Não espere grandes surpresas. “Acima de qualquer suspeita”, lançada pela AppleTV+, é, parafraseando o poeta, “um museu de novidades”. Seu roteiro tem todos aqueles ingredientes que compõem um suspense clássico. Ainda assim, a minissérie merece a sua atenção. A trama se baseia no best-seller de Scott Turow lançado em 1987. Ela virou filme em 1990, com Harrison Ford e Brian Dennehy nos papeis principais. Há três episódios disponíveis na plataforma. A temporada completa terá oito e os inéditos entram toda quarta-feira. Os fãs do gênero vão grudar na tela.
Jake Gyllenhaal interpreta Rusty Sabich, um procurador de Chicago. Ele e a mulher, Barbara (Ruth Negga), têm dois filhos adolescentes — Kyle (Kingston Rumi Southwick) e Jaden (Chase Infiniti). A família leva uma vida confortável, numa daquelas casas de subúrbio próspero. Já nas primeiras cenas, essa aparente felicidade sólida é interrompida. Eles estão jogando bola no jardim quando alguém liga avisando que Carolyn Polhemus (Renate Reinsve) foi assassinada.
A morta era o braço direito de Rusty e também sua amante. A ligação profissional continuava funcionando, mas o elo romântico que começara mais de um ano antes tinha se complicado. Na época, Barbara soube da relação extraconjugal do marido. O casamento dos dois ficou abalado quando ele revelou o caso, mas eles procuraram ajuda de uma terapeuta e ela acreditou quando ele garantiu que estava tudo superado. Com a morte de Carolyn, ela descobre que não era bem assim. A confiança entre eles fica abalada, mas Barbara promete apoiar o marido quando ele se torna suspeito do crime.
O enredo se fragmenta. Numa ponta acompanhamos o drama familiar do protagonista. Em outra, seguimos as investigações. Há ainda uma guerra política envolvendo a eleição para procurador, disputas profissionais, um filho de Carolyn que ela nunca mencionou e uma policial idealista, a detetive Alana Rodriguez (Nana Mensah).
A série é levada ainda por muitos flash-backs. Essa janela para o passado é uma tentativa do roteiro de mostrar para o público a intensidade da relação de Rusty com Carolyn. O resultado é um erotismo de filme B, que puxa o resultado para baixo.
O roteiro não ambiciona revolucionar fórmulas. Ele é esquemático e ponto. Há ainda um certo “feminismo de manual” no tipo de construção das personagens femininas e no heroísmo às vezes achatado, unidimensional, atribuído a elas. Isso não significa, contudo, falta de eficiência. O público treinado pelas séries de suspense vai prever certos acontecimentos. Mas, para embarcar na história, basta calibrar as expectativas. O elenco no geral é de talentos, apesar de algumas escalações pouco certeiras. Uma delas chama atenção em especial: Peter Sarsgaard, e não Gyllenhaal, deveria ter levado o personagem principal.
No mais, é preparar a pipoca e se divertir.
PS: Deixo aqui outras dicas para o leitor que gosta do gênero. Cruel Summer; As flores perdidas de Alice Hart; Depois da cabana.