Patrícia Kogut
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Nem só de obras geniais é feita a vida do seriemaníaco, infelizmente, mas também de diversão digna e honesta. Por isso, hoje recomendo “Accused”. A primeira temporada chegou à Paramount+. São 15 episódios. Trata-se da adaptação da TV dos EUA de um sucesso lançado pela BBC em 2010. A versão britânica rendeu um BAFTA para Olivia Colman e vários Emmys ao elenco. Aqui, de novo, ótimos atores levam as tramas, a direção é competente e o espectador nota o investimento em produção. Apesar de tudo isso, não espere encontrar algo excepcional. Os roteiros, esquemáticos, seguem uma fórmula eficiente, mas sem brilho. “Accused” proporciona a eletricidade equivalente à de uma boa história de suspense com fôlego de 45, 50 minutos, nada mais. E alguns capítulos são melhores que outros.

Como todos os enredos ditos “de antologia”, esses têm pontos comuns que os conectam. Mas podem ser vistos de forma independente. As histórias focam num personagem central. Nas primeiras cenas, ele é visto num tribunal, sendo julgado. O público só é informado de parte dos acontecimentos que o levaram até ali e é desse quebra-cabeças incompleto que advém o mistério. Em seguida, a narrativa recua na cronologia e vai montando o painel maior. Os vereditos variam, o que adiciona uma dose de eletricidade aos enredos e segura a atenção do espectador.

A ambição dessa adaptação é propor questionamentos mais profundos sobre o comportamento humano. Só que isso não acontece: os truques fazem murchar a musculatura dos roteiros. Além disso, a ideia de “destino inescapável” atravessa todas as tramas. Isso impede que elas ganhem a multidimensão de um conto moral, em que o livre arbítrio é um elemento importante.

O primeiro capítulo (“A história de Jack”), por exemplo, aborda os conflitos de um pai desesperado diante da má índole do filho caçula. Michael Chiklis é o neurocirurgião que passa por esse drama. O adolescente é cruel e violento desde pequeno. Causa sofrimento à família. Num dado momento, se torna uma ameaça à sociedade — e não entro em mais detalhes para evitar o spoiler. O dilema extremo que se apresenta para o pai é um falso-dilema. Porque a falta de caráter do garoto tem origens fatalistas, não são resultado de eventuais falhas na sua educação.

O terceiro episódio (“A história de Danny”) é especialmente fraco e lembra um filme de terror de segunda categoria. Porém, recomendo “A história de Ava”, o segundo, com Megan Boone (a estrela de “The blacklist”). A personagem contrata uma mãe de aluguel. Ava (Stephanie Nogueras) dá à luz um bebê surdo. Esse episódio levanta questões interessantes sobre maternidade, paternidade e aceitação. Ele faz pensar no ótimo livro de Andrew Solomon “Longe da árvore”.

Assim, entre altos e baixos, “Accused” é entretenimento com alguma qualidade. Distrai e não precisa ser assistido integralmente.

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