• Alice Coy
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Vestidos da Tribute Brand, grife croata que cria looks virtuais (Foto: Divulgação)

Vestidos da Tribute Brand, grife croata que cria looks virtuais (Foto: Divulgação)

Gastar US$ 300 para comprar um vestido que existe apenas digitalmente pode parecer uma loucura para alguns, mas, acredite, já é uma prática bastante comum, especialmente entre a geração Z, que compreende pessoas nascidas entre 1997 e 2012. De olho nas possibilidades desse mercado, a indústria da moda não demorou a se envolver: a Gucci desenvolveu um tênis digital para ser usado na plataforma de games Roblox; Louis Vuitton, Marc Jacobs e Balenciaga criaram coleções de roupas para avatares (para os jogos League of Legends, Animal Crossing e Fortnite, respectivamente); e Balmain e Dolce & Gabbana disponibilizaram NFTs (Tokens Não Fungíveis, um arquivo digital único, que não pode ser substituído).

Marcas que se especializam apenas nesse segmento também surgiram, caso da croata Tribute Brand, fundada em abril de 2020, que só este ano assinou colaborações com a Jean Paul Gaultier (durante a temporada de alta-costura inverno 2021) e com a Carolina Herrera (para o verão 2022). Comandada pelo quarteto Gala Marija Vrbanic, Marina Juric, Filip Vajda e Igor Lipovac, que misturam suas experiências prévias em moda, modelagem 3D, UX design e codificação para propor novas maneiras de consumir.

Vestidos da Tribute Brand, grife croata que cria looks virtuais (Foto: Divulgação)

Vestidos da Tribute Brand, grife croata que cria looks virtuais (Foto: Divulgação)

Com o universo dos games como grande inspiração, a marca desenvolve peças em quantidade limitada com proporções e modelagens fantasiosas. São saias que parecem balões de ar quente, vestidos de metal líquido, acabamentos holográficos e detalhes de neon. Itens que jamais poderiam existir no mundo físico, em parte devido à lei da gravidade. “Para mim, não faz sentido criar uma versão digital de uma camiseta de algodão. Você pode ter uma camiseta física e ela com certeza será muito melhor. Não acho que o virtual está aqui para imitar o material”, diz Gala, de Zagreb, via videoconferência. Roupas físicas precisam ser funcionais, o que aos seus olhos limita o processo criativo. Uma manga, por exemplo, serve para proteger o braço, uma necessidade que não existe na vida cibernética.

De acordo com ela, mesmo como pouco tempo de existência de label, a aceitação das pessoas já mudou completamente. “Quando começamos, perguntavam porque alguém pagaria por algo que não existe, mas atualmente ninguém questiona mais”, completa.

Vestidos da Tribute Brand, grife croata que cria looks virtuais (Foto: Divulgação)

Vestidos da Tribute Brand, grife croata que cria looks virtuais (Foto: Divulgação)

Hoje, a maioria dos looks da marca é feita para ser compartilhada nas redes sociais – a peça é aplicada (pela equipe da Tribute) em uma foto do consumidor após a compra. Mas com a collab com a Carolina Herrera, desenvolveram um aplicativo que usa realidade aumentada (RA) e que, portanto, permite “vestir” o look com ajuda de um smartphone (funciona de maneira similar a um filtro de rede social). Gala acredita que o advento dos óculos de RA, que permitem que pessoas vejam itens digitais sobrepostos ao mundo físico, trará uma maior difusão da moda virtual. De acordo com a sua previsão, as roupas físicas serão mais funcionais, itens bem cortados de matérias-primas duradouras, enquanto criações mirabolantes e fashionistas ficarão mais restritas ao âmbito digital. “Existe a questão da sustentabilidade, e eu acredito que a moda digital é a alternativa mais razoável para se consumir sem gerar lixo. É muito difícil as pessoas comprarem menos em um mundo onde somos tão estimulados e tudo muda tão rápido”, ela diz.

O METAVERSO
Se você não é um nativo digital, essa ideia pode parecer abstrata, mas de acordo com dados da Foresight Factory encomendados pelo Snapchat, um em cada três consumidores da geração Z irá comprar com RA até 2025. Em menos de cinco anos, haverá um aumento de 57% no volume de compras em que uma das etapas será em RA. Essa maior convergência dos mundos físico e digital, onde a tecnologia está cada vez mais presente ao nosso redor e não limitada às telas retangulares, é chamada por alguns de metaverso.

De acordo com Fred Paiva, head de negócios da empresa de tecnologia Suno Creatives, “integrantes dessa geração conhecem os amigos e socializam pelo servidor do jogo. Eles mostram suas riquezas e conquistas ali, por isso não adianta ter um armário cheio de roupas incríveis que não aparecem no computador”. Pagar por itens virtuais é um fenômeno que acontece nos games desde meados de 2000. Aqui no Brasil, um dos precursores da moda cyber é o carioca Lucas Leão, que começou a explorar essa vertente em 2019. “Ainda somos um pouco engessados em termos de varejo, muitos dos artistas 3D que trabalham com a gente tiveram que se mudar para fora para exercer sua profissão”, diz. Mas também garante que barreiras estão sendo quebradas e que a primeira leva de peças virtuais que desenvolveu para o e-commerce Shop2gether, no início deste ano, se esgotou rapidamente. “Espero puxar o caminho de fazer menos peças, mas criar mais. É o futuro no qual acredito”.

Ao infinito e além (Foto: Divulgação)

Ao infinito e além (Foto: Divulgação)

ALGORITMOS E CRIAÇÃO
A inteligência artificial já vem sendo utilizada por algumas marcas como um auxílio ao processo criativo. O grupo carioca Soma, por exemplo, a combina com análise de dados e o input de suas vendedoras para definir quais peças têm chances de performar melhor e, sendo assim, são produzidas em maior quantidade. Já a Away To Mars (grife com sede em Londres comandada pelos brasileiros Alfredo Orobio e Marilia Biasi) lançou em setembro, com a ajuda de um financiamento de uma célula de inovação do governo britânico, um software capaz de “aprender” a estética de uma marca, de um estilista ou de um movimento artístico (o cubismo, por exemplo), e então criar peças sem a intervenção humana. Depois disso, é possível fazer um processo de cocriação entre um cliente e a Away To Mars, que resulta em um produto hiperpersonalizado e único. Para tal, colocaram seis algoritmos em sequência. Já no ar através do e-commerce da grife, onde depois de criar o produto desejado o consumidor escolhe se quer comprar o NFT ou a versão física, o software também será disponibilizado para outras marcas em breve.