• Daria Slobodjanik
Atualizado em
Olena Zelenska (Foto: Reprodução / Instagram)

Olena Zelenska (Foto: Reprodução / Instagram)

"Sou uma pessoa não pública. Mas a nova realidade exige suas próprias regras, e estou tentando cumpri-las", afirmou Olena Zelenska antes da invasão russa à Ucrânia. “Não posso dizer que a publicidade ou a relação com a imprensa seja estressante para mim. Mas prefiro ficar nos bastidores. Meu marido está sempre sob os holofotes, enquanto eu me sinto mais confortável na sombra. Não sou o destaque das festas, não gosto de contar piadas. Não é da minha personalidade. Mas descobri os benefícios da publicidade. Um deles é a oportunidade de chamar a atenção das pessoas para questões sociais importantes. Mas há limites para a exposição: eu não postei fotos dos meus filhos nas redes sociais antes da eleição e, agora, também não irei".


Nos encontramos com a primeira-dama Olena Zelenska antes da entrevista apenas uma vez, no set. O shooting durou sete horas, e Olena reservou o sábado para isso - seu dia de folga. Começamos exatamente às 10h no Gabinete do Presidente e terminamos exatamente às 17h. “Deixamos de fora as tendências de moda e estilo – queríamos fazer um retrato incondicional, sincero e quase documental”, contou a stylist Julie Pelipas. "Um retrato genuíno é sempre o gênero mais difícil quando se trata de fotografar políticos ou figuras públicas. Mas acho que conseguimos, graças à disponibilidade de Olena”. Depois desse encontro, fiz as primeiras anotações sobre a primeira-dama: pontual, sorridente, inglês excelente (temos uma equipe de fotografia internacional).

Olena Zelenska na capa da Vogue Ucrânia (Foto: Reprodução / Instagram)

Olena Zelenska na capa da Vogue Ucrânia (Foto: Reprodução / Instagram)


Nossa entrevista aconteceu em uma segunda-feira de manhã no escritório da produtora Studio Quarter 95. O fórum de investimento Mariupol começou no dia da reunião, e as principais autoridades do país seguiram para lá, fazendo com que várias reuniões planejadas por Olena e sua equipe fossem canceladas. Com uma vaga em sua agenda, Olena veio ao estúdio para trabalhar nos roteiros, como vem fazendo nos últimos 15 anos. "Eu escrevo os roteiros da mesma forma como fazia antes", disse a primeira-dama. "No entanto, agora preciso dividir o dia entre o Gabinete do Presidente e a produtora, sem perder os prazos”. Não há gabinete para primeira-dama na Ucrânia (ao contrário, por exemplo, do que acontece nos Estados Unidos ou na França), portanto, esse status é basicamente representativo, a mulher do presidente não é paga, portanto, pode ter dois empregos.

Nos primeiros seis meses em seu novo cargo, Olena conheceu as áreas em que as primeiras-damas de todo o mundo desenvolvem seus programas. "Entre as mulheres dos presidentes não há personalidades desinteressantes - com cada uma delas há algo a aprender. Por exemplo, Brigitte Macron é educadora. Seu programa é baseado em temas relacionados à educação - ela desenvolve programas de estudos para adultos que, por diferentes motivos, abandonaram a escola. Durante um encontro nosso, Brigitte mencionou que ela mesma estava ensinando o idioma e a literatura francesa aos alunos. Sarah Netanyahu, mulher do primeiro-ministro de Israel, é uma psicóloga infantil. Elke Büdenbender, primeira-dama da Alemanha, é uma advogada de sucesso”.


Olena Zelenska é uma ótima comunicadora. Percebe-se que trabalha com textos: seu discurso é lógico e estruturado, não há palavras desnecessárias. Ela respondeu nossas perguntas com detalhes - sobre o marido, filhos, sua atitude em relação às críticas nas redes sociais – escolhendo cuidadosamente as palavras. A uma das questões-chave para nós - como ela reagiu à decisão de Volodymyr Zelensky de concorrer à presidência – ela respondeu com franqueza. "Não fiquei muito feliz quando soube que este era o plano. Vi como tudo mudaria e que teríamos dificuldades a enfrentar”. Olena soube em 1º de janeiro pelas redes sociais que seu marido havia apresentado sua candidatura à presidência: Volodymyr Zelensky anunciou a decisão em um programa de TV, e no primeiro dia do ano foi a todos os veículos de comunicação. "Quando perguntei: ‘Por que você não me contou?’, Zelensky respondeu: ‘Esqueci’. Meu marido sabe surpreender", acrescenta Olena. “Mas, falando sério, nós conversamos sobre isso há bastante tempo e eu disse que sempre o apoiaria”.

À pergunta sobre como sua vida mudou após a posse, Olena respondeu: "A vida não mudou, mas as circunstâncias, sim. Não tenho tempo para ficar sozinha. Tenho dois filhos, então, raramente ficava sozinha antes. O único espaço privado que tinha era no carro, enquanto dirigia. E, agora, eles me privaram disso também - estou sempre com seguranças. Agora, o banheiro se tornou meu único refúgio (risos). Mas tenho sorte de ter as pessoas que estão em meu espaço pessoal: elas mantêm silêncio quando eu preciso e podem manter uma conversa quando sentem que é necessário”.

Olena Zelenska e o presidente uraniano  (Foto: Reprodução / Instagram)

Olena Zelenska e o presidente uraniano (Foto: Reprodução / Instagram)


Os Zelensky tentavam (antes da guerra) manter o estilo de vida ao qual estavam acostumados e protegiam as crianças da exposição. "Deixe que eles escolham como querem viver. Minha filha mais velha, Sasha, já atuou em filmes - mas espero que ela não vá mais adiante nessa área. O mais novo, Cyril, ainda tem chance de ter uma infância normal - brincar com outras crianças, praticar esportes, frequentar escola de música sem atrair atenção desnecessária."

Olena reagiu ao novo status pragmaticamente, embora no início houvesse dúvidas. O serviço social é uma escolha pessoal da primeira-dama; não existem obrigações oficiais sobre esta questão. "Eu poderia continuar vivendo minha vida, me mantendo longe de problemas e ataques de desinformação, mas decidi apoiar meu marido: a nível emocional, não é tão fácil,  ele precisa de alguém que esteja por perto. E, fisicamente, também: por exemplo, ficar de mãos dadas durante as visitas oficiais, posar para fotógrafos do mundo todo - sem estragar a foto (risos)”.

Olena não está brincando. Nos encontramos com ela logo após o retorno de uma viagem oficial ao Japão, onde participou da cerimônia de entronização do Imperador Naruhito. O vestido amarelo da marca ucraniana FROLOV que Olena usou foi alvo de uma ampla discussão na internet: a cor amarela é supostamente proibida no Japão. A polêmica foi logo desfeita após a página oficial da Embaixada do Japão na Ucrânia informar que  “o traje da primeira-dama enfatizava o respeito dos ucranianos pela cultura do Japão”. Olena disse que, durante a viagem, ficou satisfeita com seu look e com a resposta dos japoneses - até ler a cobertura na mídia ucraniana.

Olena Zelenska (Foto: Reprodução / Instagram)

Olena Zelenska (Foto: Reprodução / Instagram)


É basicamente impossível errar o dress code antes de qualquer viagem diplomática. O Ministério das Relações Exteriores da Ucrânia é responsável por enviar uma nota protocolar à Presidência da República informando todas as nuances da visita. O estilista Ivan Frolov disse que foi contratado para criar dois vestidos para a primeira-dama um mês antes da viagem. "Nossa equipe se preparou bem: estudamos o protocolo cerimonial japonês. A regra principal era que a cor deveria ser apropriada para a estação, então, optamos por uma roupa amarela pastel para a cerimônia diurna e azul pastel para o jantar”. Frolov fez cinco esboços para cada vestido, e, então, Olena fez sua escolha.


A primeira-dama vê suas aparições públicas como uma oportunidade de falar sobre seu país e mostrar roupas feitas por designers ucranianos. Durante uma de suas primeiras viagens diplomáticas a Bruxelas, Olena vestiu um terninho bege da marca SIX. Já em uma reunião com Brigitte Macron, vestiu um terno da ELENAREVA, e, também, apareceu com as marcas Vita Kin e Lake Studio. "Fico feliz quando me perguntam em Nova York ou Paris quem é o estilista que fez a minha roupa. Como é bom promover estilistas ucranianos para o mundo”.

Levou seis meses para que Olena e sua equipe decidissem sobre as tarefas prioritárias em seu cargo de primeira-dama. Ela afirmou que desenvolveu o programa subjetivamente. "Eu cresci em Kryvyi Rih, vivi neste país toda a minha vida e entendo quantos problemas temos. Mas se eu for abranger todos eles, não vai funcionar, então, nossa equipe decidiu concentrar-se em tarefas específicas: saúde das crianças, igualdade de oportunidades para todos os ucranianos e diplomacia cultural." Uma das tarefas era reformar a nutrição escolar. "Quanto mais cedo as crianças forem educadas para comer de forma saudável, mais fácil será explicar mais tarde que brócolis é melhor do que salsicha", disse ela. “Nas escolas, se as crianças não gostarem da merenda, vão a um quiosque próximo comprar o que quiserem, sem pensar nos benefícios ou malefícios. Portanto, não é surpreendente que os problemas de saúde mais comuns entre as crianças sejam as doenças do trato gastrointestinal”, explicou.

Olena Zelenska e o presidente uraniano (Foto: Reprodução / Instagram)

Olena Zelenska e o presidente uraniano (Foto: Reprodução / Instagram)


Olena muitas vezes acompanhou o marido em suas viagens ao exterior e tentou aprimorar o programa de visitas com o que podia ser útil para seu trabalho na condição de primeira-dama: por exemplo, visitou centros médicos japoneses e canadenses que trabalham com questões de inclusão e saúde infantil. Ela aprendeu como a nutrição infantil e as atividades esportivas são organizadas nas escolas da Letônia e do Japão. "No Japão, por exemplo, há um nutricionista em cada escola, que dá atenção especial à nutrição de crianças com alergias, e as cozinhas das escolas são completamente separadas e estéreis, como uma sala de operações. Peguei várias ideias e me convenci de que fazer mudanças positivas é possível, você só precisa desejar sinceramente e trabalhar duro."


Especialistas ajudavam a primeira-dama a analisar os principais problemas sociais e a criar uma estratégia para resolvê-los. A apresentadora de TV Masha Efrosinina, embaixadora do Fundo das Nações Unidas para a População na Ucrânia, tornou-se um guia para o difícil tema do combate à violência doméstica. "Todos os anos, um milhão de mulheres ucranianas sofrem violência doméstica e seus filhos sofrem junto com elas", disse Masha. “Existe uma linha direta para vítimas de violência doméstica na Ucrânia, mas há apenas dois consultores trabalhando – e não em escala nacional. Quando eu disse à Olena que ninguém realmente sabe o número de telefone desta linha, ela respondeu: ‘Você quer que eu escreva em um crachá e use?’ Nós duas entendemos que para alcançar um resultado tangível a hotline deve funcionar em nível nacional. Assim, em 2020, com a ajuda da primeira-dama, o Ministério da Política Social lançou o Centro Nacional de Atendimento, que responde rapidamente aos apelos das mulheres, trabalhando em cooperação com a polícia, serviços sociais e psicólogos."

O programa da primeira-dama também previu apoio aos Jogos Paralímpicos e o desenvolvimento de infraestrutura inclusiva nas cidades da Ucrânia. "Podemos fazer muita diferença - em primeiro lugar, na atitude da sociedade em relação às pessoas com deficiência", afirmou Olena. Sua equipe colaborava com Valery Sushkevich, fundadora do movimento paralímpico na Ucrânia, nomeada pelo presidente para os direitos das pessoas com deficiência. Em 2020, Olena Zelenska planejou apoiar a Seleção Nacional da Ucrânia nos Jogos Paralímpicos de Verão em Tóquio. "Olena pôde se tornar uma promotora de igualdade de direitos e oportunidades. A primeira-dama se juntou à seleção nacional nos Jogos Paralímpicos, isso foi um grande sinal tanto para a sociedade, quanto para líderes de outros países ", argumentou Valery. “Foi muito importante para mim ela não ter ignorado este assunto. Fiquei feliz porque Olena entendeu a conexão entre o sucesso internacional dos ucranianos nos Jogos Paralímpicos e as atitudes da sociedade. As vitórias paralímpicas deram aos ucranianos uma certa motivação e autoconfiança." Além disso, a atenção da primeira-dama, sugeriu Valery, proporcionou oportunidade para uma integração mais rápida dos representantes do governo com este tema.

Texto: Daria Slobodjanik
Foto: Paul Bellaart
Styling
: Julie Pelipas
Hairstylist: Line Bille @A Management
Maquiagem: Stine Rasmussen @A Management
Produtora: Marina Sandugey-Shyshkina
Assistentes de fotografia: Thijs Bosma e Florence Schreinemachers
Assistente de styling: Mari Siviakova, Sveta Manoukyan
Assistente de produção : Ediye Derbysheva
Agradecimentos: Broncolor Ucrânia (photorental.com.ua); Indposhiv Bespoke House (indposhiv.ua)