• Por Bruna Cezario com Alex Alcantara
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A pesquisa produziu uma bateria recarregável à base de cimento com uma densidade de energia média de sete watts por metro quadrado (Foto: Pexels / Life Of Pix / CreativeCommons)

A pesquisa produziu uma bateria recarregável à base de cimento com uma densidade média de energia de sete watts por metro quadrado (Foto: Pexels / Life Of Pix / CreativeCommons)

Já imaginou gerar energia a partir do cimento? Há alguns anos atrás, isso era impossível, mas neste ano, pesquisadores da Universidade Chalmers de Tecnologia, na Suécia, descobriram um novo tipo de bateria recarregável que pode transformar prédios inteiros em células energéticas super eficientes e sustentáveis. O objetivo dos cientistas é que daqui a alguns anos, edifícios, comerciais ou residenciais, captem energia e a transmitam de maneira sustentável e com um valor mais baixo.

Focado no ramo da construção civil, o projeto ainda está na fase de protótipo. Emma Zhang e Lu Ping Tang, do Departamento de Arquitetura e Engenharia Civil, desenvolveram um processo que faz com que a energia seja retida no cimento a partir de uma mistura que usa o concreto e pequenas quantidades de fibra de carbono para aumentar a condutividade. Junto a essa mistura, eles adicionaram uma malha de fibra de carbono revestida de metal, com ferro para o ânodo e níquel para o cátodo. Esse método é o primeiro conceito do tipo no mundo.

Como isso pode acontecer?

Bateria recarregável de cimento (Foto: Reprodução / Yen Strandqvist / Chalmers University of Technology)

Bateria recarregável de cimento (Foto: Reprodução / Yen Strandqvist / Chalmers University of Technology)

Segundo o engenheiro Fábio de Oliveira Braga, doutor em Ciência dos Materiais e professor da Universidade Federal Fluminense (UFF), as fibras de carbono são conhecidas por sua alta condutividade elétrica e resistência mecânica. Estas fibras são adicionadas na mistura do concreto com a finalidade de melhorar as propriedades do material final, uma vez que o concreto convencional tem baixa condutividade elétrica, bem como baixa resistência e tenacidade em flexão. O termo “flexão” é quando o concreto suporta cargas na posição horizontal (vigas), apoiado somente em alguns pontos.


“Na prática da engenharia, o concreto é reforçado internamente com uma armadura de aço (concreto armado) para suportar cargas de flexão, e as fibras de carbono podem ajudar neste processo. Sobre a condutividade elétrica, é primordial que os materiais para baterias possuam algum nível de condução elétrica, para permitir que a corrente flua. No trabalho em discussão, os autores produziram uma 'argamassa condutiva', adicionando fibras de carbono na região dos polos da bateria (ânodo e cátodo), para garantir a condução de eletricidade. Os autores ainda destacaram que poderiam ter utilizado negro de fumo ou nanotubos de carbono, para esta aplicação, mas preferiram as fibras de carbono pelo seu menor custo, facilitando a produção em larga escala”, explica Fábio.

Benefícios da bateria recarregável

Maquete mostra funcionamento da bateria recarregável de cimento  (Foto: Reprodução / Yen Strandqvist / Chalmers University of Technology)

Maquete mostra funcionamento da bateria recarregável de cimento (Foto: Reprodução / Yen Strandqvist / Chalmers University of Technology)

A pesquisa identificou que a densidade energética da bateria é de sete watts por metro quadrado, sendo considerada dez vezes maior do que a de tentativas anteriores. Se comparada a bateria comuns, esse novo método perde para as outras. Porém, em questão de volume,  torna-se mais competente, pois ela pode ser instalada em obras inteiras, como prédios, pontes ou galpões pela cidade.

Além disso, como são recarregáveis, as baterias de cimento poderiam ser usadas na alimentação de lâmpadas de LED ou para o fornecimento de conexões de internet em áreas remotas.

De acordo com Iza Valadão, engenheira civil com Ph.D. em Materiais e Sustentabilidade e professora e pesquisadora da Universidade Federal Fluminense (UFF), o grande avanço de se produzir uma bateria recarregável de concreto é a possibilidade de usar a própria estrutura dos edifícios como uma zona de armazenamento de energia elétrica que, depois, poderia ser utilizada para as necessidades dos residentes ou usuários da edificação, como acendimento de lâmpadas e outros aparelhos elétricos. “Como um edifício é produzido utilizando uma grande massa de concreto, a capacidade de armazenamento poderia ser bastante alta”, comenta.

Essa energia poderia ser produzida, por exemplo, por painéis solares fixados nas regiões expostas à luz solar, e armazenada na própria estrutura. Outra possibilidade seria usar a energia fornecida pela distribuidora, de forma que o edifício funcione como um gerador, para o caso de emergências.

Futuro

Se o protótipo tiver êxito, futuramente, um prédio inteiro de concreto de 20 andares conseguirá armazenar energia renovável como uma bateria gigante. Entretanto, por mais que os testes  apontaram acerto, a produção em larga escala das baterias ainda requer muito estudo. Agora os pesquisadores almejam estender a vida útil das peças e saber se seria possível reciclá-las após esse período.

Opções de energia sustentável para construções

A instalação de placas solares cresceu 70% no ano passado e seu preço caiu 90%, deixando o equipamento mais acessível ao consumidor (Foto: Thinkstock)

A instalação de placas solares cresceu 70% no ano passado e seu preço caiu 90%, deixando o equipamento mais acessível ao consumidor (Foto: Thinkstock)

O Brasil vem avançando na tendência do uso de energia renovável. Segundo a Associação Brasileira de Energia Eólica (ABEEólica), a energia eólica é hoje a segunda fonte de geração do país. São mais de 19 GW de capacidade instalada, com mais de 720 parques e 8.550 aerogeradores em operação.

Iza Valadão explica que o desgaste do meio ambiente, pela forma como extraímos e usamos os recursos naturais, é uma preocupação crescente em escala mundial, e a construção civil é uma das atividades que mais consome dos recursos. “Estima-se que mais da metade dos recursos naturais existentes no mundo são consumidos pelo setor, resultando em uma enorme geração de resíduos. Só no Brasil, o setor gera cerca de 50% do total desses resíduos”, explica Iza.

Para a Agência Internacional de Energia Renovável (IRENA), a eletricidade produzida a partir da energia eólica e solar fotovoltaica (luz solar) é consideravelmente mais barata do que a de qualquer fonte de combustível fóssil. A disseminação dessas novas tecnologias é a aliada para baratear o custo de produção de energia renovável, tornando-a mais viável e acessível.

A Empresa de Pesquisa Energética (EPE) estima que 46% da energia produzida e usada no país seja renovável. Além de inesgotáveis, elas apresentam impacto ambiental muito menor por não produzirem dióxido de carbono ou outros gases do “efeito estufa”, e ainda oferecem menor risco, quando comparada a energia nuclear.