Testes de Carros

No mundo da música, amplificadores são os aparelhos responsáveis por multiplicar um sinal elétrico, ampliando a sonoridade de um instrumento. Mas é no silêncio de um carro elétrico que a BYD quer conseguir efeito parecido. E o amplificador tem nome e sobrenome: Dolphin Mini, que acaba de chegar ao Brasil por R$ 115.800 (veja equipamentos e ficha técnica).

É com esse modelo que a marca chinesa tentará ensurdecer a concorrência e aumentar, em algumas vezes, a presença dos veículos a bateria nas ruas brasileiras. E vai fazer isso apelando para um preço capaz de colocar uma família inteira de pulgas atrás das orelhas dos executivos das marcas tradicionais.

BYD Dolphin Mini é mais curto que os hatches compactos, mas quase 10 cm mais alto — Foto: Fabio Aro/Autoesporte
BYD Dolphin Mini é mais curto que os hatches compactos, mas quase 10 cm mais alto — Foto: Fabio Aro/Autoesporte

Dias antes de o Dolphin Mini chegar à nossa garagem, a Renault baixou em quase R$ 25 mil o preço do Kwid E-Tech, certamente já se antecipando ao combate que começará nas próximas semanas. Apesar de o país de origem dos dois elétricos ser o mesmo e a faixa de preço estar próxima, eles nem sequer parecem da mesma categoria. Com 3,78 metros de ponta a ponta, o BYD é 5 cm mais comprido e consideráveis 8 cm maior no entre-eixos. Também é mais potente e tem alcance 50% mais longo.

Na verdade, o Dolphin Mini se assemelha, em tamanho e formato, ao primeiro Honda Fit. A carroceria altinha, com a dianteira curta e inclinada, aproxima os dois modelos. Mas o BYD terá de superar alguns percalços. Um deles é o pequeno porta-malas de 230 litros, suficientes talvez para acomodar os instrumentos de uma dupla sertaneja. Mas sem o amplificador.

Porta-malas acomoda apenas 230 litros — Foto: Fabio Aro/Autoesporte
Porta-malas acomoda apenas 230 litros — Foto: Fabio Aro/Autoesporte

E é melhor mesmo que a banda não seja muito numerosa. Afinal, o hatch compacto só leva quatro pessoas, característica que também impede seu uso como carro de aplicativo. Na China há uma versão com cinco lugares, mas ela chegará ao Brasil somente nos proximos meses. Quando isso acontecer, ainda assim será melhor ajustar as expectativas.

Colocamos três adultos no banco traseiro: o espaço para os ombros é quase igual ao disponível nos grandes festivais de música. Para as pernas, não há reclamações. Nem nos bancos dianteiros, que parecem um camarote — pela vista elevada, pelos ajustes elétricos (só para o motorista) ou mesmo pelo conforto dos assentos revestidos com um material que lembra couro.

Volante e parte dos paineis de porta têm revestimento de material que lembra couro — Foto: Fabio Aro/Autoesporte
Volante e parte dos paineis de porta têm revestimento de material que lembra couro — Foto: Fabio Aro/Autoesporte

Acabamento surpreende

O encosto é integrado, como no Dolphin maior. Contudo, não há sensação de economia como no VW Polo Track. No restante da cabine, mistura de materiais. Mais plástico duro que no Dolphin, principalmente nas portas e no painel, mas as superfícies acolchoadas de tom azul-escuro são mais abundantes do que em qualquer outro carro dessa faixa de preço.

O visual da cabine é moderno. O encosto de braços central revestido de tecido agrega o carregador por indução na ponta — mas não há um nicho com tampa. Os dois porta-objetos ficam abaixo, um na frente, outro atrás. No centro do console, a central de 10,1 polegadas traz o grande chamariz das multimídias da BYD: tela giratória. Mais do que isso, há Android Auto (sem fio) e Apple CarPlay (por cabo), mas não o karaokê, recurso tão alardeado no Dolphin.

Central multimídia tem 10,1 polegadas e, claro, é giratória — Foto: Fabio Aro/Autoesporte
Central multimídia tem 10,1 polegadas e, claro, é giratória — Foto: Fabio Aro/Autoesporte

A tela concentra parte dos comandos do ar-condicionado, que, apesar de ter ajustes digitais, é analógico, sem função automática ou regulagem por temperatura predeterminada. Para ligar ou desligar a ventilação, basta recorrer a um dos botões posicionados logo abaixo, como no Dolphin. Ali também estão os seletores de marchas e de modos de condução, o que nos leva a dar a partida e sair com o pequeno chinês.

Como anda?

BYD Dolphin Mini levou 14,5 s para ir de 0 a 100 km/h — Foto: Fabio Aro/Autoesporte
BYD Dolphin Mini levou 14,5 s para ir de 0 a 100 km/h — Foto: Fabio Aro/Autoesporte

O silêncio a bordo é exatamente o que se espera de um carro elétrico. No entanto, ao arrancar, não sentimos a mesma “patada” proporcionada pelos modelos mais potentes. Afinal, os 75 cv são equivalentes aos de um motor 1.0 aspirado.

Considerando que o Dolphin Mini ainda carrega um pacote de baterias de 38 kWh, o peso total sobe para 1.239 kg, mais pesado que qualquer rival direto a combustão. O “lastro” ainda prejudica a relação peso/potência do elétrico chinês, fixada em 16,5 kg/cv.

Motor elétrico entrega 75 cv — Foto: Fabio Aro/Autoesporte
Motor elétrico entrega 75 cv — Foto: Fabio Aro/Autoesporte

Ao incluir os bons 13,8 kgfm de torque nessa equação, as coisas ficam um pouco melhores para o BYD. Na prática, o Dolphin Mini se comporta como um carro 1.3 aspirado. Não tem o arranque de um motor turbinado, mas também não sofre como os similares 1.0. A velocidade máxima divulgada pela fabricante é de 130 km/h. Na pista do Rota 127, levamos 14,5 segundos para ir de zero a 100 km/h. Aliás, para percorrer os cerca de 150 km entre a capital e Tatuí (SP), percebemos que o gerenciamento de bateria é um dos pontos fortes do Dolphin Mini.

E a autonomia?

Recarga lenta (6,6 kW) leva cerca de seis horas para encher a bateria do Dolphin Mini — Foto: Fabio Aro/Autoesporte
Recarga lenta (6,6 kW) leva cerca de seis horas para encher a bateria do Dolphin Mini — Foto: Fabio Aro/Autoesporte

Todo carro elétrico descarrega mais rápido a velocidades altas. Porém, conseguimos chegar à pista e fazer todos os testes sem recarregar. Antes de voltarmos, carga completa e viagem sem sustos. No otimista padrão chinês, cada ciclo permite ao pequeno hatch percorrer até 400 km. Já o Inmetro estabelece autonomia de 280 km, 50% mais do que os 185 km do Kwid E-Tech.

Usando o Dolphin Mini sem abusos, o alcance real pode bem ficar na casa dos 350 km. Autonomia, consumo de energia, porcentagem da bateria e outros dados são exibidos em um quadro de 7 polegadas. Mas o cluster não é totalmente digital. Como no Hyundai HB20, a tela colorida é menor e fica no centro. Nas pontas, visores de cristal líquido completam o computador de bordo.

Equipamentos

BYD Dolphin Mini não tem limpador no vidro traseiro — Foto: Fabio Aro/Autoesporte
BYD Dolphin Mini não tem limpador no vidro traseiro — Foto: Fabio Aro/Autoesporte

Há outras simplificações: apenas um limpador de para-brisa na frente — atrás, nenhum. Os únicos alto-falantes estão posicionados na frente e só o vidro do motorista tem fechamento com um toque. As ausências incomodam, mas não tiram o brilho da lista de equipamentos.

Há faróis de LED com acendimento automático, acesso e partida por chave presencial, rodas aro 16, freio de estacionamento eletrônico, airbags laterais e de cortina, controle de cruzeiro, câmera e sensores de estacionamento traseiros, freios a disco nas quatro rodas, navegação embarcada e um assistente pessoal cujo funcionamento é melhor que o da Mercedes-Benz.

Basta dizer “Hi, BYD, estou com frio” para o ar-condicionado subir a temperatura. Está com fome? Surgem opções de restaurantes na tela da central. O problema é que nesse (ou em qualquer outro) caminho, os ocupantes terão amplificado o desconforto ao passar por irregularidades. Buracos parecem crateras. Enquanto outros hatches superariam tranquilamente aquele obstáculo, o Dolphin Mini faz parecer que estamos em um Porsche 911 GT3 RS.

Pneus raros

Pneus do BYD Dolphin Mini são de medida inédita no Brasil — Foto: Fabio Aro/Autoesporte
Pneus do BYD Dolphin Mini são de medida inédita no Brasil — Foto: Fabio Aro/Autoesporte

Infelizmente, a suspensão do BYD parece subdimensionada para as ruas brasileiras. O fim do curso chega rápido, acompanhado de pancadas secas e saltos da traseira. Se esse acerto pune as costas, nas mudanças de direção a labirintite ataca, já que a carroceria oscila lateralmente mais do que o desejável. Ainda há uma parcela de culpa dos estreitos pneus — e aqui o problema é duplo: além de oferecer menos apoio, são de uma medida que não existe no Brasil: 175/55 R16.

A filial brasileira disse que tentou homologar o carro com pneus 185/50 R16, mas não recebeu sinal verde da matriz. A solução, segundo a marca, foi negociar um lote maior de pneus com a Linglong, única empresa homologada para fornecer pneus para o modelo.

Fora esses percalços, o Dolphin Mini é um carro divertido. Tem três modos de condução: Eco, Normal e Sport. A regeneração também pode ser ajustada em dois níveis; mesmo no intenso, é preciso acionar os freios em desacelerações intensas. A qualidade de construção surpreende para um carro desse preço. Tem vãos regulares e não há rebarbas.

Há alguns anos, era impensável um carro elétrico custar o mesmo que similares a combustão. Até por isso, o barulho feito por eles não era tão alto — talvez proporcional ao volume de vendas. Depois do lançamento do GWM Ora 03 e do próprio BYD Dolphin com preços competitivos, estamos vivendo o segundo ato da revolução dos elétricos no Brasil. O Dolphin Mini chegou mais barato que seus concorrentes diretos, amplificando em algumas vezes o coro pelos elétricos.

BYD Dolphin Mini — Foto: Fabio Aro/Autoesporte
BYD Dolphin Mini — Foto: Fabio Aro/Autoesporte

BYD Dolphin Mini

Ficha técnica
Motor: Elétrico, dianteiro, síncrono
Potência: 75 cv
Torque: 13,8 kgfm
Câmbio: Automático, uma marcha, tração dianteira
Direção: Elétrica
Suspensão: Independente, McPhersin (dianteira) e eixo de torção (traseira)
Freios: Discos ventilados (diant.) e sólidos (tras.)
Pneus: 175/55 R16
Bateria: 38 kWh
Autonomia: 280 km (Inmetro)
Tempo de recarga: 30 minutos (30% a 80% a 40 kW)
Porta-malas: 230 litros
Peso: 1.239 kg
Multimídia: 10,1 polegadas; Apple CarPlay e Android Auto
DIMENSÕES
Comprimento: 3,78 metros
Largura: 1,72 m
Altura: 1,58 m
Entre-eixos: 2,50 m

Agradecimentos especiais ao Motor Park Haras Tuiuti (@motorparkht)

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