Gente

Por Vitoria Moura Guimarães*


Mathieu Lehanneur — Foto: Felipe Ribon
Mathieu Lehanneur — Foto: Felipe Ribon

Difícil permanecer impassível diante dela. Improvável também não querer segurá-la. A Tocha Olímpica, símbolo da tradição secular dos Jogos Olímpicos e responsável por dar o start à contagem regressiva para o início da competição, está logo ali, na nossa frente, exibida como um troféu. Estamos em meados de janeiro e a Factory (a referência à Factory de Andy Warhol não é mera coincidência), novo endereço de 800 m² do designer francês Mathieu Lehanneur nos arredores de Paris, está a todo vapor.

A poucos dias da edição 2024 da Maison&Objet (a feira aconteceu na capital francesa entre 18 e 22 de janeiro), que elegeu o profissional como designer do ano, ele e sua equipe estão às voltas com a instalação que será apresentada no evento: uma nova proposta de habitação inspirada pelas teorias de sobrevivência, mas com um viés otimista. Outonomy é uma cabana amarela monocromática, ultra tecnológica, ecológica e auto suficiente, concebida para viver em total autonomia e em sintonia com a natureza.

“É um projeto que une design e tecnologia e que estamos começando a montar para a abertura do salão. Dá um frio na barriga, mas, como Picasso bem disse, ‘se sabemos exatamente o que vamos fazer, para que fazê-lo?’”, questiona com humor.

Maison des Métiers d’Art, em Giverny (vilarejo de Claude Monet), na Normandia, totalmente redesenhada por Mathieu Lehanneur – o espaço é um misto de ateliê e loja conceito, onde é possível conhecer o trabalho e adquirir criações do florescente artesanato local — Foto: Felipe Ribon
Maison des Métiers d’Art, em Giverny (vilarejo de Claude Monet), na Normandia, totalmente redesenhada por Mathieu Lehanneur – o espaço é um misto de ateliê e loja conceito, onde é possível conhecer o trabalho e adquirir criações do florescente artesanato local — Foto: Felipe Ribon
Mathieu em ação no seu ateliê — Foto: Felipe Ribon
Mathieu em ação no seu ateliê — Foto: Felipe Ribon
Série 'Inverted Gravity', na qual bolhas de vidro sustentam grandes blocos de mármore — Foto: Felipe Ribon
Série 'Inverted Gravity', na qual bolhas de vidro sustentam grandes blocos de mármore — Foto: Felipe Ribon

O designer multiplica também os compromissos e aparições graças à sua mais recente e célebre criação: a já mencionada tocha olímpica dos Jogos de Paris. “É uma grande honra e uma emoção. Vai ser difícil segurar as lágrimas”, conta ele, que fará parte do revezamento com início em Olímpia, na Grécia, marcado para o dia 16 de abril (onde a tocha será acesa por meio dos raios de sol) e término em Paris, em 26 de julho, data da abertura oficial dos Jogos Olímpicos de 2024. “A parte mais desafiadora do projeto foi desenvolver um sistema de acendimento à prova de vento, chuva, tempestade, e praticamente invisível para não comprometer o design”, explica. Mathieu se inspirou no tema da igualdade, palavra-chave da edição parisiense dos Jogos, que darão a mesma importância às competições Paralímpicas e terão, pela primeira vez, o mesmo número de atletas homens e mulheres. As águas do Rio Sena, palco da cerimônia de abertura, também serviram de referência para criar o objeto feito de aço reciclado, cuja cor lembra uma mistura de ouro, prata e bronze – apesar de não ser intencional, a forma oblonga da tocha, com duas partes perfeitamente simétricas, faz lembrar o curso do rio quando ele se abre na Île de la Cité e depois afunila novamente.

A tocha olímpica, cuja simetria evoca a igualdade, palavra-chave dos Jogos Olímpicos de Paris, e as ondulações, o Rio Sena – outra inspiração do designer para o projeto — Foto: Felipe Ribon
A tocha olímpica, cuja simetria evoca a igualdade, palavra-chave dos Jogos Olímpicos de Paris, e as ondulações, o Rio Sena – outra inspiração do designer para o projeto — Foto: Felipe Ribon
Mathieu Lehanneur em seu escritório na recém-inaugurada Factory, espaço de 800 m² nos arredores de Paris onde suas criações ganham vida — Foto: Felipe Ribon
Mathieu Lehanneur em seu escritório na recém-inaugurada Factory, espaço de 800 m² nos arredores de Paris onde suas criações ganham vida — Foto: Felipe Ribon

Em paralelo, Mathieu prepara a inauguração de seu pied-à-terre americano (um showroom para se aproximar da sua clientela internacional) no topo de um arranha-céu em Manhattan, Nova York, e uma exposição no Denver Art Museum, ambos nos Estados Unidos. Um verdadeiro percurso atlético.“Mas eu sou péssimo em esportes. Gosto assim, à distância”, diverte-se, mostrando a vista da janela do seu escritório na Factory, que dá para um campo de futebol. “Sou mais ciências”, continua o designer, que sonhava em se tornar médico. Mas o destino agiu e seu caminho acabou enveredando para o das artes, e ele descobriu no design o compromisso perfeito. “A arte pode ser muito solitária. Eu preciso de gente, de relações humanas e de saber que minhas criações têm uma função, que serão tocadas, que podemos colocar um copo em cima ou que crianças possam correr em torno delas”, conta Mathieu, cuja inspiração vem justamente das relações humanas e das emoções decorrentes delas. “O caráter de conexão espiritual dos objetos me fascina – o fogo sagrado da tocha olímpica é um excelente exemplo. Acredito que alguns objetos têm o poder de nos transformar”, reflete. Se ele possui um talismã ou amuleto da sorte? “Não, mas tenho sempre um pequeno artefato no bolso. Pode ser uma pedra, uma dobradiça… A verdade é que preciso sempre ter algo entre os dedos para sentir e mexer. É algo que me tranquiliza.”

Série 'Liquid Marble', no jardim do Château de Chaumont-sur-Loire, na França — Foto: Michel Giesbrecht
Série 'Liquid Marble', no jardim do Château de Chaumont-sur-Loire, na França — Foto: Michel Giesbrecht
Mathieu Lehanneur no seu ateliê, cercado por diferentes materiais que utiliza em suas obras — Foto: Felipe Ribon
Mathieu Lehanneur no seu ateliê, cercado por diferentes materiais que utiliza em suas obras — Foto: Felipe Ribon
O caráter de conexão espiritual dos objetos me fascina – o fogo sagrado da tocha olímpica é um excelente exemplo. Acredito que alguns objetos têm o poder de nos transformar
— Mathieu Lehanneur
A instalação 'Outonomy', apresentada na Maison&Objet do mês passado, uma nova proposta de habitação inspirada nas teorias de sobrevivência, ultra tecnológica, ecológica e autossuficiente — Foto: Felipe Ribon
A instalação 'Outonomy', apresentada na Maison&Objet do mês passado, uma nova proposta de habitação inspirada nas teorias de sobrevivência, ultra tecnológica, ecológica e autossuficiente — Foto: Felipe Ribon
O coro da Igreja de Saint Hilaire, em Melle, na França — Foto: Felipe Ribon
O coro da Igreja de Saint Hilaire, em Melle, na França — Foto: Felipe Ribon
Na parede, a escultura Pocket Ocean, edição Gold — Foto: Felipe Ribon
Na parede, a escultura Pocket Ocean, edição Gold — Foto: Felipe Ribon

O hábito, com certa conotação infantil, diz muito sobre o designer. Suas obras incutem justamente uma porção irracional, quase onírica, herança dos contos de fada que marcaram sua infância (principalmente Barba Azul): é o caso das séries Inverted Gravity, cuja proeza é apoiar uma grande peça de mármore sobre bolhas de vidro,formando mesas e aparadores, por exemplo, e Ocean Memories, em que a pedra (em forma de bancos e mesas) se transforma em uma superfície líquida e oceânica em uma passagem do inerte ao vivo. A pesquisa,resultado do seu apetite pela ciência e pela tecnologia, é indissociável à sua criação e apareceu cedo: Objets Thérapeutiques (2001), seu trabalho de conclusão de curso da École Nationale Supérieure de Création Industrielle (ENSCI-Les Ateliers), foca na parte psicológica dos medicamentos (efeito placebo) e na desdramatização deles quando necessários para melhorar a relação paciente/doença, e chamou a atenção do MoMA, em Nova York, que o incluiu na sua coleção permanente. Em 2008, ele co criou com o professor David Edwards, de Harvard, com base em observações da Nasa, Andrea, um purificador de ar usado para fortalecer a capacidade natural de filtragem das plantas e capturar partículas tóxicas dos ambientes interiores. Touche-à-tout (expressão em francês que define uma personalidade multidisciplinar), Mathieu Lehanneur recusa a zona de conforto para se aventurar em diferentes campos, da arquitetura (como o coro da Igreja de Saint Hilaire, em Melle, na França) ao produto (foi nomeado chief designer da marca chinesa Huawei em 2015), passando por soluções urbanas (como Clover, projeto de iluminação urbana alimentado por energia solar e apresentado durante a COP21). Incansável, em 2024 ele completa seus 50 anos, sem perder o brilho dos olhos de uma criança e a vontade de injetar um pouco de magia no mundo.

*Matéria publicada na Casa Vogue de fevereiro. Garanta o seu aqui.

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