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17/07/2011 - 09h11

Datafolha desvenda o mist�rio das multid�es paulistanas

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GIBA BERGAMIM JR.
DE S�O PAULO

"Somos 4 milh�es. � a maior do mundo!" Foi com esse grito que os organizadores da 15� Parada Gay comemoraram, no chuvoso domingo de 26 de junho, a sa�da do �ltimo trio el�trico da rua da Consola��o, no centro, ao final do evento. Na quinta-feira anterior, tinha sido a vez de os evang�licos festejarem sob sol forte na Marcha para Jesus, na p�a. Campo de Bagatelle (zona norte). O saldo, segundo a organiza��o, foi de 5 milh�es de pessoas.

Entenda como s�o feitos os c�lculos de multid�es

� certo que os dois eventos reuniram centenas de milhares de participantes. Ambos est�o na lista das maiores aglomera��es que a cidade recebe anualmente, ao lado do R�veillon, tamb�m na Paulista. Por�m, as leis da f�sica e da matem�tica colocam os n�meros divulgados sob suspeita mesmo para quem n�o entende nada de f�sica ou de matem�tica.

Para p�r fim � imprecis�o e a esse antigo debate paulistano, o Datafolha calculou a quantidade m�xima de pessoas que os tr�s principais espa�os a sediar eventos do tipo --avenida Paulista, pra�a Campo de Bagatelle e vale do Anhangaba�-- t�m condi��o de abrigar. Mesmo com estimativas bastante generosas, � poss�vel afirmar: n�o cabe tudo isso de gente.

Marlene Bergamo - 26.jun.11/Folhapress
Foto a�rea mostra o desfile da �ltima Parada Gay
Foto a�rea mostra o desfile da �ltima Parada Gay, na avenida Paulista, na altura do MASP

Segundo o instituto de pesquisa, 1,5 milh�o de pessoas � a lota��o m�xima do trecho Paulista-Consola��o, caminho que a Parada Gay percorre. Isso num c�lculo superestimado, considerando sete pessoas por metro quadrado, sufoco semelhante ao enfrentado por passageiros que embarcam na esta��o S� do metr� no hor�rio de pico. Para que 4 milh�es ocupassem esses 216 mil m�, seria necess�rio que 18 pessoas se espremessem em cada metro quadrado, algo s� poss�vel para contorcionistas como os da escola Acrobacia e Arte, convidados para ilustrar a capa desta edi��o.

J� os 5 milh�es da Marcha para Jesus s� seriam alcan�ados se 30 pessoas ocupassem cada metro quadrado do entorno da p�a. Campo de Bagatelle e da avenida Santos Dumont, em Santana, cuja �rea total chega a 164 mil m�. De acordo com o Datafolha, no m�ximo 1,15 milh�o de pessoas podem ser reunidas ali.

Os organizadores argumentam que os eventos s�o itinerantes, duram mais de cinco horas e, por isso, recebem novos adeptos ao longo do dia. Mas, para especialistas, mesmo uma conta que contemple esse fluxo n�o resulta nos inflados milh�es.

Se todos os espa�os fossem preenchidos tanto na Paulista como na Consola��o ao mesmo tempo, de cal�ada a cal�ada, 1,5 milh�o de pessoas estariam grudadas umas �s outras e praticamente im�veis durante a Parada Gay, segundo o Datafolha.

"Esses eventos mobilizam milhares de pessoas em temas de grande apelo pol�tico, econ�mico e ideol�gico. � claro que existe interesse de quem divulga em inflar os n�meros", explica Alessandro Janoni, diretor de pesquisa do instituto. "Com essa medi��o, � prov�vel que, nos pr�ximos eventos, eles, sabendo que existe um limite, pensem duas vezes antes de divulgar."

Confira v�deo com os bastidores e coment�rios sobre a reportagem:

V�deo

O Datafolha usou como refer�ncia o manual de c�lculo de multid�es feito pelo Centro de Estudos e Pesquisas de Desastres (CEPD), da Prefeitura do Rio. Para chegar � lota��o m�xima desses espa�os paulistanos, o instituto fez intencionalmente um c�lculo superestimado. A �rea medida incluiu bancas de jornais, �rvores, canteiros e outros espa�os que n�o s�o ocupados. E tamb�m considerou que sete pessoas cabem em um metro quadrado, uma situa��o de confinamento que n�o acontece em eventos ao ar livre.

"Sete pessoas por metro quadrado s�o poss�veis em �reas fechadas, como em um �nibus, onde os passageiros se empurram. Em �reas abertas, a aglomera��o jamais passa de cinco por m�", explica o engenheiro Bruno Engert Rizzo, autor do manual do CEPD. Se essa regra fosse aplicada, o p�blico nos eventos analisados pelo Datafolha seria ainda menor.

A reportagem da s�opaulo constatou que, durante as sete horas da Parada Gay, era poss�vel caminhar tranquilamente nos dois sentidos da Paulista e da Consola��o, o que reduziria a propor��o a duas pessoas por metro quadrado em determinados pontos. "Quando o evento � aberto, h� o que n�s chamamos de ilhas de descompress�o. As pessoas inevitavelmente se espalham", afirma Rizzo.

MAIOR DO MUNDO

O mist�rio das multid�es paulistanas se agravou depois de 2007, quando a Pol�cia Militar deixou de divulgar suas estimativas para a Parada Gay. A corpora��o explica que o importante n�o � mostrar os dados, mas us�-los para calcular o efetivo de policiais necess�rios para os eventos futuros. Mas continua fazendo as suas contas.

Procurada pela reportagem, a PM revelou que, �s 16h30, a Parada Gay tinha 1,1 milh�o de participantes contados do Masp, ponto de in�cio do desfile, at� a rua da Consola��o, na altura da pra�a Roosevelt.

Marlene Bergamo - 26.jun.11/Folhapress
Foto a�rea mostra o desfile da �ltima Parada Gay, na avenida Paulista, na altura do MASP
Foto a�rea mostra o desfile da �ltima Parada Gay, na avenida Paulista, na altura do MASP

O hor�rio �, segundo o capit�o Emerson Massera, o auge do evento. A PM tem um sistema que elabora os c�lculos com base em imagens registradas por helic�ptero e na avalia��o de policiais. A conta � parecida com a do Datafolha, mas a aglomera��o usada pela PM � a de seis pessoas por metro quadrado. "Na maior parte do evento, n�o se chegou a essa concentra��o", disse Massera, que cuidou do setor de estat�sticas da PM por 12 anos.

Ser a maior Parada Gay do mundo sempre foi a meta dos organizadores. Em 2003, a vers�o paulistana era considerada a terceira colocada, atr�s de S�o Francisco (EUA) e Toronto (Canad�), ambas com perto de 1 milh�o. No ano seguinte, com estimado 1,5 milh�o, o topo foi comemorado. Sete anos depois, a conta quase triplicou.

As estimativas de p�blico infladas tamb�m s�o comuns em outros eventos na Paulista, como o R�veillon. Os organizadores da �ltima edi��o apostaram em 2,5 milh�es de pessoas. Mas a �rea de 135,5 mil m� da avenida suportaria 950 mil em sua aglomera��o m�xima, diz o Datafolha.

FLUXO HUMANO

Levando em conta o m�todo usado pelo Datafolha, surge a pergunta: "Mas e a movimenta��o das pessoas que entram e saem?". Segundo os especialistas, o argumento de que o p�blico � maior por se renovar ao longo de eventos de longa dura��o n�o se sustenta. De acordo com Rizzo, pesquisas de fluxo de pessoas por hora feitas no Rio mostram que o incremento m�ximo causado pela renova��o de p�blico seria de apenas 20%.

Ainda sobre deslocamento, nas contas do engenheiro Hor�cio Augusto Figueira, especialista em tr�nsito, seriam necess�rias cerca de 26 horas para que 4 milh�es passassem pela av. Paulista numa velocidade de caminhada lenta, a 1,8 km/h. No ritmo animado da Parada Gay, onde as pessoas fazem pausas para dan�ar junto com os trios el�tricos, em sete horas passariam cerca de 1 milh�o de pessoas --estimativa sem base cient�fica, cujo resultado coincide com os n�meros do Datafolha e da PM.

Almeida Rocha - 4.jun.10/Folhapress
Participantes da Marcha Para Jesus do ano passado na av. Tiradente e na pra�a Campos de Baguatelle
Participantes da Marcha Para Jesus do ano passado na av. Tiradente e na pra�a Campos de Baguatelle

As diverg�ncias sobre o total de p�blico de um evento n�o s�o exclusividade da Paulista, endere�o mais famoso da cidade. Em Santana, na zona norte, a pra�a Campo de Bagatelle se tornou nas �ltimas duas d�cadas o palco predileto das festas de sindicalistas e evang�licos.

A Marcha para Jesus acontece simultaneamente em v�rios pa�ses. Em S�o Paulo, teve sua 19� edi��o neste ano. Em 1994, quando ainda se chamava Marcha pela Paz e acontecia na av. Paulista, reuniu cerca de 500 mil pessoas, sempre segundo os organizadores. Para a PM, foram 20 mil.

Desde 2008 na Campo de Bagatelle, a festa religiosa dura cerca de nove horas. Ao fim da caminhada, que se inicia �s 10h, shows com bandas de m�sica gospel atraem o p�blico jovem. Antes dos religiosos, eram os trabalhadores que celebravam por ali. O 1o de Maio era comemorado com shows e at� sorteio de apartamentos.

PALCO HIST�RICO

A pol�mica em torno da quantidade de gente que uma manifesta��o re�ne � antiga em S�o Paulo. Em 16 de abril de 1984, um protesto do movimento Diretas-J�, que reuniu lideran�as da pol�tica, das artes e do futebol lotou o vale do Anhangaba�, mas n�o tanto quanto divulgaram seus organizadores.

Na �poca, foi dito que 1 milh�o de participantes estiveram no evento para ouvir discursos de Ulisses Guimar�es, Lula e Franco Montoro. C�lculo posterior do Datafolha mostrou que "apenas" 400 mil tinham participado.

Daniel Marenco - 31.ago.10/Folhapress
Milhares de torcedores comparecem � festa do centenario do Corinthians, no vale do Anhangaba�, em agosto de 2010
Torcedores comparecem � festa do centenario do Corinthians, no vale do Anhangaba�, em agosto de 2010

Outro momento marcante da pol�tica nacional tamb�m teve o Anhangaba� como cen�rio. Em 18 de setembro de 1992, defensores do impeachment do ent�o presidente Fernando Collor anunciaram que havia 1 milh�o de manifestantes ali. A PM calculou na ocasi�o 650 mil pessoas. O Datafolha contou algo em torno de 70 mil.

Hoje o lugar � endere�o certo de shows musicais e de tel�es que transmitem jogos da sele��o brasileira durante as Copas do Mundo. No ano passado, a comemora��o do centen�rio do Corinthians levou, segundo a PM, 110 mil torcedores ao local.

Agora sabe-se que, de acordo com o Datafolha, um evento no Anhangaba� pode receber quase 380 mil pessoas no m�ximo. Um tira-teima que, a exemplo dos exibidos na TV durante os jogos de futebol, veio para p�r fim �s pol�micas que rondam as multid�es paulistanas.

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MULDID�ES HIST�RICAS
As estimativas que foram refeitas pelo Datafolha

Diretas-J� - abril de 1984
Local: vale do Anhangaba�
P�blico estimado por organizadores: 1 milh�o
C�lculo do Datafolha: 400 mil

Matuiti Mayezo - 16.abr.84/Folhapress
Com�cio pelas Diretas J� no Vale do Anhangaba�, em abril de 1984
Com�cio pelas Diretas J� no Vale do Anhangaba�, em abril de 1984

Caras pintadas - setembro de 1992
Local: vale do Anhangaba�
P�blico estimado pelos organizadores: 1 milh�o
C�lculo do Datafolha: 70 mil

Jorge Ara�jo - 18.set.92/Folhapress
Manifesta��o pelo impeachment do presidente Fernando Collor de Mello, no vale do Anhangaba�
Manifesta��o pelo impeachment do presidente Fernando Collor de Mello, no vale do Anhangaba�

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OUTRO LADO

A organiza��o da Parada Gay afirma que est� fazendo um estudo de p�blico sobre o evento de junho, mas que ele ainda n�o foi conclu�do. Os n�meros levam em conta a rotatividade e a quantidade de pessoas nas imedia��es da av. Paulista, segundo os organizadores.

"Nos inspiramos nos c�lculos feitos pelo 'Guinness', com a estimativa de p�blico em diferentes momentos da Parada", explica Leandro Rodrigues, assessor do evento.

A Igreja Renascer, que organiza a Marcha para Jesus, usa crit�rios semelhantes, mas admite que n�o disp�e de base cient�fica. A exemplo da Parada Gay, afirma que o p�blico � grande por causa da alta movimenta��o de gente em suas nove horas de dura��o. A igreja diz que ruas pr�ximas ao palco da p�a. Campo de Bagatelle tamb�m s�o ocupadas.

 

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