de terras e ligação com milícias que dominam grandes áreas na Zona Oeste da cidade.

Como revelou o programa “Fantástico”, da TV Globo, o assassino confesso de Marielle, Ronnie Lessa, disse em sua delação premiada à PF que a execução seria compensada pelo controle miliciano destes terrenos – uma enorme área a ser loteada com potencial de render R$ 100 milhões aos criminosos.

No relatório complementar, a PF observa que o Instituto Carioca de Atividade (ICA) é responsável pela gestão da Vila Olímpica Professor Manoel José Gomes Tubino, um centro esportivo no bairro da Praça Seca, Zona Oeste do Rio, vizinho dos terrenos que teriam sido oferecidos como pagamento pelo assassinato pelos Brazão a Lessa e o comparsa Edmilson Macalé.

Os delegados responsáveis pelo caso, no entanto, não relacionam o ICA e nem as demais ONGs à morte de Marielle. O objetivo do relatório complementar apresentado ao Supremo foi justamente informar o ministro relator do caso, Alexandre de Moraes, acerca de outros indícios de crimes praticados pelos irmãos Brazão e seus asseclas descobertos durante a investigação da morte da vereadora.

O levantamento das emendas de Chiquinho indica que outras organizações não governamentais foram contempladas com verbas públicas, além de instituições públicas como a Fundação Leão XIII, vinculada ao governo do estado e historicamente controlada pelo clã.

Mas um delegado da PF afirmou à equipe do blog, sob reserva, que tanto o ICA quanto as outras duas ONGs foram as que mais levantaram suspeitas por conta da articulação de um assessor de confiança do clã, Robson Calixto Fonseca, conhecido como Peixe.

Mensagens captadas pela PF demonstram que Peixe, oficialmente lotado no Tribunal de Contas do Estado do Rio (TCE-RJ) até a prisão dos irmãos Brazão, articulou a distribuição de emendas para ONGs do estado do Rio junto a um assessor de Chiquinho, Wendre Angelim Dias, e representantes das entidades.

Apesar das verbas serem uma prerrogativa de Chiquinho enquanto deputado federal, os investigadores suspeitam que o esquema de desvios era operado pelo irmão Domingos, conselheiro do TCE-RJ.

Isso porque um dos diálogos obtidos pela PF, de novembro do ano passado, mostra Wendre cobrando de Peixe a definição quanto a emendas de R$ 4 milhões que seriam carimbadas pelo parlamentar. Peixe responde que iria para a casa do chefe, Domingos, naquele instante. Wendre então pede agilidade na resposta, uma vez que Chiquinho estaria na Câmara naquela data.

Para a PF, “depreende-se, portanto, que o chefe a que Peixe faz menção é Domingos Brazão e não Chiquinho, visto que este também estava a esperar a definição”.

Nas conversas da dupla também é possível identificar a costura para as emendas que estão até agora em análise na Câmara. Entre setembro de 2023 e fevereiro de 2024, Peixe e Wendre combinaram de enviar R$ 3,5 milhões às ONGs Contato e Ifop.

O relatório da PF também destaca que a Contato foi envolvida no caso Ceperj, como ficaram conhecidas as denúncias de que havia uma “folha de pagamento secreta” do governo do Rio, revelada pelo UOL em 2022, e a nomeação de 45 mil pessoas para cargos temporários no próprio Ceperj e na Universidade Estadual do Rio de Janeiro (Uerj) que teriam acomodado aliados e cabos eleitorais do governador Cláudio Castro (PL).

A entidade, que firmou contratos com o Ceperj investigados pelo Ministério Público, é comandada por Cíntia Gonçalves Duarte e Raphael da Silva Gonçalves, seu marido, que articulou diretamente com Peixe o envio de emendas de Chiquinho para a Contato e intermediou o repasse de verbas para eventos e ações sociais de interesse dos irmãos Brazão.

A proximidade de Peixe com os Brazão também é ressaltada pela PF. Além de assessorar Domingos no TCE e atuar como um segurança informal, segundo a delação de Ronnie Lessa, Peixe fez a intermediação entre o assassino e o clã. Ex-policial militar, ele também faria a cobrança de dívidas em nome de milicianos.

Se os pedidos da PF forem acatados pelo ministro Alexandre de Moraes, Peixe também será investigado por posse ilegal de armas de uso restrito. Os policiais encontraram na casa do assessor uma arma de propriedade da Polícia Civil fluminense com a gravação da sigla da Força Nacional.

Para os delegados, não há justificativa aparente para que o armamento estivesse sob a posse do aliado dos Brazão, que é soldado reformado da Polícia Militar do Rio. Também foi encontrada com Peixe uma pistola calibre .380 com a numeração de série raspada. Se for confirmado crime, uma eventual condenação pode render de três a seis anos de prisão.

Capa do audio - Malu Gaspar - Conversa de Bastidor
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