Medicina
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Por — Rio de Janeiro

Há pouco mais de um ano, o mundo conheceu o potencial da inteligência artificial (IA). Por meio do ChatGPT, modelos que aprendem com a ampla quantidade de textos disponíveis na internet e fornecem informações sobre praticamente qualquer assunto solicitado se multiplicaram. Com a facilidade, não demorou para que muitas pessoas trocassem o famoso “Dr. Google” pelo “Dr. ChatGPT”, pedindo orientações médicas à IA.

A prática, no entanto, ainda não é segura – já que o ChatGPT e seus similares não são validados, muito menos recomendados, para uso médico. Mas esse momento pode não estar longe de virar realidade. Especialistas ouvidos pelo GLOBO acreditam que nos próximos 10 anos existirá ferramentas tão potentes capazes de analisar informações de exames, históricos de pacientes e dados genéticos para fornecer, com precisão, sugestões de diagnósticos e melhores tratamentos para o profissional.

Além disso, contam que o caminho para chegar até lá começou antes mesmo do ChatGPT. As inovações com IA começaram a fazer parte de diversos processos na medicina há cerca de cinco anos e têm crescido em diversas redes de saúde, até mesmo do Brasil, desde então.

Um dos primeiros, e mais comuns, é o uso de um algoritmo para analisar radiografias e encontrar detalhes que o olho humano pode não conseguir encontrar tão facilmente. É o que conta Igohr Schultz, diretor-executivo Digital do Hospital Israelita Albert Einstein, em São Paulo:

— Aqui, todos os raio-x de um membro passam por um algoritmo que indica para o médico possíveis fraturas ou microfraturas. Porque tem fraturas que o médico consegue enxergar de uma forma muito clara, mas outras pequenas que não. Então a IA faz uma pré-análise para o radiologista, o que dá uma velocidade para identificar problemas.

Outra IA criada pelo hospital avalia o risco de o paciente voltar a ser internado e indica ao médico se é de fato o momento ideal de dar alta, continua Schultz:

— Com base em dados de pacientes com situações semelhantes e em uma série de indicadores do próprio paciente, o algoritmo indica para o médico se um bom momento para a alta. E, se houver risco de o paciente voltar a ser internado, ele lista os motivos. Mas a decisão final é sempre do médico.

Na Dasa, maior rede integrada de saúde do Brasil, o diretor de Inovação Aplicada e IA, Felipe Kitamura, conta que nos últimos seis anos foram validados mais de 20 algoritmos internamente, reflexo do entendimento, compartilhado com Schultz, de que o uso das tecnologias na medicina é “inevitável”.

— Criamos algoritmos que conseguem ler laudos para identificar 43 doenças que têm uma demanda de próximo passo. Por exemplo, a mamografia, quando o resultado é BI-RADS 4 ou 5, o próximo passo é biópsia. Então nossos algoritmos leem cerca de 8 mil laudos todo dia na madrugada de forma automática, identificam casos como esse e sinalizam para que o médico da Dasa avise o médico do paciente. Em média, vimos que isso reduziu o tempo para esse próximo passo de 17 para 7 dias — diz.

Outra ferramenta bem-sucedida implementada na Dasa – em meio a outras testadas, mas que não se mostraram tão promissoras – é uma IA que aprimora o exame de ressonância magnética, reduzindo a sua duração.

— Ela permite exames em média 40% mais rápidos. Com isso, são mais exames no dia, o que fez com que começássemos a dar conta de uma demanda reprimida. Além de diminuir o desconforto do paciente. Hoje, a ferramenta está presente em cerca de 80 máquinas nossas — explica Kitamura.

Nas universidades, o interesse pela área também é grande. Na Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUC-RS), o Laboratório Malta (Machine Learning Theory and Applications Lab) já recebeu prêmios internacionais e conta com um financiamento da Fundação de Michael J. Fox para identificar subtipos da doença de Parkinson com o auxílio da tecnologia.

— Hoje os médicos têm um entendimento de que o que chamamos de Parkinson pode ser um termo geral para um quadro com diferentes causas. Então criamos algoritmos de IA para tentar identificar subtipos com base na análise de dados genéticos de diversos pacientes. Como é muita informação, os médicos já tentaram fazer essa análise manualmente, mas não tiveram muito sucesso. Isso poderia abrir caminho para alternativas mais específicas e eficazes de tratamento — explica o pesquisador do laboratório Lucas Kupssinskü, professor do curso de Ciência de Dados e Inteligência Artificial da PUC-RS.

No ano passado, o MALTA ganhou 5 mil dólares ao figurar como quarta colocada numa premiação internacional do Centro de Imagens Médicas e Recursos de Dados (MIDRC) dos Estados Unidos. A equipe criou uma IA que, a partir de radiografias do tórax, consegue identificar a severidade de um problema respiratório e as suas complicações.

Modelos de linguagem como o ‘ChatGPT’ perto da área médica

Para o futuro, os especialistas apostam na capacidade de tecnologias semelhantes ao ChatGPT, porém focadas na área médica. Hoje, um problema é que o chatbot da OpenAI é treinado com base em todos os textos disponíveis na internet, não há um filtro do que é uma fonte confiável na hora de formular a resposta.

No entanto, já há ferramentas em testes treinadas especificamente com dados e diretrizes médicas para analisar informações de pacientes e definir o diagnóstico e a melhor opção de tratamento.

— Daqui a 10 anos, acredito que vamos ter IAs mais seguras em dar diagnósticos e indicar o melhor tratamento baseado em diretrizes médicas. Imagina ter uma tecnologia que tem o conhecimento de um profissional experiente e que pode ajudar um profissional recém-formado, por exemplo, a tirar dúvidas, dar sugestões. Hoje isso ainda não é seguro, mas estamos chegando lá — cita Kitamura.

A Google, por exemplo, desenvolveu o Med-PaLM e o Med-PaLM 2, algoritmos treinados em bases médicas que estão sendo testados em diversos hospitais, inclusive pela equipe da Dasa no Brasil. Num estudo, o Med-PaLM passou no exame que permite exercer a profissão de médico nos EUA com 67,7% de acertos. Pouco depois, o Med-PaLM 2 o superou, marcando 86,5%.

— Além disso, apostamos muito na inteligência artificial multimodal, que não olha só texto ou imagem. A Google já criou a MedPalm M, que é tipo a MedPaLM 2, mas que lê texto, imagem, radiografias, dados genéticos, tudo junto. Esse é o futuro na medicina — continua o especialista.

A ideia, no entanto, é que as ferramentas sirvam como um complemento, e não que substituam a decisão do profissional. Para Ben-Hur Ferraz Neto, diretor do Instituto do Fígado da rede América, os médicos não devem temer perder o emprego para uma IA, mas sim entender como trabalhar com ela – assim como as demais profissões.

— Do jeito que estamos evoluindo, se pensarmos em algumas décadas as mudanças são até inimagináveis de tão profundas. Vamos ter a IA participando efetivamente das decisões da área da saúde no dia a dia, mas junto com o profissional da saúde. Ela não vai substituí-los, mas vai dar uma qualidade de atendimento e rapidez que hoje eles não têm — diz.

É como pensa também Chao Lung Wen, chefe da Disciplina de Telemedicina da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (USP) e presidente da Associação Brasileira de Telemedicina e Telessaúde (ABTms). Ele ressalta a importância de esse tema começar a fazer parte da formação dos novos médicos:

— Quando dou aula, eu falo para meus alunos que eles precisam ter ética, coisa que a IA não tem. Que eles precisam saber fazer boas perguntas, ou a IA não vai te responder o que você precisa. A educação tem ficado no seu quadradinho, mas precisa estimular esse raciocínio crítico. Por muitas vezes, a IA vai processar informações sem contexto. E é o médico, que tem ali a relação empática com o paciente que vai entender se elas são aplicáveis ou não.

Desafios pela frente

Os especialistas citam que há dois importantes desafios para o avanço da IA na medicina. O primeiro é a regulamentação da tecnologia, uma demanda global.

Recentemente, a Organização Mundial da Saúde (OMS) publicou uma série de recomendações para o uso de ferramentas como o ChatGPT na medicina e chamou atenção para a importância de “utilizar leis, políticas e regulamentos para garantir que cumpram as obrigações éticas”.

“As tecnologias de IA generativa têm o potencial de melhorar os cuidados de saúde, mas apenas se aqueles que desenvolvem, regulam e utilizam estas tecnologias identificarem e considerarem plenamente os riscos associados”, afirmou, em nota, Jeremy Farrar, cientista-chefe da OMS.

Ferraz Neto, no entanto, pondera: — É necessário ter regras para o controle e os estudos que ainda serão realizados para a IA se transformar numa ferramenta adequada dentro da saúde, mas é importante que ela não seja tão restrita que tire a possibilidade do desenvolvimento adequado.

Outro desafio é ter a base de dados necessária para fazer com que determinados algoritmos funcionem. Os especialistas explicam, por exemplo, que já há tecnologias capazes de analisar um grupo populacional e indicar uma predisposição para determinadas doenças, mas que para isso é preciso ter em primeiro lugar as informações necessárias e agrupadas para a análise, algo que falta.

— Nesse sentido, o Brasil pode ser um ‘case internacional’. Nós temos uma coleta de dados com o SUS que poucos países têm devido à alta quantidade de pacientes atendidos. A IA pode ser uma enorme ferramenta para a prevenção de doenças futuras, identificação de indivíduos que podem precisar de cuidados antes mesmo de ficarem doentes — continua o diretor do Instituto do Fígado.

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