• Redação Galileu
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Artigo da Nature compartilha soluções de povos indígenas para a Antártida (Foto: henrique setim/Unsplash)

Artigo da Nature compartilha soluções de povos indígenas para a Antártida (Foto: henrique setim/Unsplash)

Talvez você já tenha ouvido falar que a Antártida é “terra de ninguém”. E, em certa medida, o termo faz sentido, uma vez que a área não pertence a nenhum governo. A expressão, porém, definitivamente não significa que essa seja uma "terra sem lei".

Em 1959, surgiu o Tratado da Antártida, determinando que o continente só pode ser utilizado com propósitos pacíficos, proibindo novas reivindicações territoriais e promovendo a liberdade de pesquisa e cooperação internacional.

O local também está sob a guarda do Protocolo de Madri, que garante a proteção integral da Antártida por pelo menos 50 anos. Como o documento passou a vigorar em 1998, os países signatários devem rediscuti-lo em 2048.

Uma dessas nações é a Nova Zelândia e, apesar de ainda estarmos em 2021, alguns estudiosos neozelandeses acreditam que já está na hora de conversar sobre a governança na Antártida. Por isso, estratégias de pesquisa no Polo Sul do planeta estão sendo repensadas com a ajuda de vozes importantes: a dos indígenas Maori. As ideias já começaram a circular e, na última semana de maio, foram publicadas na revista científica Nature Ecology & Evolution.

No artigo Transforming Antarctic management and policy with an Indigenous Māori lens ("Transformando a gestão e a política da Antártida com uma lente indígena Māori", em tradução livre) os autores argumentam que as concepções globais sobre a Antártida são dominadas por narrativas coloniais e que, diante desse cenário, práticas e valores da filosofia Maori podem contribuir para a conservação ambiental do continente.

Isso porque a cultura indígena reconhece a ligação entre o bem-estar das pessoas (“tangata”) e a proteção das terras e das águas (“whenua”). Assim, é responsabilidade dos seres humanos assegurar que suas ações sejam sustentáveis para com o meio ambiente.

Nova forma de pensar e agir

Por trás do trabalho publicado na Nature, há a preocupação de que, com a possível revisão da governança na Antártida em 2048, surjam iniciativas para geração de riquezas por meio de turismo, pesca e mineração.

Por isso, entre as principais propostas está uma mudança de perspectiva. Em vez de enxergar a Antártida como um local de exploração e fonte de recursos, os indígenas Maori afirmam que o local deveria ser visto como uma entidade com direitos e proteções.

Os autores do texto defendem que o continente gelado seja reconhecido como “pessoa jurídica”. Esse mecanismo de conservação já foi aplicado, por exemplo, no caso do rio Ganges, na Índia, com o objetivo de combater a poluição.

“Desafiamos os legados intelectuais da Antártida enquadrados nas mentalidades existentes e os expandimos para concepções alternativas de relações humanas e responsabilidades para com a Antártida e os mares que a cercam”, diz o artigo.

Além disso, outras práticas características dos Maori poderiam ser aplicadas ao continente gelado, como imposição de limites à caça, fechamento de espaços de forma sazonal, proteção de habitats importantes para o manejo pesqueiro e fiscalização.

Esse compromisso com o ecossistema vem do “whakapapa”, um conceito Maori relacionado à responsabilidade humana na relação com o meio ambiente. “Ao irmos além da atual abordagem neoliberal ocidental, nacionalista e geopolítica, e ao incluirmos nações e povos com economias e perspectivas diversas no Tratado da Antártida, podemos fortalecer o compromisso com esse continente”, afirmam os autores do artigo.

Esta matéria faz parte da iniciativa #UmSóPlaneta, união de 19 marcas da Editora Globo, Edições Globo Condé Nast e CBN. Saiba mais em umsoplaneta.globo.com.