• Nathália Armendro
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O que cada um de nós sonhava em ser quando criança? E com o que será que nossos filhos têm sonhado? Teletransporte, uma viagem ao espaço, tocar nas nuvens... Essas foram algumas das respostas dadas pelos pequenos à Fábula, e que foram exibidas na live desta quinta-feira (14) da CRESCER, sob o título: “Sonhar é urgente: como os sonhos das crianças podem moldar o mundo”.

Especialistas falam sobre a importância dos sonhos das crianças para moldar o futuro (Foto: Reprodução/YouTube/Crescer)

Especialistas falam sobre a importância dos sonhos das crianças para moldar o futuro (Foto: Reprodução/YouTube/Crescer)

Mas será que sonhar é mesmo importante para as crianças?

O pediatra e sanitarista do Instituto de Estudos em Saúde Coletiva da Universidade Federal do Rio de Janeiro, Daniel Becker, garante que sim – tanto os sonhos sonhados acordados quanto os que as crianças sonham dormindo. “Os sonhos dormindo temos desde que nascemos, ele renova o cérebro, fixa a memória, tem uma série de papéis importantes... É precioso, uma forma de manifestação do inconsciente. Já o sonho acordado acontece a partir do momento que a criança começa a imaginar e se interessar pelo papel dela no mundo, por volta dos 2 anos. No início sonha-se com coisas simples e esses sonhos vão evoluindo. Mas o papel do sonho, a capacidade de sonhar é muito importante”, defende. [Reveja a íntegra da transmissão ao final da reportagem]

Nina Becker, coordenadora artística da FÁBULA e mãe da Cora, 9 anos lembra que as crianças têm essa capacidade de sonhar acordadas, brincar sonhando, sonhar brincando, e esse é um aprendizado que a gente não pode perder. "Garantir essa forma de sonhar, seja brincando junto, seja sonhando junto, lutando para que todas as crianças tenham condição e o direito de sonhar, dá pra gente a possibilidade de expandir o horizonte para além de uma realidade que está estabelecida. Incentivar o sonho é contribuir para um mundo melhor para todos nós”, ressalta.

O poder do brincar - para crianças e adultos

Como o sonho é permeado pela brincadeira, todos os convidados e especialistas que participaram do bate-papo destacaram o poder do brincar na infância, na contramão de um dia a dia “adultizado”, cheio de tarefas e compromissos. “O brincar é a linguagem essencial da criança, é como ela compreende o mundo e a si própria. Ela também se expressa através do brincar, esse é o grande canal dela com o mundo. A brincadeira tem o efeito de gerar bem-estar e felicidade, ela relaxa e permite que a criança se transforme em um adolescente e um adulto mais saudável”, explica Becker, que é também colunista da CRESCER.

Mas ainda que brincar seja imprescindível, não há fórmula única que funcione para todas as crianças, como lembrou a jornalista Renata Menezes, editora online da CRESCER, e mãe do João, 10 anos, que mediou a conversa. "Cada criança pode e deve ter respeitada na sua individualidade", enfatiza.

 Antonia, filha da jornalista e ativista Maria Karina, tem uma síndrome rara e foi diagnosticada no espectro autista quando tinha cerca de 3 anos. Segundo a mãe, embora não se comunique verbalmente, a menina sonha muito! Mas foi justamente a sua aversão a brincadeiras por mais de dois anos – algo atípico na infância - que levou a mãe a mais uma de suas tantas reconstruções na sua jornada. “Hoje Antonia está jogando bola! É um ganho de alegria tamanha ela brincar! Às vezes vejo pais cansados demais pra brincar com seus filhos, e penso como cada sonho é relativo... Meu sonho é que minha filha me peça para brincar, ou que brinque somente”, diz.

O brincar junto não precisa ser um esforço. Segundo o pediatra Daniel Becker, os benefícios ao adulto que se entrega às brincadeiras são inúmeros. “Essa é quase uma prescrição que deveria ser feita a todos os adultos: brincar! Assim como fazemos a todas as crianças. O brincar nos preenche de sonhos, exercita a imaginação, dá descanso para o nosso cérebro e para a nossa alma. Um filho exerce muitos papéis na nossa vida, nos desafia a ser pessoas melhores, já que aprende pelo exemplo, e também traz essa oportunidade de voltar à infância”, destaca.

A educadora Elen Ferreira, mãe das gêmeas Eduarda e Helena, 12 anos, e de Elisa, 8, vai além, e defende que a partilha de sonhos entre filhos e pais nos leva a lembrar da importância da liberdade, por vezes esquecida em nosso dia a diana rotina cheia de afazeres. “O adulto pode sonhar junto com a criança, partilhar os seus sonhos, se permitir reviver e ser essa criança que todos nós temos dentro de nós. Sonhar é liberdade. Brincar é sair do tempo e do espaço. Sonhar é sobretudo um ato político, de amor”, afirma a mãe, que ao lado das filhas é criadora do canal Pretinhas Leitoras.

Por que tudo isso importa?


“Somos frutos de sonhos que tivemos”. A frase de Renata Menezes talvez tenha sido uma doce síntese do papel que os sonhos podem ocupar no futuro de cada um de nós. E isso vale tanto para os sonhos individuais quanto para os sonhos coletivos. Mas, antes, é urgente dar a todas as crianças o direito ao sonho – o que infelizmente não é ainda uma realidade no Brasil.

“Em uma sociedade que precisa reivindicar a vida, o debate sobre sonho não é igual para todas as crianças”, lembra Elen Ferreira. E além da luta contra o racismo e a desigualdade, Maria Karina destaca também a importância do combate ao preconceito. “Para sonhar uma infância feliz, as crianças têm que ser abraçadas em toda a sua pluralidade, sua diversidade”, destaca a mãe de Antonia.

Para Becker, é preciso, sobretudo, dar às nossas crianças liberdade – para serem o que quiserem e encontrarem seu próprio caminho para contribuir com o mundo! “O sonho do pai ou da mãe muitas vezes é imposto à criança. Mas ela provavelmente vai ser infeliz nessa jornada. A primeira coisa a fazer quando recebemos um filho no mundo é aceitar que ele é o que ele é. Não é preciso treiná-lo. Deixemos que eles brinquem e sejam crianças, para que elas sonhem os próprios sonhos, descubram as próprias habilidades. Para então serem realizados e poderem contribuir com o mundo.”

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