Entre 15 e 18 de março de 2024, uma onda de calor afetou significativamente o centro-sul do Brasil. Nas cidades de São Paulo e Rio de Janeiro, por exemplo, foram registrados recordes de temperatura e sensação térmica. Agora, um novo estudo divulgado neste domingo (24) revela que tal fenômeno foi intensificado pelas mudanças climáticas.
A pesquisa foi realizada pelo ClimaMeter, grupo da Universidade Paris-Saclay, na França, que reúne uma equipe internacional de cientistas dedicados a conduzir estudos rápidos sobre extremos meteorológicos. Dessa vez, os especialistas analisaram as características das ondas de calor do século 21 (de 2001 a 2023), comparando-as com as características que esses eventos apresentariam se tivessem acontecido no final do século 20 (de 1979 a 2001).
Os cientistas concluíram que as ondas de calor semelhantes à de março de 2024 estão 1ºC mais quentes do que as ondas de calor mais intensas observadas anteriormente no país. Trata-se, portanto, de um evento extremo considerado incomum. No dia 16, São Paulo chegou a 34,7ºC, sendo essa a maior temperatura máxima da cidade para março desde o início da série histórica, conforme o Instituto Nacional de Meteorologia (Inmet). Já no Rio de Janeiro, a sensação térmica atingiu 62,3ºC no dia 17.
Os pesquisadores atribuem essa atipicidade a uma combinação de variabilidade climática natural com mudanças climáticas provocadas pela ação humana. No âmbito da variabilidade climática natural, destacam-se a Oscilação Decadal do Pacífico e a Oscilação Multidecadal do Atlântico, que podem ter influenciado a onda de calor.
Do ponto de vista das mudanças climáticas, os autores reconhecem que elas são especialmente impulsionadas pela queima de combustíveis fósseis, responsável por grande parte da emissão de gases do efeito estufa.
“Nossa análise revela temperaturas percebidas excepcionalmente altas resultantes da convergência de ar anormalmente quente e aumento da umidade, fenômenos que devem se intensificar ainda mais com as mudanças climáticas em curso”, declara o pesquisador Tommaso Albert, em comunicado enviado à imprensa por e-mail.
Além de as ondas de calor atuais estarem mais quentes, os cientistas notaram que eventos similares antes ocorriam principalmente em novembro e dezembro. Agora, eles estão acontecendo sobretudo em fevereiro e março.
Os resultados do trabalho mostram ainda que Rio de Janeiro, Curitiba e São Paulo estão até 1ºC mais quentes do que no passado. Os dados também indicam que a capital paulista tem registrado aumento da precipitação (até 1mm por dia) — algo que, junto de temperaturas mais altas, contribui para aumentar o índice de calor.
Diante dessas informações, os cientistas chamam atenção para os impactos das mudanças climáticas no Brasil, que podem elevar os riscos de saúde e prejudicar a economia. E vale destacar que as consequências são maiores para comunidades marginalizadas. Por isso, é preciso traçar estratégias que auxiliem essas populações, buscando uma justiça climática.
“Estamos entrando no outono do Hemisfério Sul. No entanto, ele continua sendo caracterizado por condições semelhantes ao verão ou até mesmo por ondas de calor em grande parte do território”, constata o pesquisador Davide Faranda. “Medidas urgentes de adaptação são necessárias, especialmente para populações vulneráveis que vivem nas favelas, onde o índice de calor excede os valores oficialmente registrados”, afirma.