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Por Eduardo Vanini

Encarar o interior do Museu Nacional pode ser indigesto. Vigas de ferro retorcidas e paredes em ruínas trazem imediatamente à memória uma das lembranças mais atordoantes da História recente do Brasil: assistir à primeira instituição científica e museológica do país, fundada em 1818 por D. João VI e vinculada à UFRJ desde 1946, arder em chamas ao longo daquela noite de 2 de setembro de 2018.

A tragédia provocou uma sensação de nó na garganta em pessoas do mundo inteiro que, nos dias seguintes, voltaram às suas rotinas. Por trás das paredes chamuscadas do prédio, porém, profissionais começaram, pouco depois do incêndio, a cuidar da recuperação do que restou e da reconstrução do museu, numa atuação em que a força feminina foi e permanece fundamental. “Muitas mulheres têm tido um papel de destaque neste processo. Representamos esse comprometimento com o legado do museu”, reconhece a chefe de Gabinete, Mariah Martins, sobre o ritmo dos trabalhos

Graças a profissionais como as seis que mostramos a seguir, a fachada e o jardim frontal do palácio ressurgiram das cinzas no ano passado. Agora, elas se preparam para entregar cada um dos quatro circuitos expositivos que vão compor o novo museu: “Histórico”, sobre a própria instituição; “Diversidade cultural”, dedicado à experiência humana; “Ambientes do Brasil”, voltado à biodiversidade; e “Universo e vida”, em que os visitantes serão apresentados à origem da Terra e da vida. As inaugurações estão previstas para começar, em etapas, no ano que vem, mas elas já dão pistas do que está por vir.

Thaís Mayumi

Nascida e criada no Méier, na Zona Norte do Rio, Thaís teve a infância marcada por um passeio frequente aos fins de semana: a ida à Quinta da Boa Vista, com uma dobradinha entre o Museu Nacional e o Zoológico. Ainda na adolescência, pode ir além e conhecer os meandros da instituição. Aluna do Colégio Pedro II, foi aprovada no projeto de iniciação científica do museu, experiência que determinou a escolha de sua profissão, a museologia. “Fico pensando na geração inteira de crianças que está crescendo sem poder visitar esse lugar, ao contrário do que aconteceu comigo”, desabafa.

O lamento, porém, não tem nada de resignação. Afinal, apesar dos traumas provocados pelo fogo, Thaís está empenhada em ver as portas abertas novamente. “Ainda vivemos o dia seguinte ao incêndio. Perdemos 85% do acervo, mas também é um privilégio olhar para o futuro. Temos a oportunidade de entregar ao público uma nova narrativa”, diz ela que, mesmo sem a sede em funcionamento, participou de outras exposições temporárias apresentadas em diferentes lugares do Rio.

Renata Stopiglia

Dentre as preciosidades guardadas pela instituição, está uma das principais coleções de aves do Brasil: são 70 mil itens do século XIX que ficavam acomodados fora da sede e, por isso, não foram afetados pelo incêndio, salvo algumas peças em exposição. Explorar o potencial dessas relíquias é uma responsabilidade de Renata, a primeira ornitóloga do museu em cem anos e a primeira curadora de aves desde a fundação. “São 13 curadores de vertebrados e só eu de mulher”, contabiliza.

Pesquisas feitas a partir do acervo de aves ajudam a identificar, por exemplo, variações em espécies brasileiras e saber se correm algum risco. Renata cuida também da taxidermia, que envolve a exibição de animais mortos ao público e, recentemente, esteve à frente da recuperação do esqueleto de uma baleia-cachalote que veio do Ceará e está exposta na Cidade das Artes, na Barra.

Com a reinauguração, o material terá o palácio da Quinta da Boa Vista como endereço, exibido sobre a escadaria monumental. São 15 metros de comprimento que não intimidam Renata. Afinal, para conquistar o seu espaço, ela lidou com desafios de outra ordem. “Tem poucas mulheres em atuação nessa área, embora não haja motivo para isso. Estar à frente dessas questões no museu é um incentivo importante para outras profissionais.”

Renata Stopiglia é a primeira ornitóloga do museu em cem anos — Foto: Márcia Foletto
Renata Stopiglia é a primeira ornitóloga do museu em cem anos — Foto: Márcia Foletto

Cláudia Rodrigues Carvalho

Coordenadora do resgate de acervos, Cláudia está envolvida em um dos trabalhos mais cercados por expectativas: o que será feito com os fragmentos do crânio de Luzia, o fóssil mais antigo do país, recuperados sob os escombros. “Ainda não sabemos como vamos apresentá-lo, mas queremos encontrar a melhor maneira para isso”, adianta. “O fato deste fóssil ser de uma mulher é bastante representativo dentro de uma arqueologia que ainda fala muito do homem e, frequentemente, não considera o feminino ou faz isso a partir de padrões tradicionais.”

Na foto, Cláudia mostra objetos que tiveram especial apreço quando encontrados. São ferramentas fundamentais para contar a própria história da antropologia biológica, uma das áreas de pesquisa da instituição. “São instrumentos do século XIX, que nos ajudam a entender pesquisas feitas naquela época.”

Cláudia Rodrigues Carvalho está envolvida com a recuperação de Luzia — Foto: Márcia Foletto
Cláudia Rodrigues Carvalho está envolvida com a recuperação de Luzia — Foto: Márcia Foletto

Ana Amaral

Incorporada à equipe de resgate do acervo logo depois do incêndio, a técnica em restauração de papel aderiu a uma rotina extenuante ao longo de meses. “Chegávamos às 7h e continuávamos enquanto houvesse luz do sol”, conta. A fala, é bom lembrar, é literal, já que o teto do museu havia desabado e só depois ganhou uma cobertura provisória.

Em meio a dias de calor escaldante e chuvas torrenciais, paramentada com duas luvas, máscara, capacete e uma pá de jardinagem, Ana recuperou dos escombros fragmentos de peças que voltaram para o acervo. “Tudo o que encontrávamos era motivo de comemoração, mas me lembro especialmente do dia em que achamos um pote de cerâmica pré-colombiano praticamente inteiro”, descreve.

Enquanto assimilava, com o passar dos dias, como o museu permanecia vivo em cada item encontrado, Ana entendeu também o quanto a força feminina responde pelo êxito da recuperação. “Quando cheguei, estava todo o mundo meio perdido e foram justamente duas professoras que direcionaram os trabalhos e ajudaram todos a se organizarem. A equipe também era majoritariamente feminina.”

Ana Amaral atuou nas escavações em meio aos escombros — Foto: Márcia Foletto
Ana Amaral atuou nas escavações em meio aos escombros — Foto: Márcia Foletto

Juliana Sayão

Acostumada a enfrentar condições extremas acampada na Antártida, onde participa de missões em que pesquisa fósseis, a professora da instituição e diretora adjunta de integração museu e sociedade levou um ano até conseguir entrar na sede, onde ficava sua sala. “Cheguei aqui como estagiária, em 1997. Não tinha estrutura para ver um lugar que figurou na maior parte da minha vida destruído”, relembra. “O primeiro fóssil que descrevi na vida, de um pterossauro, estava lá e se perdeu. Também perdi livros raros que acumulei ao longo de anos de estudos e não existem em PDF.”

Embora seja uma pesquisadora dos rastros de vida deixados sobre a Terra, Juliana não é do tipo que negligencia o presente e o futuro. Assim como suas colegas, a vontade de recuperar o museu foi maior do que o trauma do incêndio. Tanto que, três meses após o fogo, inaugurou uma exposição que seria aberta no palácio no mesmo dia em que a montagem oficial estava prevista. Era uma mostra sobre a Antártida, que foi transferida para a sede do Museu da Casa da Moeda, o primeiro endereço do Museu Nacional. “Trabalhamos muito para que isso fosse possível. Não queríamos deixar de passar conhecimento científico para as pessoas. Mostramos que a instituição está viva.”

Julia perdeu parte de seu material de pesquisa no incêndio e agora atua ativamente na reconstrução do museu — Foto: Márcia Foletto
Julia perdeu parte de seu material de pesquisa no incêndio e agora atua ativamente na reconstrução do museu — Foto: Márcia Foletto

Mariah Martins

Quando soube que o prédio estava em chamas, a chefe de gabinete Mariah Martins correu para lá e assistiu, incrédula, às labaredas se espalharem. Hoje, não consegue mais ver essas imagens, mas uma das memórias que guarda daquela noite foi o abraço trocado com uma colega. Um gesto que, segundo ela, ficou cada vez mais recorrente entre a equipe dali em diante. “Passamos a cuidar uns dos outros, a querer trazer conforto, como se disséssemos: ‘Calma! Vamos seguir em frente’”, narra.

Uma corrente de solidariedade se formou, pessoas cederam suas salas para quem não tinha mais onde trabalhar e voluntários chegaram à Quinta da Boa Vista querendo ajudar. Quase cinco anos depois, cá está ela, cercada de colegas cheias de planos e com um objetivo em comum: um museu inteiro para entregar. “Temos potencial para ser o melhor do Brasil”, aposta.

 Mariah Martins é chefe de gabinete do museu — Foto: Márcia Foletto
Mariah Martins é chefe de gabinete do museu — Foto: Márcia Foletto
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