O que muda no nosso corpo durante o frio? O organismo reage com diversas alterações quando exposto a baixas temperaturas. Mudanças no metabolismo, constrição dos vasos sanguíneos, estresse cardiovascular, irritação das vias aéreas e tremedeiras nos músculos são efeitos possíveis nessas situações tão comuns no inverno.
É que a temperatura do corpo humano deve estar entre 36ºC a 37ºC. Assim como age para se refrescar quando está calor, o organismo atua para se esquentar quando é exposto a baixas temperaturas.
Mulher praticando atividade física agasalhada por causa do frio — Foto: iStock
Um dos efeitos mais conhecidos e visíveis é a tremedeira involuntária do corpo. Isso acontece como uma maneira de, a partir da contração e do relaxamento dos músculos, se produzir calor. Mas há outras repercussões internas quando estamos expostos ao frio.
- Com o resfriamento da pele, que é o ponto de contato com o ambiente, o corpo desencadeia uma série de alterações para se esquentar e elevar a temperatura interna;
- Os vasos sanguíneos são contraídos, ou seja, diminuem de diâmetro, para evitar a perda de calor;
- O sangue deixa a periferia do corpo, como mãos, pés e orelhas, concentrando-se mais no interior do corpo para suprir os órgãos;
- O metabolismo basal, o básico para o funcionamento do organismo, é aumentado, assim como a produção de hormônios;
- Frequência cardíaca e pressão arterial são elevados;
- O sistema respiratório é mais exigido e sofre com a menor umidade do ar, o que pode causar irritação, principalmente nas pessoas mais sensíveis;
- Para produzir calor, o organismo promove tremedeira nos músculos;
- A quantidade de xixi aumenta, porque, ao contrário do que ocorre no calor, a água do corpo não é eliminada por meio do suor, elevando o volume de urina a ser excretada.
O que acontece no corpo no frio
De acordo com o presidente do Departamento de Endocrinologia do Esporte da Sociedade Brasileira de Endocrinologia e Metabologia (SBEM), Clayton Macedo, o frio no corpo tem efeitos nos sistemas metabólico, circulatório, cardiovascular e respiratório.
Estresse cardiovascular
— Quando expostos ao frio, os receptores sensoriais da pele detectam a queda de temperatura e enviam sinais ao sistema nervoso central, desencadeando uma resposta de defesa — explica Clayton.
— O sistema nervoso simpático é ativado para aumentar a produção de calor interno, elevando a frequência cardíaca e a pressão arterial, entre outras respostas fisiológicas, como a contração dos vasos sanguíneos periféricos. Como o calor vai todo "para dentro", as extremidades do corpo ficam mais geladas, podendo até mesmo causar queimaduras nos dedos.
Essas repercussões fazem com que haja aumento de cerca de 30% no número de doenças cardiovasculares no inverno, especialmente em temperaturas abaixo de 14°C. De acordo com o Instituto Nacional de Cardiologia, são 30% mais ocorrências de infarto agudo do miocárdio e até 20% a mais de acidente vascular cerebral.
Irritação respiratória
— O frio irrita as vias aéreas devido à sua natureza seca e à redução da umidade relativa do ar durante climas frios. Isso pode levar à inflamação das vias respiratórias, especialmente em pessoas sensíveis, como aquelas com histórico de doenças respiratórias — aponta Clayton.
— A irritação das vias aéreas pode causar broncoespasmos devido à resposta do corpo para proteger as vias respiratórias. Quando as vias aéreas são irritadas, os músculos ao redor delas podem se contrair de forma excessiva e repentina, causando o estreitamento das vias respiratórias e dificultando a passagem do ar.
Aceleração do metabolismo
O Instituto Nacional de Segurança e Saúde Ocupacional dos Estados Unidos (NIOSH) é um dos órgãos que mais contribui para pesquisas sobre o tema, tendo lançado dezenas de materiais sobre o "cold stress" - termo ainda não muito comum no Brasil que pode ser traduzido para "estresse pelo frio".
Segundo o Guia para Estresse pelo Frio, com a exposição do corpo a uma baixa temperatura, o metabolismo basal de uma pessoa comum tem aumento da produção de adrenalina e de todos os hormônios aceleram o metabolismo, o que resulta em um consumo maior de energia. É por isso que sente-se mais fome no frio.
Entretanto, é necessário se atentar de que isso não quer dizer que se pode comer mais sem o risco de engordar. Especialistas recomendam manter a dieta e a rotina de exercícios físicos, importantes para o bom funcionamento do organismo. Da mesma maneira que, embora possa existir uma sensação maior de saciedade, é essencial beber água regularmente.
Risco de exposição prolongada ao frio
A exposição prolongada ao frio pode levar a uma série de alterações no corpo que aumentam o risco de complicações de saúde, de acordo com Guilherme Pereira, professor do Departamento de Ciências Fisiológicas da Universidade Federal de São Paulo (UFSCar).
— Em temperaturas mais baixas, o sangue tende a se tornar mais viscoso, favorecendo a formação de coágulos sanguíneos, o que pode levar ao tromboembolismo. Além disso, o frio pode causar constrição dos vasos sanguíneos, dificultando o fluxo sanguíneo e aumentando o risco de doenças como trombose ou embolia.
— Há ainda a chance de congelamento de tecidos - podendo, em casos graves, chegar até mesmo a queimaduras pelo frio. Com o acúmulo de tecido morto, pode chegar numa gangrena — completa o professor.
Como se proteger do frio
Para se proteger do frio, a professora Ana Carolina Kiss, do Departamento de Fisiologia da Universidade Estadual de São Paulo (Unesp) de Botucatu, ressalta ser importante se alimentar corretamente, manter a hidratação adequada e, principalmente, cuidar das vestimentas, de modo a se proteger das baixas temperaturas e aquecer o corpo, minimizando todos os efeitos desencadeados pelo frio.
— O corpo gelado disfarça as sensações de desidratação e saciedade, fazendo nos sentirmos mais satisfeitos do que realmente estamos. É importante se vestir adequadamente, usando mais de uma camada de roupa para isolamento térmico e proteção contra o vento e a umidade. Além disso, é importante proteger as extremidades do corpo, como mãos, pés, cabeça e pescoço, usando luvas, gorros, cachecóis e meias grossas, para evitar a perda de calor nessas áreas vulneráveis.
— Por fim, manter-se ativo e em movimento pode ajudar a gerar calor corporal e melhorar a circulação sanguínea, mantendo-o aquecido mesmo nas condições mais frias — complementa a especialista.
Como se exercitar no frio
É necessário ter cuidado com a prática de exercícios físicos no frio, justamente por causa do maior estresse cardiovascular causado pelas baixas temperaturas.
— Embora o corpo vá ficando mais quente com o movimento, o fluxo sanguíneo vai para os músculos ativos e para a pele, facilitando a transferência de calor. Há estudos que sugerem que a exposição ao frio também pode reduzir a quantidade máxima de consumo de oxigênio, o VO2 — ressalta Guilherme, que também atua no Laboratório de Fisiologia Clínica e do Exercício da UFSCar.
— Para lidar com isso, recomenda-se o uso de várias camadas de roupa, com tecido adequado e protegendo as extremidades. É também vital se manter hidratado, já que o frio mascara a sensação de hidratação e saciedade — conclui o professor.
Fontes:
Clayton Macedo é presidente do Departamento de Endocrinologia do Esporte da Sociedade Brasileira de Endocrinologia e Metabologia (SBEM).
Guilherme Pereira é professor do Departamento de Ciências Fisiológicas da Universidade Federal de São Carlos (UFSCar) e do Laboratório de Fisiologia Clínica e do Exercício da UFSCar.
Ana Carolina Kiss é professora do Departamento de Fisiologia da Universidade Estadual de São Paulo (Unesp) em Bauru.
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