• Mônica Tarantino
Atualizado em

Quando ouvimos falar em bactérias, a primeira reação é pensar em como proteger nossos filhos para evitar doenças, brandas ou mais graves, que podem causar. No entanto, não existem apenas bactérias do mal (as patogênicas). Há um grande número de micro-organismos que podem fazer bem à saúde humana. Eles são chamados de probióticos e estão nas nossas vidas há muito mais tempo e em maior quantidade do que se pode imaginar, a começar pelo leite materno. “Ele é a melhor fonte natural de bactérias benéficas à saúde, riquíssimo em probióticos”, afirma o pediatra e neonatologista Rubens Feferbaum, professor livre-docente pela Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo.

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Além do leite materno, os probióticos podem ser encontrados em alguns alimentos fermentados e em um número crescente de produtos industrializados, como fórmulas infantis, iogurtes, leites e bebidas fermentadas e suplementos em pó. Há também fórmulas infantis com prebióticos. E ainda fibras prebióticas e probióticos disponíveis no formato de cápsulas, gotas ou em sachês com conteúdo liofilizado [desidratado] que lotam as prateleiras de drogarias e farmácias de manipulação.

Mas por que os micro-organismos probióticos caíram nas graças da indústria alimentícia e farmacêutica? A resposta está nas descobertas da ciência. “Hoje, já se sabe que vivem no intestino humano milhares de bactérias, muitas delas ainda desconhecidas, e outros tantos milhões de genes, todos cumprindo funções indispensáveis, como regular a absorção de nutrientes e estimular a imunidade”, afirma a nutricionista Carolina Yamin, pós-graduada em Neurociências pela Faculdade Israelita de Ciências da Saúde Albert Einstein (SP). A aposta da indústria é promover a saúde por meio da adição desses micro-organismos aos seus produtos.

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LEITE MATERNO: O PRIMEIRO E MELHOR PROBIÓTICO
O pediatra e neonatologista Feferbaum está entre os cientistas que investigam os benefícios dos probióticos. Em parceria com a farmacêutica e bioquímica Carla Taddei, professora da Faculdade de Farmácia da USP, ele estuda os efeitos do leite materno na formação da microbiota, nome dado à comunidade de micro-organismos que vivem em harmonia com o nosso corpo. Eles habitam o trato gastrointestinal e ajudam em processos como a digestão e a absorção dos nutrientes, a motilidade (que ocorre no intestino) e a imunidade. A microbiota mantém a integridade da mucosa intestinal e controla a proliferação de bactérias consideradas perigosas.

Também há bactérias do bem na pele e nas mucosas (boca, cavidade nasal, seios da face e aparelho genitourinário). E, importa saber, os probióticos têm ação direta na microbiota – quando bem escolhidos, eles melhoram a sua composição.

Atualmente, a dupla de cientistas estuda o efeito do colostro (o leite materno dos primeiros dias, que, além de todos os benefícios já conhecidos, é um poderoso probiótico) dado a bebês prematuros internados em unidade de terapia intensiva neonatal em dois hospitais em São Paulo. Nesses locais, os bebês recebem gotinhas de colostro na boca até que possam ser amamentados. As crianças tomam o leite da mãe e o leite materno doado, que é pasteurizado e armazenado em bancos de leite. Os resultados têm sido surpreendentes.“O bebê que toma o colostro e o leite materno pasteurizado tem maior diversidade de bactérias na microbiota, o que melhora o desenvolvimento geral”, explica a farmacêutica Carla. Seus achados sobre a contribuição dos probióticos à recuperação desses bebês reforçam a importância da amamentação. “Essa é a semente de microbiota saudável que vai acompanhar o indivíduo e protegê-lo por toda a sua vida”, diz o pediatra Feferbaum.

- Micro-organismos podem prevenir cólicas e doenças, mostram estudos

O desempenho dos micro-organismos do bem está na mira da ciência. Uma das linhas mais fortes de investigação avalia sua ação na prevenção de cólicas em recém-nascidos que não foram amamentados. Seu potencial também está sendo estudado em bebês que mamaram exclusivamente no peito.

Mãe tomando bebida (Foto: Getty Images)

Mãe tomando bebida (Foto: Getty Images)

FOCO NA ALIMENTAÇÃO
Depois do desmame, como manter a saúde da flora intestinal? E mais: é preciso adicionar alimentos ou cápsulas contendo probióticos à dieta das crianças? Para a médica Laura Mocelin Teixeira, pós-graduada em nutrologia e avaliação metabólica, de São Paulo, o melhor caminho para cultivar a flora intestinal é seguir uma dieta balanceada, rica em frutas, legumes, grãos e hortaliças. Isso previne a disbiose, que é a queda na quantidade de bactérias do bem e o aumento daquelas que prejudicam a capacidade de absorção dos nutrientes e que podem causar doenças.

Estudos apontam que o desequilíbrio entre as bactérias do bem e as do mal facilita o aparecimento de problemas, como a falta de vitaminas, e deixa o organismo das crianças mais vulnerável, na vida futura, às doenças crônicas não transmissíveis (enfermidades imunológicas, diabetes, hipertensão, cardiopatias e mesmo alguns tipos de câncer).

“Quando nutrimos as bactérias boas do corpo, elas se reciclam e colonizam o intestino. Nessas condições, não será preciso repor a flora intestinal o tempo todo”, explica a nutróloga Laura Teixeira. Ela sugere o uso de produtos alimentícios com probióticos ou sachês, flaconetes ou cápsulas em alguns casos de problemas digestivos, e se o paciente, inclusive crianças, tomou antibióticos, faz uso de remédios ou vive sob grande estresse.

“Nessas condições, a quantidade de micro-organismos do bem diminui e eles devem ser repostos”, explica.

A nutróloga Laura reforça que o uso dos probióticos deve ser indicado e acompanhado por um profissional. Isso é importante para a seleção dos micro-organismos, pois existem centenas deles, com ações variadas. Os mais conhecidos e usados em pesquisas têm nomes curiosos, como lactobacillus acidophilus, lactobacillus casei shirota, lactobacillus rhammnosus, bifidobacterium bifidum, bifidobacterium lactis e streptococcus salivarius. Alguns deles podem ser encontrados em alimentos ou estão listados nas embalagens de produtos industrializados. Porém, há muitos probióticos achados apenas em suplementos.

- Quais são as melhores fontes de pré e probióticos?

Mas, afinal, quais são as melhores fontes de pré e probióticos? Veja as sugestões da nutricionista Carolina Yamin, de São Paulo.

Criança comendo (Foto: Getty Images)

Criança comendo (Foto: Getty Images)


A VEZ DOS PREBIÓTICOS
As bactérias benéficas que habitam o nosso organismo se nutrem de um tipo de carboidrato encontrado no leite materno e em alguns alimentos, como vegetais, frutas e grãos integrais, que atravessam o trato digestivo chegando intactos ao intestino, onde são digeridos por elas. Esses carboidratos são classificados, do ponto de vista nutricional, como fibras dietéticas solúveis (têm a capacidade de formar um gel em contato com a água) – e também são chamados de prebióticos.

Eles colaboram para o crescimento preferencial de  algumas bactérias intestinais, como as bifidobactérias e os lactobacilos, que têm efeito positivo. Além de estimular o bom funcionamento do intestino, modulam a absorção da glicose para melhorar o chamado índice glicêmico.

De modo geral, as fibras alimentares correspondem à porção de plantas ou carboidratos resistentes à digestão. Porém, sua fermentação no intestino grosso permite que promovam importantes benefícios ao organismo. Dessa maneira, oferecem intensa atividade prebiótica, possibilitando o crescimento de uma flora bacteriana saudável e protetora da saúde e da imunidade.

Assim como acontece com os probióticos, também existe a opção de obter prebióticos de alimentos industrializados, como fórmulas infantis, leite fermentados, iogurtes e suplementos. Alguns produtos, aliás, contêm os micro-organismos probióticos e fibras prebióticas. Quando essa combinação ocorre, esses produtos são chamados de simbióticos. A informação de que o produto oferece essas substâncias deve constar no rótulo, obedecendo normas da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) para fórmulas infantis e suplementos alimentares, e do Ministério da Agricultura para alimentos de consumo geral. No momento do registro, os fabricantes precisam apresentar os estudos de eficácia e segurança.

CONTROLE DA DIARREIA
Uma das condições em que os probióticos são mais empregados e objetos de vários estudos é no controle da diarreia. Segundo o Guia Prático de Atualização produzido pelo Departamento Científico de Gastroenterologia da Sociedade Brasileira de Pediatria (SBP), os probióticos são medida profilática para evitar e prevenir a diarreia associada a antibióticos. “Eles também podem ter algum efeito em diarreias causadas por agentes infecciosos, embora essa  ação ainda não esteja comprovada”, diz o pediatra Feferbaum.

Por outro lado, um estudo da Universidade de Calgary, no Canadá, que incluiu 900 crianças, afirma que essas substâncias não teriam efeito na gastroenterite. Os pesquisadores avaliaram a ação de dois produtos comerciais em crianças levadas pelos pais a centros emergenciais com vômitos e diarreia. “Não encontramos evidências de que os probióticos tenham algum papel na redução dos sintomas ou na recuperação”, disse o pediatra Stephen Freedman, do centro médico Alberta Health Services. Evidentemente, mais estudos são necessários.

No entanto, os probióticos seguem sendo empregados na tentativa de controlar o problema. A dentista Patrícia Tozzo, 39 anos, guarda sempre envelopes de um produto que combina fibras prebióticas e lactobacilos. “Orientada pelo pediatra, dou aos meus filhos Caio, 3 anos, e Téo, 6 meses, para recuperar a flora intestinal quando eles têm diarreia”, diz. Para aliviar as cólicas do filho mais novo, ela adicionou ao arsenal probióticos específicos e um remédio para evitar gases.

A bebê Maria Luísa, 7 meses, começou a tomar probióticos em gotas quando tinha apenas 90 dias, na tentativa de conter um quadro de diarreia. “Após um mês, o problema havia melhorado, mas não completamente. A pediatra indicou, então, uma fórmula com mais pré e probióticos”, conta a mãe, a costureira Luana Rangel, 40 anos. Depois de um intervalo, a diarreia voltou. Um exame revelou que a bebê, então com 5 meses, tinha uma infecção intestinal. “Agora que terminaram os antibióticos, estamos aguardando a liberação da nutricionista para dar a ela leite e kefir para melhorar a microbiota”, diz. As irmãs de Maria Luísa, Maria Emília, 9 anos, e Maria Isabel, 4, também usaram probióticos quando eram menores.

CONTRA O INTESTINO PRESO
Mais um exemplo do papel desses micro-organismos na dieta infantil é a experiência de Pedro Armando, 4 anos. Ele ingeriu probióticos para obter o efeito contrário – soltar um intestino muito travado. A vida do menino deu um salto de qualidade, depois que passou a usar, diariamente, um sachê que associa prebióticos, probióticos e mais nutrientes. A mudança foi há dois anos. “Desde que nasceu, o intestino do Pedro não funcionava, sem que conseguíssemos saber a razão. Ele fez diversos exames, alguns invasivos, mas não achamos a causa”, conta a mãe, a administradora Iara Cascardi, 34. “Hoje, a vida se divide em antes e depois dos probióticos. Ele consegue ir ao banheiro e não há mais sofrimento”, diz.

Como você pode ver, os probióticos e os prebióticos estão no nosso dia a dia, presentes nos alimentos, alguns deles, industrializados e também em suplementos e outros produtos. Mas, para tirar melhor proveito deles, além de entender como funcionam, é fundamental que você faça um acompanhamento da saúde do seu filho com o pediatra. Só ele pode dizer quando realmente é necessário incluir algo a mais na dieta do seu filho.

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