Tecnologia

Por Maria Clara Vaiano, com edição de Luiza Monteiro

Imagine criar uma ferramenta que não apenas pode economizar milhões de reais do Sistema Único de Saúde, mas também auxiliar no diagnóstico e tratamento de doenças cardiovasculares? Foi o que cinco estudantes de medicina brasileiros propuseram durante o Hackathon Internacional de 2023, uma maratona de programação promovida em abril pela Universidade Harvard, nos Estados Unidos.

Com o tema “Soluções digitais para construção de sistemas de saúde de alto valor na América Latina e no Caribe", o evento teve apoio do Movimiento Salud 2030, ​da Union for International Cancer Control e do Global Innovation Hub for Improving Value in Health.

O objetivo era estimular projetos que buscassem soluções para auxiliar gestores públicos a lidarem melhor com problemas de saúde da população. A maratona recebeu mais de mil inscrições, das quais 740 pessoas de 37 países conseguiram se qualificar, formando 166 times.

O aplicativo idealizado pelos brasileiros concedeu aos jovens o maior prêmio da competição. O grupo é formado por Karen Ribeiro, da Universidade Federal do Paraná (UFPR); Laís Reis, da Faculdade das Américas (FAM); Pedro Henrique Gunha Basilio, da Faculdade Pequeno Príncipe; Marina Bassi, da Universidade Federal Fluminense (UFF); e Victória Morbach Siebel, da Universidade Feevale.

Equipe brasileira participou de hackaton de Harvard — Foto: Divulgação: Hackathon
Equipe brasileira participou de hackaton de Harvard — Foto: Divulgação: Hackathon

Todos estão no primeiro ou no segundo ano da graduação em Medicina e ninguém se conhecia. “Tinha duas formas de inscrição: em grupo ou individual. Na individual, eles faziam um match entre pessoas aleatórias, que foi o que aconteceu com a gente”, explica Marina Bassi, em entrevista a GALILEU.

Outra escolha no ato da inscrição era sobre o rumo do projeto — se seria focado em câncer, cardiologia ou se poderia ser atribuído aleatoriamente. Todos do grupo brasileiro escolheram o modo aleatório e só souberam do tema dez dias antes do evento, que aconteceu nos dias 20 e 21 de abril de 2023.

Além desse grupo, outro time de brasileiros, esses do Hospital Sírio Libanês, em São Paulo, conquistou o segundo lugar, com o projeto “Prediomic”. A proposta é desenvolver uma ferramenta clínica não invasiva para prever o estado molecular do glioblastoma, um câncer de cérebro agressivo. Os criadores são Wellington Junior, Cecilia Felix Penido Mendes de Sousa e Felipe Restini.

Na palma da mão

Batizado de PulSUS, o projeto vencedor do Hackaton é um aplicativo para celular focado na otimização da rotina dos profissionais de cardiologia, principalmente aqueles de Unidades Básicas de Saúde (UBS). A ideia é que o app conceda ao médico um relatório sobre o perfil da população da região onde está a UBS. Por exemplo, se a maioria dos usuários do PulSUS em determinada área for tabagista, o aplicativo indica esse padrão à unidade de saúde.

Outra funcionalidade importante é a possibilidade dos pacientes registrarem o que sentem e com que regularidade tomam remédio. “Imagine que, entre uma consulta e outra, tenha um intervalo de seis meses: o paciente vai ao consultório e diz que tomou o remédio e esqueceu apenas uma ou duas vezes. Mas ele não tem a capacidade de lembrar tudo que fez nesses seis meses, o que impacta o tratamento", explica Bassi.

Além disso, o aplicativo disponibilizaria dados atualizados sobre o quadro da pessoa, e não informações de exames feitos seis meses ou um ano antes, por exemplo.

Economizando no SUS

Outra prática que prejudica o acompanhamento médico é quando pacientes procuram a UBS apenas em caso de emergência. Muitas vezes, eles faltam em consultas periódicas e, quando retornam para atendimento, o estado já é crítico. Isso demanda internação, gerando custos altos ao sistema de saúde.

Revisando estimativas de gastos do SUS, os estudantes viram que R$ 37,1 bilhões são destinados ao tratamento de doenças cardiovasculares a cada ano. A maior parte desse valor é atrelado apenas a internações e tratamentos de emergência; somente R$ 11 bilhões vão para hospitalizações.

A equipe brasileira calculou que entre 15% e 20% dessas internações poderiam ser evitáveis por meio de tratamento e acompanhamento na atenção primária à saúde. “Considerando o valor de 15%, calculamos 15% de 11 bilhões, resultando em um valor de 1,7 bilhão de reais que poderiam ser economizados pelo PulSUS”, relata a equipe a GALILEU.

Vida mais saudável

Um dos indicativos mais importantes de comorbidade cardiovascular é a verificação periódica da pressão arterial: quanto mais controlada, menor o risco de agravar a saúde. No app, todos os registros sobre pressão feitos na UBS seriam salvos para que o médico possa atender e acompanhar cada pessoa de maneira mais eficaz.

O PulSUS também tem o intuito de incentivar hábitos saudáveis entre os usuários, incluindo fazer consultas periódicas e seguir o tratamento indicado corretamente. Isso seria feito tanto por meio de notificações quanto pelo acúmulo de “cardicoins”, pontuação que dá acesso a cupons de desconto em academias, sacolões e outros serviços.

A tática de acumular moedas e descontos dá a sensação de recompensa imediata — o que não é o caso da terapia medicamentosa. “Eles veem a adesão ao tratamento com remédio como uma recompensa ao longo prazo. ‘Se eu tomar, não vou morrer tão cedo’. Isso desestimula", explica Karen Ribeiro.

Saúde em jogo

Os criadores do PulSUS também pretendem adicionar elementos de “gamificação” ao programa. Isso seria feito por meio de “competições” entre amigos, como quem toma mais corretamente o medicamento ou adere a mais hábitos saudáveis. "As pessoas continuariam aderindo ao tratamento não porque elas se sentem melhor, mas, sim, porque querem receber desconto ou competir com os colegas no aplicativo", destaca Marina Bassi.

Uma preocupação da equipe era com a acessibilidade da população a um aplicativo como esse. Embora a maioria dos brasileiros já tenha acesso à internet e a smartphones, por exemplo, muitos ainda ficam de fora.

“Infelizmente, vai ter uma população, talvez ribeirinha do interior do país, que a gente não vai conseguir atingir. Mas o nosso foco, que é o cidadão médio com certos hábitos de vida que o predispõem a doenças cardiovasculares, a gente sabe que muito provavelmente vai ter um celular”, diz Karen Ribeiro.

Após se qualificarem como vencedores gerais e conquistarem o prêmio de US$ 5 mil, agora a equipe está dedicada à etapa de incubação, que foca em colocar o projeto em prática. Eles irão realizar testes e colher resultados para, quem sabe, implementar o programa no país.

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