• Guilherme de Beauharnais
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Alexander McQueen em 1999. (Foto: Getty Images)

Alexander McQueen em 1999. (Foto: Getty Images)

Alexander McQueen não é apenas um dos nomes mais significativos na moda das últimas décadas. O estilista se tornou sinônimo de designs e conceitos revolucionários, além de ressignificar a ideia de desfiles espetaculares, que eram como "estar no mar, sendo jogado pelas ondas", segundo o fotógrafo de moda Robert Fairer.

Inglês e com treinamento em alfaiataria, “Lee” começou seu reinado nos anos 1990, “um período em que a criatividade pura e crua era a real moeda e a originalidade liderava o curso da moda”, como lembra a designer Sarah Harmarnee, uma de suas colaboradoras.

Em menos de duas décadas, o estilista deixou um legado de “narrativas intensamente temáticas”, nas palavras do arquivista John Matheson, do perfil @mcqueen_vault. Ainda assim, sua trajetória na moda acabou precocemente, quando ele tirou a própria vida em 2010, aos 40 anos.

Doze anos desde a sua morte, seu estilo irreverente e provocante faz cada vez mais sentido no universo fashion e continua a inspirar novas gerações de designers. Para relembrar o impacto de Alexander McQueen, colegas e especialistas do estilista dividiram com a Vogue Brasil suas lembranças e impressões.

Sarah Harmarnee, designer
“Eu conheci e comecei a trabalhar com Lee na metade dos anos 1990, quando ele foi nomeado  diretor-criativo na Givenchy. Dali até o final da década, foi a Era Dourada de alguns dos desfiles mais mágicos e incrivelmente inspiradores da história. Na época, não era incomum ver verdadeiros fashionistas influentes serem levados às lágrimas pelo poder e magnificência absolutos de certos shows. Era um período em que a criatividade pura e crua era a real moeda e a originalidade liderava o curso da moda.

Lee incorporava perfeitamente esse período na minha opinião. Havia tantos momentos memoráveis, mas hoje posso dizer que uma de suas características mais marcantes era a sua generosidade criativa. Não apenas sua habilidade certeira de saber exatamente qual time precisava ao seu lado, mas a confiança e respeito que ele depositava em seus colaboradores e nas suas práticas e processos. Desde então, eu nunca mais experenciei nada parecido. Lee nos mostrou magia da verdadeira criatividade, que não pode existir sem generosidade pura. Um ato de fé e conexão... um jeito de ser da alma.”

Peças de metal feitas por Sarah Harmarnee para a coelção de outono 1996 de Alexander McQueen. (Foto: Condé Nast Archive.)

Peças de metal criadas por Sarah Harmarnee para o desfile de outono 1996 de Alexander McQueen. (Foto: Condé Nast Archive.)

Robert Fairer, fotógrafo
“Uma das coisas incríveis sobre os desfiles de McQueen é que não havia nenhum tipo de frivolidade nos bastidores. Havia uma verdadeira criatividade acontecendo. Em outros casos, antes das apresentações, muitos designers apenas sentavam e ficavam olhando enquanto os stylists e a equipe trabalhavam. Não o Lee.

Durante os desfiles, havia uma ousadia que eu nunca havia visto na moda. A performance teatral e criativa, o cenário, a música, tudo. Em outros shows, você poderia se perguntar: “Cadê o frisson, a energia, o poder?”, mas quando uma apresentação de McQueen começava, você era transportado para outro dimensão. A dimensão dele.

De um ponto de vista fotográfico, era uma cornucópia de sentimentos. A experiência era muito intensa. Era como estar no mar, sendo jogado pelas ondas. Eu nunca sabia o que esperar das coleções de McQueen. Para mim, sempre foi uma completa surpresa. Dois desfiles nunca eram iguais. Cada um era uma experiência sensorial, tridimensional, diferente.”

Alexander McQueen ao fim do desfile de inverno 2004 (Foto: Getty Images)

Alexander McQueen ao fim do desfile de inverno 2004 (Foto: Getty Images)

John Matheson, arquivista
"Refletindo sobre o impacto de McQueen, cada ano que passa me coloca ainda mais em contato com as maravilhas de seus mundos. Escuto histórias a cada ano, descubro mais exemplos de sua genialidade e vejo seu reflexo e influência em criadores contemporâneos. Um tema sempre prevalece: respeito. Não é apenas seu talento e visão que não podem ser substituídos, mas o filtro que ele criou para a cultura e que resultou nas suas criações. Ele me fez ir atrás de atlas e enciclopédias para entender referências e detalhes.

Nos últimos tempos, estou mergulhando na coleção 'Pantheon Ad Lucem', de 2004, que é muitas vezes ignorada ou subestimada. (Eu sempre gosto das esquecidas). Ele estava completamente sozinho nessa temporada e os vestidos não apareceram em editoriais porque ninguém soube filtrar a coleção. Foi muito presciente no recorte, que abordava temas de exploração espacial através de filmes populares de ficção-científica, nossa relação desconfortável com a solidão do espaço e o desconhecido, simbolismo antigo e sinais de vida extraterrestre. Tudo com uma forma pura, acentuada pela iluminação nos vestidos. Just bloody amazing!  [Muito incrível!] Só essa coleção já fornece muito material para investigar e descobrir".

Desfile de inverno 2004 de Alexander McQueen (Foto: Getty Images)

Desfile de inverno 2004 de Alexander McQueen (Foto: Getty Images)

De narrativas intensamente temáticas e manipulação primorosa de tesouras, é possível enxergar a influência [de McQueen] na atual geração de designers. Há tanto design vazio hoje em dia. O tempo devotado ao desenvolvimento de conceitos e explorando suas origens ajudou a criar narrativas únicas e autobiográficas nos designs dele."