Em uma iniciativa que reverencia o artesanato e a sabedoria ancestral, mulheres de três associações quilombolas do Tocantins se uniram para desenvolver a coleção Jalapoeira Apurada, uma série de esculturas feitas com capim-dourado e buriti. Como o próprio nome antecipa, a linha enfatiza o orgulho das integrantes de pertencerem à região paradisíaca que tornou-se destino de uma série de viajantes.
O projeto foi idealizado com o intuito de fomentar a produção das artesãs e, consequentemente, melhorar a qualidade de vida de toda comunidade. Para materializar o objetivo, a ação conta com participantes da Associação Comunitária dos Artesãos e Pequenos Produtores de Mateiros (ACAPPM), Associação de Artesãos e Extrativistas do Povoado do Mumbuca e Associação Quilombo do Prata, além do apoio do WWF-Brasil, do Instituto A Gente Transforma (IAGT) e da Central do Cerrado.
Em um processo criativo que durou cerca de dois anos, as artistas utilizaram os mesmos materiais e técnicas com os quais já eram familiarizadas. No entanto, a escala da produção atingiu proporções maiores para que pudesse penetrar em novos mercados. O resultado foram artigos suspensos por pés metálicos que chegam a 1,8 m de altura e formam uma grandiosa instalação artística.
A respeito da apresentação dos exemplares diferenciados para as artesãs, o presidente do Instituto A Gente Transforma (IAGT), Marcelo Rosenbaum, ressalta que houve a busca por uma identidade que partisse das memórias das mulheres relacionadas ao capim-dourado. Além disso, houve um incentivo para que elas pudessem se expressar como conhecedoras desse universo amplo de arte e de resistência na luta pelo território. “Durante a imersão que fizemos, entendemos que tratava-se de um exercício de escuta, de trazer o protagonismo das mulheres quilombolas e exaltar esse saber manual que é uma arte ancestral. O que queremos trazer aqui é a força dessa união de mulheres que trabalham pela conservação do Cerrado”, pontua Rosenbaum.
A parceria entre as artesãs também foi um aspecto citado pela presidente da associação do Mumbuca, Railane Ribeiro da Silva: “Esse projeto proporcionou muita força e muita garra para nós todas. Foi maravilhoso e muito desafiador no primeiro momento, porque ficamos com medo de não conseguir fazer. Os modelos que ele [Marcelo Rosenbaum] trazia nunca tinham sido feitos de capim-dourado, então a gente ficou com medo de arriscar”, relembra.
Múltiplas vertentes
A transformação proporcionada pelo projeto foi um dos aspectos citados pela presidente da Associação Quilombo do Prata, Luzia Passos Ribeiro, que afirma que, em sua comunidade, 90 famílias vivem da agricultura familiar e do extrativismo. “Poucos aqui têm salário, a pesca paga muito pouco, então o capim representou um trabalho diferenciado em termos de renda”, conta.
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Ainda sem a titularidade oficial emitida pelo governo, o Quilombo do Prata hoje sofre pressão do agronegócio, que avança pela localidade. “Também por isso precisamos manter essa cultura viva, para preservar a nossa região, a nossa casa. Já imaginou o Jalapão sem o capim-dourado? Não existiria”, finaliza Luzia.