Nos últimos anos, estamos presenciando um dos debates mais entusiasmados sobre a reforma da previdência, seja aqui no Brasil ou em outros países. Apesar de melhores regimes de previdência social, ainda permanecem sérias preocupações sobre os indivíduos que não poupam o suficiente para a aposentadoria via a previdência privada. No Brasil, mesmo com os incentivos econômicos oferecidos, a taxa de poupança continua relativamente baixa.
A literatura acadêmica, uma corrente de estudos nas décadas recentes, busca ajudar neste debate para incrementar a taxa de poupança, oferecendo soluções através de finanças comportamentais. Um dos mais famosos livros é “Nudge: Como tomar melhores decisões sobre saúde, dinheiro e felicidade”. Publicado pelo economista da Universidade de Chicago, Richard Thaler, e o professor de Direito de Harvard, Cass Sunstein, a obra descreve as influências diárias em nossas escolhas sobre o que comprar ou comer, sobre investimentos financeiros, a educação e saúde de nossos filhos.
Partem do ideal de que, ao invés de restringir escolhas individuais, as pessoas podem ser encorajadas a tomarem melhores decisões, através da reestruturação do processo de escolhas ou arquitetura de escolhas. O conceito geral de orientar as escolhas, é também conhecido como a “teoria do empurrão”. Anos depois, Thaler ganhou o Prêmio Nobel por seu trabalho em economia comportamental.
Segundo os autores, três princípios devem orientar o uso de nudges ou empurrões: (1) todos os empurrões devem ser transparentes e nunca enganosos; (2) deve ser o mais fácil possível cancelar (“opt-out”) o empurrão; e (3) deve haver boas razões para acreditar que o comportamento encorajado melhorará o bem-estar daqueles que estão sendo empurrados.
Thaler e Sunstein também viram uma oportunidade de contornar o problema da baixa taxa de poupança financeira através da arquitetura de escolha. Os professores argumentaram que solicitar aos trabalhadores da iniciativa privada optarem por entrar nos planos de previdência do empregador na realidade criava barreiras à contratação. Ao invés disto, os empregadores deveriam automaticamente incluir os empregados elegíveis na previdência privada. Sempre com a possibilidade do trabalhador de optar por não participar, ou seja, de seguir sem a previdência privada - “opt-out”.
Em um dos exemplos, os autores utilizam o exemplo da doação de órgãos. Defendem o princípio no qual a maioria das pessoas gostaria de ser doadora se morrer em um acidente e seus órgãos pudessem ser utilizados para salvar a vida de outras pessoas. Mas, por diversas razões, jamais chegam a se cadastrar como doadores. Atualmente, políticas de estado buscam se aproveitar destes avanços para promoverem um bem-estar maior. Vários estudos acadêmicos apontam que, em relação aos seus países vizinhos, a Áustria apresenta níveis bem mais elevados de participação da população como doadores de órgãos graças ao seu modelo de opt-out, ou seja, de já ser um doador em potencial, podendo desistir facilmente.
Em seu livro, Thaler e o colega demostra que uma estratégia de opt-out aumenta a poupança nos planos previdenciários. Outros acadêmicos também confirmaram essas descobertas.
Caso de sucesso no Reino Unido, com o opt-out vigente desde 2012, os empregadores devem inscrever automaticamente os trabalhadores com idade entre 22 e 65 anos e que possuem renda anual superior a 10 mil libras em um plano de previdência. Com isto, a porcentagem de trabalhadores em algum programa de previdência privada apresentou aumento significativo.
No Brasil, abriu-se uma nova perspectiva para avançarmos num modelo opt-out nos planos de previdência empresarial. Em fevereiro deste ano, o Conselho Nacional de Seguros Privados aprovou as Resoluções 463/24 e 464/24, que se aplicam respectivamente aos produtos de previdência privada nacionais PGBL e VGBL.
Nestas normativas, os planos coletivos estão agora autorizados a estabelecer cláusula de adesão automática, ou seja, o opt-out para a previdência privada corporativa, sempre respeitando o poder de decisão do participante. Com este avanço na regulamentação da previdência privada brasileira, se espera uma maior adesão aos planos instituídos pelas empregadoras em benefício dos seus trabalhadores.
Autor: John Liu, Diretor de investimento da Seguradora Zurich
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