Cassação de Moro: Juiz indicado por Lula vai usar Selma Arruda em voto por perda de mandato

Julgamento vai ser retomado com voto de cerca de 45 páginas rebatendo as conclusões do relator

Por — Brasília


O senador Sergio Moro Brenno Carvalho/ Agência O Globo

Indicado ao cargo pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva, o juiz José Rodrigo Sade deve abrir o julgamento do senador Sergio Moro (União Brasil-PR) nesta quarta-feira (3) com um voto em que usará o precedente do caso Selma Arruda para defender a cassação do ex-juiz federal da Lava-Jato.

Conhecida como “Moro de saias”, Selma foi cassada em dezembro de 2019 por caixa 2 e abuso de poder econômico pelo plenário do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) por ter antecipado despesas de campanha, como contratação de empresas de pesquisa e de marketing, para a produção de vídeo e jingles, em período de pré-campanha, o que é proibido pela legislação eleitoral.

Na última segunda-feira, Sade pediu vista e interrompeu a discussão do caso Moro, após o relator, desembargador Luciano Carrasco Falavinha, proferir um voto de 231 páginas em que não constatou “indícios mínimos” de crimes para punir o senador paranaense.

Em seu voto, Falavinha também disse não ver conexão entre o caso de Selma Arruda e o de Moro.

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Acontece que o precedente da juíza de Mato Grosso é um dos fundamentos das ações do PT e do PL acusam o senador de prática de caixa 2, abuso de poder econômico e uso indevido dos meios de comunicação social.

Os dois partidos usam o caso Selma para tentar convencer o TRE do Paraná de que a exposição e os recursos de Moro na pré-campanha para a Presidência da República deram a ele uma vantagem indevida na campanha para o Senado.

Segundo a equipe da coluna apurou, o voto de Sade vai incorporar esse argumento. O arrazoado deve ter cerca de 45 páginas, com tabelas elencando quais despesas e contratos da fracassada pré-campanha presidencial de Moro serão considerados para caracterizar o abuso de poder econômico.

Em seu voto, Sade também fará referência à Lava-Jato, citada por Falavinha. Mas, de acordo com fontes que acompanham a dinâmica interna do tribunal, não será uma referência tão longa como a do relator, que tratou da operação no início e no fim do voto.

“Não se está aqui a julgar a Operação Lava-Jato, seus personagens, acertos e erros”, disse Falavinha, que ainda fez uma análise sobre a operação e o que julga ser pontos positivos e negativos.

Sade deve inaugurar com o voto de hoje a corrente pela cassação de Moro, em oposição ao entendimento de Falavinha, que votou pela absolvição do senador.

Um dos principais argumentos da defesa de Moro para rechaçar qualquer conexão com a cassação de Selma é o de que, no caso dele, os gastos foram bancados pelos próprios partidos políticos – o Podemos e o União Brasil, para onde o ex-juiz acabou migrando após a sua candidatura presidencial fracassar. Portanto, teriam “natureza partidária e sem relação direta com a campanha” que ele veio a fazer depois, para senador pelo Paraná.

Já no caso de Selma Arruda, as despesas que levaram à sua cassação envolveram recursos privados não declarados, o que foi enquadrado como caixa 2.

Em seu voto, o relator encampou a tese de Moro. “O caso Selma Arruda não tem qualquer relação com este caso. Apesar da forte narrativa criada, a relação das causas não está nada clara; ao revés, não tem correlação alguma”, disse Falavinha na última segunda-feira.

Apesar desse posicionamento, o parecer do Ministério Público Eleitoral do Paraná também recorre ao caso da ex-juíza ao pedir ao TRE a cassação do mandato e a inelegibilidade de Moro.

Selma é citada dez vezes nas 78 páginas da manifestação dos procuradores.

Mas não é só a aplicação do precedente do caso Selma Arruda que deve dividir o tribunal.

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Enquanto o Ministério Público Eleitoral, que defendeu a cassação de Moro, entendeu que os gastos da pré-campanha foram de R$ 2 milhões, Falavinha concluiu que as despesas que deveriam ser consideradas no julgamento de Moro foram bem menores: R$ 224,7 mil.

Isso porque Falavinha concentrou sua análise nas despesas relacionadas especificamente à pré-campanha de Moro ao Senado pelo Paraná, e não à sua tentativa de disputar o Palácio do Planalto pelo Podemos nem ao período em que o ex-juiz da Lava-Jato tentou emplacar o domicílio eleitoral em São Paulo.

Já o PT, autor de uma das ações, apontou gasto de R$ 21,6 milhões, incluindo até voos fretados de Moro e auxiliares.

A expectativa é a de que Sade considere mais despesas que Falavinha em seu voto, que ainda sofria os ajustes finais na noite desta terça-feira. Como se verá mais tarde, a “guerra dos números” ainda não chegou ao fim.

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