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A fronteira terrestre entre a Guiana e a Venezuela tem sido alvo de disputas desde o período colonial, há quase 200 anos. Mas a descoberta de um vasto campo de petróleo na costa guianesa, em 2015, adicionou novos contornos a essa briga histórica, transformando-a, por procuração, numa disputa também pelo mar. Com uma área de aproximadamente 160 mil km2, a região do Essequibo é majoritariamente constituída por uma selva quase impenetrável. No entanto, controlar essa área — que hoje responde por dois terços do território da Guiana — daria à Venezuela o direito de também explorar um litoral cujo potencial de produção é estimado em 10 milhões de barris. São justamente recursos como esses escondidos debaixo de centenas ou milhares de metros de água, que estão por trás de disputas que se arrastam há décadas entre diversos países e, em alguns casos, têm contribuído para um acirramento de tensões internacionais.

Tamanho potencial faz com que sejam necessárias regras bastante claras de divisão territorial dos mares. Segundo especialistas, cerca de 40% de todas as fronteiras marítimas do mundo ainda hoje são disputadas — 180 das 460 fronteiras em mares e oceanos possíveis no planeta estão no centro de controvérsias entre dois ou mais países.

— As fronteiras marítimas, ao contrário das terrestres, ainda estão em processo de demarcação, o que tem levado ao aumento das tensões entre os países em meio a uma tendência de crescente importância dos mares, tanto do ponto de vista econômico como militar — disse ao GLOBO o almirante da reserva Antônio Ruy de Almeida Silva, pesquisador sênior do Instituto de Estudos Estratégicos da Universidade Federal Fluminense (Inest/UFF). — Nos últimos anos, o mar deixou de ser somente via de comércio para também se tornar fonte de produção.

Segundo dados da Conferência das Nações Unidas sobre Comércio e Desenvolvimento, hoje, aproximadamente 90% de todo o comércio internacional é realizado por via marítima, enquanto 99% das transmissão de dados de comunicações dependem de cabos submarinos. Estima-se ainda que os setores ligados ao oceano contribuam com US$ 1,5 trilhão (cerca de R$ 7,4 trilhões) por ano em valor agregado para a economia global, sustentando cerca de 31 milhões de empregos. Os mares também respondem pela subsistência de mais de 3 bilhões de pessoas em todo o mundo, de acordo com a ONU.

Problemas à vista

Desde 1982, a Convenção das Nações Unidas sobre o Direito do Mar estabelece, entre outros aspectos, que todos os Estados costeiros têm direito a 200 milhas náuticas de Zona Econômica Exclusiva (ZEE), o que na prática significa permissão para explorar os recursos vivos e não-vivos das águas e do subsolo de uma área que se estende por cerca de 320 km em linha reta a partir da costa.

No entanto, embora tenha servido de base para organizar a soberania dos países nos mares, o documento da ONU, que vigora desde 1994, “pouco fez para ajudar a resolver o problema que surgiu como consequência: as reivindicações marítimas sobrepostas e disputas de limites entre os Estados”, pondera Andreas Østhagen, professor associado de Relações Internacionais no Fridtjof Nansen Institute da Noruega, em artigo de 2021.

Entre as principais disputas estão os limites do Mar do Sul da China, uma área de 3,5 milhões de quilômetros quadrados que se estende de Singapura ao Estreito de Taiwan, no Pacífico.

Pequim alega que 90% do mar, incluindo grupos de ilhas e águas também reivindicadas por partes vizinhas, são seus. O país usa a Linha das Nove Raias para definir suas reivindicações marítimas na região, cujo traçado diz ser baseado em atividades históricas que datam de séculos atrás. Mas Brunei, Malásia, Filipinas, Vietnã e Taiwan contestam a legitimidade dessas fronteiras.

 — Foto: Editoria de Arte
— Foto: Editoria de Arte

Para Maurício Santoro, cientista político, professor de Relações Internacionais e colaborador do Centro de Estudos Político-Estratégicos da Marinha do Brasil, as disputas territoriais no Mar do Sul da China podem ser consideradas “as maiores e mais graves envolvendo limites marítimos no mundo”.

— Existem guerras que são horrendas do ponto de vista humanitário, mas que têm pouco ou nenhum efeito na economia global, como a guerra no Iêmen ou mesmo a guerra em Gaza — afirma o especialista. — Mas no Mar do Sul da China é diferente. Uma guerra naquela região, mesmo com poucas mortes, teria um efeito econômico seria devastador e, provavelmente, lançaria o mundo numa recessão.

O Mar do Sul da China é hoje o principal ponto de passagem das rotas de comércio marítimo internacional, além de ser muito relevante do ponto de vista militar e dos recursos naturais. Mais da metade da frota mercante mundial e da produção global de gás natural liquefeito, bem como quase um terço do petróleo não refinado do mundo passam pelas águas do Mar do Sul da China. Seu potencial energético estimado varia de 5,4 trilhões de metros cúbicos e 11 bilhões de barris, de acordo com a Agência de Informação Energética dos EUA, a 14 trilhões de metros cúbicos de gás natural e 125 bilhões de barris de petróleo, segundo a Companhia Nacional de Petróleo Offshore da China.

A região é vizinha a Taiwan, considerada uma província rebelde pela China, e um palco recorrente de tensões com os Estados Unidos, que possuem bases militares nos arredores e têm aumentado sua presença no Pacífico nos últimos anos como estratégia para frear as ambições de Pequim. Em 2016, um tribunal internacional chegou a decidir que a reivindicação chinesa no Mar do Sul da China não tinha base legal, mas a China ignorou a decisão e continuou expandindo sua presença, inclusive com a construção de ilhas artificiais e instalações de bases militares nas áreas que reivindica.

Não muito distante dali, no Mar da China Oriental, a China também contesta o domínio das Ilhas Senkaku pelo Japão — Pequim se refere a elas como Ilhas Diaoyu e garante ser seu dono legítimo. Apesar de pequena e desabitada, a região possui grandes reservas petrolíferas e é uma importante rota comercial para países como Coreia do Sul, Japão e Taiwan.

 — Foto: Editoria de Arte
— Foto: Editoria de Arte

De um oceano a outro

As disputas de fronteiras marítimas não se limitam à região do Pacífico. Há anos, Chipre e Turquia estão envolvidos em uma disputa sobre a extensão de suas zonas econômicas exclusivas, ostensivamente provocada pela exploração de petróleo e gás no Mediterrâneo. A parte norte da ilha mediterrânea é ocupada há décadas pela Turquia, que se opõe à perfuração cipriota em águas que Chipre reivindicou com base no direito marítimo internacional. Ancara é o único Estado-membro das Nações Unidas que não reconhece Nicósia e também é um dos poucos que não assinaram a Convenção sobre o Direito do Mar de 1982.

— Em situações em que não é possível estabelecer o mar territorial de cada país, quando as distâncias entre um território e outro são menores do que as previstas na Convenção da ONU, o acordo prevê que as partes devem resolver a questão amigavelmente — explica Leonardo Mattos, professor de Geopolítica da Escola de Guerra Naval. — Mas nem sempre isso acontece, então a Corte Internacional de Justiça é acionada, como no caso de Essequibo. Só que a Turquia não reconhece a convenção de 1982, por isso, na prática, acaba valendo a vontade do mais forte.

Disputa marítima no Mediterrâneo — Foto: Arte O Globo
Disputa marítima no Mediterrâneo — Foto: Arte O Globo

À medida que o aquecimento global derrete o gelo do Ártico, empresas comerciais e potências globais também reivindicam a região polar, “tornando-a a mais nova fronteira na batalha pelo controle das águas compartilhadas da Terra e dos preciosos recursos naturais que se encontram sob o mar congelado”, aponta uma análise publicada pelo Council on Foreign Relations (CFR) em março deste ano.

O Círculo Polar Ártico, localizado no Polo Norte da Terra, pode conter cerca de 160 bilhões de barris de petróleo e 30% de gás natural não descobertos, segundo estimativas do Serviço Geológico dos Estados Unidos. A possibilidade de usá-lo como rota de navegação devido ao derretimento de suas geleiras também reduziria em 40% o tempo de viagem entre a Ásia e a Europa, poupando cerca de 14 dias aos navios, afirma Danilo Marcondes, professor da Escola Superior de Guerra.

 — Foto: Editoria de Arte
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“Com o aquecimento do Ártico, essas valiosas commodities se tornaram mais extraíveis, proporcionando um poderoso incentivo financeiro para aqueles dispostos a desbravar as novas águas navegáveis”, afirma o relatório do CFR. “Para países como os Estados Unidos e a Rússia, o Círculo Polar Ártico poderia se tornar um local tático para expandir as operações navais e nucleares. Enquanto isso, países como a Rússia e a China estão ansiosos para reduzir custos navegando pelas novas rotas marítimas do Ártico.”

Noruega, Rússia, Suécia, Finlândia, Islândia, Estados Unidos, Canadá e Dinamarca (dona também da Groenlândia) são os países com território ou águas territoriais dentro do Círculo Polar Ártico.

Elevação do Rio Grande

O Brasil não está envolvido em nenhuma disputa marítima, já que sua costa fica a mais de 4 mil milhas náuticas ou 7 mil quilômetros de distância em linha reta do território mais próximo, o continente africano. Mas o país pleiteia junto à ONU a extensão de sua plataforma continental na região conhecida como Elevação do Rio Grande, uma antiga ilha tropical atualmente submersa no Atlântico Sul.

A região é rica em recursos minerais raros, utilizados na produção de chips, baterias, painéis solares e outras inovações “verdes”. Sua localização fica a mais de 200 milhas náuticas da costa brasileira, ou seja, acima do limite previsto pela convenção da ONU para o estabelecimento de uma zona econômica exclusiva. Mas o país poderia explorar seu assoalho marítimo caso fique provado que há uma continuidade geográfica da área com o território do Brasil.

 — Foto: Editoria de Arte
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