É alarmante a situação humanitária na fronteira do Brasil com a Venezuela, em Pacaraima (RR). Em relação a maio, mês que antecede a reabertura da fronteira entre os dois países, cresceu em 243%, para 4.015, o número de venezuelanos desabrigados na cidade.
O número, apurado pela Organização Internacional para as Migrações, é brutal para um município de 18 mil moradores. A maior parte dos migrantes e refugiados vivem em situação de rua; outros ocupam espaços públicos ou área privadas cedidas. Os dois abrigos da Operação Acolhida, comandada pelo Exército, estão superlotados.
Com equipe insuficiente, a operação —elogiada pelo presidente Jair Bolsonaro, que anunciou a intenção de visitar a região nas próximas semanas— requer reforço imediato em estrutura e locais de abrigo para prestar assistência humanitária adequada.
Não é de hoje que a situação na fronteira entre Brasil e Venezuela preocupa. Sob o regime do ditador Nicolás Maduro, o país vizinho vive uma tragédia social que combina pandemia, pobreza e desnutrição. A explosão do número de desabrigados em Pacaraima decorre, principalmente, de uma demanda reprimida em pouco mais de um ano de portas fechadas.
Entre março de 2020 e junho deste ano, o governo brasileiro barrou a entrada, por via terrestre, de migrantes e solicitantes de refúgio sob qualquer hipótese, alegando cumprir uma determinação da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) —o que foi desmentido em fevereiro pelo órgão.
Mesmo com a fronteira brasileira hoje reaberta, o governo federal ainda prevê, por força de portaria editada em junho, penas para quem viola regras migratórias, entre elas a deportação imediata, o que foi contestado na Justiça, e inabilitação de pedido de refúgio, em descumprimento de tratados internacionais sobre o tema.
Essa política federal soma-se à precariedade dos serviços municipais e estaduais a agravar o quadro humanitário no local.
A situação de comoção social em Pacaraima revela que investimento em acolhida ordeira e robusta deveria ter prevalência em relação a medidas restritivas que, além de desumanas, não dão conta da realidade fronteiriça entre Brasil e Venezuela, tradicionalmente porosa.
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