Patrícia Kogut
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Uma relação de amor tóxica e impulsionada por sexo tórrido parece sugerir uma história banal. Só que “Companheiros de viagem” de banal não tem nada. A série da Paramount+ leva a assinatura do premiadíssimo Ronald L. Nyswaner e narra a tumultuada ligação de dois homens, dos anos 1950 ao fim da década de 1980. Ela desenha também as transformações sociais nos EUA nesse período e seus efeitos na comunidade LGBTQIA+. São oito episódios (há seis disponíveis por ora) estrelados com muito brilho por Matt Bomer (Hawkins Fuller) e Jonathan Bailey (o Anthony de “Bridgerton”, aqui no papel de Tim Laughlin). Recomendo.

Hawk e Matt se conhecem em Washington D.C.. Ambos vivem no armário. O primeiro é funcionário do departamento de estado. Tem medalhas por bravura na Segunda Guerra. Bonito, ambicioso, arrumadinho, se movimenta com um passo seguro e, na cama, gosta de dominar. Serve a um político progressista, mas não por razões ideológicas. Num raro momento de franqueza admite para Tim que sonha com um posto no estrangeiro e, depois, com a aposentadoria, para “levar uma vida de liberdade irrestrita”. Já Tim, ingênuo, romântico, veio do interior, cogitou ser padre e é católico fervoroso. Seu ídolo político — e em cujo gabinete trabalha — é, contradição das contradições, Joseph McCarthy (Chris Bauer), o líder da cruzada anti-gay.

A paixão começa quando as libações do obscurantismo macartista estavam a mil. A institucionalização da homofobia e a perseguição feroz ao comunismo reinavam.

Numa segunda cronologia, nos anos 1980, a Aids alcançou Tim. Nessa fase, ele vive em São Francisco, saiu do armário e milita com a mesma paixão do passado só que por causas progressistas. Já Hawk se casou com Lucy (Allison Williams), filha de um senador, é avô e está prestes a embarcar com a família para Milão como diplomata.

“Companheiros de viagem” vem sendo muito falada por suas cenas de sexo. Elas ajudam mesmo a

Companheiros de viagem — Foto: Divulgação
Companheiros de viagem — Foto: Divulgação

fazer subir a temperatura, mas falar só disso é uma redução injusta. As interpretações, a direção e a cinematografia são arrebatadoras. O roteiro, por sua vez, constrói habilmente a relação de paixão intensa, embora neurótica, dos protagonistas. Todas as atenções se concentram neles e sem heroificações. Ao mostrar as contradições dos personagens, a história desvia dos clichês. Tudo o mais fica em segundo plano, inclusive a (boa) trama de Marcus (Jelani Alladin), um repórter negro e gay que busca um lugar num mundo hipócrita e segregacionista.

Mais uma cronologia, essa não retratada na história, se coloca, invisível, entre o espectador e a tela: os dias de hoje. É impossível não imaginar como seria tudo diferente para aqueles personagens nos anos 2000. Não que a homofobia seja um assunto superado, longe disso. Mas o mundo mudou de lá para cá e a Aids já não tem a dimensão daqueles tempos.

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