• David Baker*
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Ilustração: Rodrigo Buldrini (Foto: Buldrini)

Ilustração: Rodrigo Buldrini 

Em 1994, participei de um encontro para celebrar o aniversário de 32 anos de um dos meus amigos. Na festa, havia uma câmera de vídeo e nós decidimos fazer um filme que mostrasse nosso grupo falando sobre o momento em que estávamos na vida e as nossas esperanças para o futuro. Combinamos que iríamos assistir o vídeo dali a três ou quatro anos, mas por alguma razão nunca chegamos a fazer isso. Até o mês passado, quando, 28 anos depois, nós nos reunimos para celebrar o aniversário de 60 anos do mesmo amigo e nos sentamos para assistir o tal vídeo do passado

Estávamos bastante apreensivos para saber até que ponto nossas versões mais jovens pareceriam inseguras e ingênuas. Mas, desde os primeiros minutos da gravação, ficamos hipnotizados pelo vídeo. Não tanto pelo que estávamos falando – algumas das nossas esperanças haviam se realizado, outras haviam se perdido – mas pela maneira como falamos. Por uma hora e quinze minutos nós ficamos ali, assistindo a esse grupo de pessoas que falava calma e honestamente, com revelações reais sobre a vida, o mundo e as possibilidades que o futuro poderia trazer. Foi fascinante.

Na volta para casa, me peguei questionando as conversas que tinha no trabalho e tentando entender por que elas raramente são assim: calmas e honestas. Afinal, o que é uma reunião senão um grupo de pessoas se juntando para trocar ideias e compartilhar e ampliar percepções?

Na prática, reuniões são, para muitas pessoas, a pior parte de ir ao trabalho. Com frequência as reuniões de trabalho são frustrantes, sem graça e longas demais. Muitas vezes temos a sensação de que resolvem muito pouca coisa.

A solução mais comum para esse problema é tentar reduzir o número de reuniões. Mas fico imaginando se não há outra maneira de torná-las mais produtivas: continuar a fazer reuniões, mas de uma maneira mais parecida com aquilo que meus amigos e eu fizemos tantos anos atrás.

O que foi que tornou a conversa do tal vídeo tão produtiva? Bem, para começar, era nítido que todos estavam totalmente focados em quem quer que estivesse falando. Ninguém estava mexendo no telefone – poucas eram as pessoas que tinham celular naquela época. Ninguém estava escrevendo no notebook. Ninguém estava conversando baixinho com a pessoa ao lado. Em vez disso, todos estavam ouvindo com atenção a pessoa que estava falando. Isso fez com que cada uma falasse mais abertamente e, ao fazer isso, descobrisse coisas nas quais não havia pensado anteriormente.

Em segundo lugar, como estávamos seguindo uma ordem determinada sobre quem seria a próxima pessoa a discursar, todos sabiam que teriam sua chance para falar, evitando aquelas interrupções ansiosas que tantos de nós fazemos em reuniões de trabalho, falando alguma coisa apenas por falar. As pessoas se manifestavam entre um discurso e outro, claro, mas quando faziam isso quase sempre formulavam perguntas úteis, que ajudavam quem estava falando a tornar mais claro o seu pensamento.

Em terceiro lugar, ninguém usava o que o outro havia dito antes como uma deixa para tomar a palavra e contar uma história divertida sobre si mesmo, ou mostrar quão bem conhecia aquele assunto – algo que, pelo menos na minha experiência, acontece com muita frequência em reuniões no escritório. (Eu mesmo sou culpado disso.)

Em quarto lugar, não havia competitividade naquela sala. Nenhum de nós estava preocupado em perder o emprego ou ser preterido em uma promoção caso dissesse algo tolo. Isso quer dizer que podíamos elaborar o que estávamos pensando por meio da fala, em vez de achar que tínhamos que dar uma resposta pronta e impressionante. (Eu sou culpado disso também.)

Em quinto lugar, o encontro parecia significativo. Nós sabíamos que iríamos assistir ao filme em algum momento no futuro e isso conferiu relevância para o que tínhamos a dizer.

E, finalmente, estávamos nos divertindo. Era um prazer falar, ouvir e refletir sobre o que estava sendo dito.

Sei que estou correndo o risco de comparar alhos com bugalhos. Nós éramos um grupo de amigos relaxando em uma festa de aniversário, e não colegas em uma reunião do time de vendas numa segunda-feira pela manhã. Mas eu acredito que as duas situações não são tão diferentes quanto imaginamos. Nos dois casos, trata-se de uma interessante oportunidade de troca de ideias entre uma mente e outra. Suspeito que, do ponto de vista do cérebro, os dois tipos de encontros são muito similares.

À medida que voltamos ao escritório, depois do isolamento provocado pela Covid-19, vamos nos encontrar em salas de reunião com mais frequência. Para mim, o que eu gostaria de fazer é tentar copiar muito do que eu vi naquela reunião de amigos exibida no vídeo, nas nossas versões mais jovens, e trazer isso para essa minha vida atual: focar e ouvir em vez de falar, permitir que todos tenham a palavra, colocar de lado a competitividade natural que permeia o trabalho, relaxar e apreciar o prazer que surge quando um grupo de seres humanos se sentam para compartilhar as ideias que estão em suas mentes.
Se mais reuniões começarem a ter esse tipo de sabor, de experiência, talvez nós possamos até mesmo aguardar ansiosamente por elas.

David Baker (Foto: Divulgação)

O escritor David Baker (Foto: Divulgação)

*David Baker é co-fundador da The School of Life Brasil e um dos membros seniores do corpo docente da The School of Life em Londres. Foi um dos fundadores da revista Wired no Reino Unido e escreve para o Financial Times, The Guardian e The Economist, além de fazer documentários para a rádio BBC.