Comportamento
 

Por Sabrina Ongaratto


"Sim gente! Aconteceu de novo. Mais um episódio de racismo na escola do meu filho. Dessa vez, doeu mais, nos trouxe mais sofrimento psíquico", lamentou a mãe de quatro Patricia Santos (@eupatricia.santos), que mora em São Caetano do Sul, região metropolitana de São Paulo, em um post que rapidamente viralizou desde a última terça-feira (3), quando foi postado. "Até quando, gente?", perguntou ela.

Na mesma postagem, a mãe, que é CEO da EmpregueAfro, compartilhou uma mensagem de áudio comovente (ouça no fim da página) que recebeu do filho. Nela, Matheus, 12, que está na sétima série de uma escola municipal, implora, enquanto chora: "Por favor, por favor, é sério, me tira daquela escola. Eu não aguento mais, eu não aguento". E continua: "Não importa para qual escola eu vá. Me tira de lá. É muita dor de cabeça, é muito sofrimento. Tô sofrendo naquela escola, eu não aguento mais. Eu não quero sofrer de novo".

Patricia divulgou racismo sofrido pelo filho na escola: "Quarta vez" — Foto: Reprodução/Instagram
Patricia divulgou racismo sofrido pelo filho na escola: "Quarta vez" — Foto: Reprodução/Instagram

Em entrevista à CRESCER, Patricia explicou: "É a quarta vez que meu filho passa por uma situação de racismo na escola. O áudio que divulguei, ele me mandou pelo WhatsApp. Quando ele chegou em casa se deu conta do que passou e desmoronou, chorou e mandou aquele áudio dizendo que não queria mais ir para a escola. Eu me senti uma péssima mãe quando ouvi a mensagem. Eu senti que a sociedade falha com as nossas crianças negras, senti um vazio, uma angústia, uma tristeza profunda, chorei junto, chorei depois... Fiquei acolhendo ele e chorando. É um mix de sentimentos: decepção, frustração, angústia, raiva. Rememorei situações de racismo que eu passei na infância, que os irmãos dele já passaram. É horrível. O sentimento de mãe diante de uma violência sofrida pelo filho é de tristeza profunda", lamentou.

Segundo Patricia, o filho estava se alimentando na escola, quando um colega se aproximou e disse: "Nossa, Matheus, tá comendo? Você nem parece africano". "Nós não somos africanos, nós somos brasileiros, somos afrodescendentes, temos o direito de existir com nossos corpos nessa sociedade racista. O colega, que deve ter mais ou menos a mesma idade, sabia o que estava falando. O problema dessa vez, é que meu filho está em sofrimento psíquico, ele chorou muito, revoltado, transtornado", desabafou a mãe.

Imediatamente após o episódio, ela disse que começou a tentar a transferência de Matheus para outra escola. "Eu não tenho condições de pagar por uma escola particular, eu tenho quatro filhos — o Matheus é o segundo — e eu acredito na escola pública. Porém, o processo é extremamente burocrático, passa pela própria Secretaria de Educação, onde estou reivindicando uma reunião pela implementação do currículo antirracista há três anos — desde o primeiro episódio de racismo que aconteceu com o Matheus aqui em São Caetano. Então, como família, sim, tomamos todas as providências: fizemos o boletim de ocorrência, entramos em contato com a OAB, com a Coordenadoria do Negro aqui de São Caetano... não adiantou nada! Eu não vejo um comprometimento real da Secretaria", disse ela, em novos stories.

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"Montamos um coletivo de mães e pais negros aqui em São Caetano, e é o que tem me fortalecido muito, como rede de apoio e orientação", continuou. "Apesar de trabalhar com a luta antirracista para inclusão de pessoas negras no mercado de trabalho, quando passa por questões de escola, a gente revive toda dor da infância, situações que a gente passou na escola trinta anos atrás. A gente precisa mudar as estruturas, a gente precisa de apoio, de forças para pressionais as estruturas", disse.

Matheus acalmou as pessoas dizendo que está melhor — Foto: Reprodução/Instagram
Matheus acalmou as pessoas dizendo que está melhor — Foto: Reprodução/Instagram

A mãe contou que o filho faz acompanhamento psicológico há dois anos e, agora, está bem. "Eu decidi compartilhar [o áudio] para sensibilizar as pessoas, a Secretaria de Educação de São Caetano, a Prefeitura, para tentar tocar no coração deles em relação a implementação do currículo antirracista nas escolas. A minha motivação é essa, porque meu filho está sendo acolhido e a gente está aqui se fortalecendo", explicou. Matheus acalmou as pessoas em um post nas redes sociais da mãe, afirmando que está bem e forte. "A luta contra o racismo é constante porque o racismo é constante", disse ele.

Nova escola

O caso aconteceu na EMEF Ângelo Raphael Pellegrino, em São Caetano do Sul. Nesta quinta-feira (5), após uma reunião com a Secretaria de Educação, Patricia informou que conseguiu transferir o filho para uma nova escola. Em relação a implementação do currículo pedagógico antirracista, ela foi informada pela pasta que "está em revisão", e mais informações serão divulgadas a partir do ano que vem.

O que diz a Secretaria de Educação

À Crescer, a Secretaria de Educação, por meio da assessoria de imprensa, informou que acatou o pedido de transferência de escola feito pela mãe do aluno vítima de racismo. "Outras decisões estão sendo avaliadas e serão tomadas com base no regimento escolar", afirmou. Em uma nota oficial, a pasta ainda reiterou seu "compromisso inabalável de não compactuar com qualquer forma de racismo ou preconceito na comunidade educativa."

E completou: "Corroborando com o nosso compromisso por uma educação que garanta o direito de todos os alunos, mais uma vez nos reuniremos com familiares, Conescs (Conselho Municipal da Comunidade Negra de São Caetano do Sul) e o Grupo Decolonial do Cecape (Centro de Capacitação dos Profissionais da Educação). O objetivo dessa reunião é ampliar o diálogo sobre as questões apresentadas e pensar estratégias que envolvam a sociedade no combate ao racismo."

"Além disso, nesta semana iniciaremos a Escola de Pais. Será um mês de palestras com especialistas em diversos temas. Essas palestras são voltadas às famílias, com a intenção de produzir uma reflexão de educadores e familiares sobre a garantia de direitos de nossas crianças e adolescentes. Reafirmamos nosso compromisso inabalável com uma educação justa, inclusiva e antirracista. Estamos trabalhando incansavelmente para garantir que todas as nossas escolas sejam lugares seguros e acolhedores para cada aluno e, mais do que isso, que esse debate se estenda a toda a sociedade — dentro e fora da escola", finalizou.

Prejuízos do racismo na infância

Em 2019, pela primeira vez, a Academia Americana de Pediatria (AAP) reconheceu que o preconceito racial afeta a saúde e o desenvolvimento de crianças e adolescentes. Em uma declaração oficial sobre o assunto, a instituição comparou o racismo como uma doença "socialmente transmissível", que é repassada e ensinada, mesmo que sem intenção, de geração em geração. De acordo com a AAP, a tensão de viver o tempo todo com a possibilidade de sofrer discriminação afeta negativamente não só a mente, como também o corpo das crianças. "O mecanismo biológico gerado pelo estresse crônico leva a níveis aumentados e prolongados de hormônios como o cortisol, levando a reações inflamatórias que predispõem os indivíduos a doenças crônicas", diz o documento.

"Precisamos entender que o racismo na infância não afeta só as crianças negras. Elas crescem sendo alvo ou vendo seus responsáveis sofrendo discriminação, óbvio. Mas as crianças brancas também crescem vendo esse tipo de cena e achando que isso é normal. Os pequenos aprendem por modelos e, enquanto os modelos que apresentarmos forem negativos, esse ciclo de violência vai se perpetuar", afirma a psicóloga Ana Marcílio, mestre em educação e justiça social e diretora executiva da ONG Avante (BA).

"O racismo coopera para que a gente viva em uma sociedade do medo, da raiva, da ansiedade. Quando você convive num ambiente que nega seus direitos, você vive num estresse o tempo inteiro. É como se o ciclo de dor e violência se renovasse todos os dias. Para o cérebro da criança, que está se desenvolvendo a todo vapor, isso tem um impacto gigantesco", explica Ana Marcílio.

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