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    Governo Trump

    Antes de muro f�sico, Trump imp�e barreira burocr�tica contra imigrantes

    MARIA SACCHETTI
    NICK MIROFF
    DO "WASHINGTON POST"

    23/11/2017 07h00

    A vis�o do presidente Donald Trump de um "grande, lindo" muro na fronteira com o M�xico talvez nunca se realize, e quase certamente n�o como uma estrutura f�sica de 3.200 km estendendo-se de um oceano ao outro.

    De uma maneira sistem�tica e menos vis�vel, entretanto, seu governo est� seguindo um plano para reduzir o n�mero de estrangeiros que vivem nos EUA —os que n�o t�m documentos e os que est�o no pa�s ilegalmente— e reformular o sistema de imigra��o dos EUA para as pr�ximas gera��es.

    Frederic J. Brown - 1.nov.2017/AFP
    Agentes da patrulha de fronteira passam em frente a prot�tipos de muro na divisa com o M�xico
    Agentes da patrulha de fronteira passam em frente a prot�tipos de muro na divisa com o M�xico

    Em todos os �rg�os e programas, as autoridades federais est�o usando seu poder executivo para montar um muro burocr�tico que poder� ser mais eficaz que qualquer um de concreto ou metal. Enquanto alguns atos atra�ram ampla aten��o, outros foram implementados mais discretamente.

    O governo se moveu para cortar o n�mero de refugiados, acelerar as deporta��es e encerrar a resid�ncia provis�ria de mais de um milh�o de pessoas, entre outras medidas.

    Na segunda-feira (20), o Departamento de Seguran�a Interna disse que quase 60 mil haitianos autorizados a ficar nos EUA depois do terremoto devastador em seu pa�s em 2010 t�m at� julho de 2019 para sair ou obter outra forma de situa��o legal.

    "Ele est� construindo um muro virtual com seus atos e sua ret�rica", disse Kevin Appleby, diretor de pol�ticas migrat�rias no Centro de Estudos da Migra��o, um grupo de pensadores sem fins lucrativos.

    Membros do governo Trump dizem que est�o simplesmente aplicando leis que seus antecessores n�o aplicaram e preservando os empregos dos americanos. Governos republicanos e democr�ticos anteriores foram brandos demais na aplica��o da lei, dizem eles, e tiveram uma vis�o muito cor-de-rosa da imigra��o como uma for�a claramente positiva.

    "Durante d�cadas, a popula��o americana vem pedindo e suplicando a nossas autoridades eleitas por um sistema de imigra��o que seja legal e sirva ao interesse nacional", disse o secret�rio da Justi�a, Jeff Sessions, em Austin (Texas) no m�s passado. "Agora temos um presidente que apoia isso."

    Bob Dane, diretor-executivo da Federa��o para Reforma da Imigra��o Americana, que pressionou a favor de v�rias metas do governo Trump sobre imigra��o, disse que o presidente "realmente deu marcha a r� nessa vis�o expansiva da imigra��o que ocorreu no governo Obama".

    As novas restri��es poder�o reduzir significativamente o n�mero de trabalhadores nascidos no estrangeiro na for�a de trabalho dos EUA, mas especialistas em demografia dizem que h� pequena probabilidade de que elas alterem a transforma��o racial e �tnica do pa�s, que, segundo os cr�ticos de Trump, � seu objetivo.

    As proje��es do Censo mostram que em meados deste s�culo os EUA n�o ter�o mais uma �nica maioria racial ou �tnica, segundo o Centro de Pesquisas Pew.

    No entanto, ao erguer obst�culos mais r�gidos e elevados para os estrangeiros que buscam se mudar para os EUA ou continuar no pa�s depois de chegar ilegalmente, a Casa Branca est� tentando fazer o pa�s retornar aos controles mais r�gidos da imigra��o em vigor antes dos anos 1960.

    "Dentro do governo h� v�rios atores chaves que est�o apenas procurando qualquer oportunidade, qualquer programa, cada margem regulat�ria ou administrativa que exista para restringir a entrada nos EUA", disse Linda Hartke, presidente e executiva-chefe do Servi�o Luterano de Imigra��o e Refugiados, que reassenta refugiados.

    REFORMA BUROCR�TICA

    Mesmo enquanto combate ordens judiciais que tentam conter partes da agenda migrat�ria de Trump, Sessions, o assessor da Casa Branca Stephen Miller e outros atores chaves est�o encontrando maneiras de encolher o sistema de imigra��o.

    Miller foi assessor de Sessions antes que os dois entrassem para o governo; em menos de um ano, suas prescri��es de pol�ticas de imigra��o passaram do reino das listas de desejos a ordens executivas da Casa Branca.

    Em outubro, a Casa Branca —em um plano liderado por Miller— disse que havia conduzido uma "revis�o de baixo para cima de todas as pol�ticas de imigra��o" e descobriu "brechas perigosas, leis antiquadas e vulnerabilidades facilmente exploradas em nosso sistema de imigra��o —pol�ticas atuais que est�o prejudicando nosso pa�s e nossas comunidades".

    Trump endossou a legisla��o do Partido Republicano para cortar a imigra��o legal anual pela metade, reduzindo o n�mero de "green cards" emitidos anualmente de cerca de 1 milh�o para 500 mil. Mais peso seria dado aos imigrantes com qualifica��o profissional, em oposi��o aos que t�m parentes nos EUA.

    O presidente cortou o n�mero de refugiados que os EUA se disp�em a aceitar anualmente de 110 mil para 45 mil, o n�vel mais baixo desde 1980, e ordenou a implementa��o de um sistema demorado de "sele��o extrema" que poder� diminuir em muito o n�mero de refugiados aprovados a cada ano. Em outubro, 1.242 refugiados chegaram aos EUA, contra 9.945 em outubro de 2016.

    Trump tamb�m eliminou um programa menor especificamente para refugiados que fugiam da viol�ncia na Am�rica Central. O Pent�gono, citando preocupa��es sobre a sele��o, suspendeu um programa de recrutamento que oferecia a estrangeiros capacitados uma via r�pida para a cidadania se servissem nas For�as Armadas.

    Muzaffar Chishti, diretor do Instituto de Pol�tica Migrat�ria na faculdade de direito da Universidade de Nova York, disse que quase 350 mil rec�m-chegados legalmente aos EUA por ano s�o c�njuges e filhos menores de cidad�os americanos e residentes permanentes.

    J� que barrar essas chegadas n�o entra em considera��o, segundo Chishti, o governo teria de eliminar ou reduzir acentuadamente quase todos os outros meios de entrada para reduzir o n�mero anual de imigrantes para 500 mil.

    Al�m da decis�o desta semana sobre os haitianos, o governo se recusou neste m�s a renovar a Situa��o de Protegido Tempor�rio, uma esp�cie de resid�ncia provis�ria, para cerca de 2.500 nicaraguenses.

    O Departamento de Estado diz que as condi��es na Am�rica Central e no Haiti que foram usadas para justificar a prote��o durante at� duas d�cadas n�o exigem mais uma prorroga��o. Decis�es est�o pendentes sobre mais de 250 mil hondurenhos e salvadorenhos com permiss�o de resid�ncia provis�ria.

    Trump tamb�m est� encerrando o Programa de A��o Retardada para Chegadas de Crian�as (Daca, na sigla em ingl�s), do governo Obama, que concedeu permiss�o de trabalho para 690 mil jovens imigrantes trazidos para os EUA quando crian�as.

    O governo est� expandindo os tribunais de imigra��o e centros de deten��o e intensificou as deporta��es do interior dos EUA, onde milh�es de imigrantes sem documentos com filhos nascidos nos EUA e sem hist�rico criminal grave tinham pouco medo de serem expulsos sob o presidente Barack Obama.

    As deten��es pela Ag�ncia de Imigra��o e Alf�ndega (ICE, na sigla em ingl�s) aumentaram mais de 40% neste ano, e o �rg�o quer mais que duplicar seus membros at� 2023, segundo uma nota de contrata��o federal publicada neste m�s.

    A ICE est� pedindo um grande aumento das verifica��es em locais de trabalho e assinou mais de 20 acordos com governos locais e estaduais que querem ajudar a prender e deter moradores sem documentos.

    "Se voc� est� neste pa�s ilegalmente e cometeu um crime ao entrar no pa�s, voc� deve se sentir desconfort�vel", disse a legisladores neste ano Thomas Homan, a principal autoridade do ICE. "Voc�s devem olhar por cima do ombro. E devem se preocupar."

    O presidente e seus assessores fizeram press�o apesar da rea��o veemente de defensores e legisladores democratas, que em Estados como Calif�rnia e Illinois instru�ram a pol�cia e autoridades p�blicas a evitar a coopera��o com a ICE. O governo Trump amea�ou privar essas jurisdi��es "santu�rios" de verbas federais, em um impasse jur�dico cada vez maior.

    M�O DE OBRA

    O discurso duro de Trump por si s� parece ser um dos melhores baluartes do governo: as travessias ilegais na fronteira com o M�xico despencaram para seu n�vel mais baixo em 45 anos, e agentes dos EUA est�o apanhando uma porcentagem muito maior de pessoas que tentam entrar ilegalmente.

    As solicita��es para vistos qualificados H-1B e matr�culas para novos estudantes estrangeiros tamb�m diminu�ram.

    William Frey, um dem�grafo no Instituto Brookings, disse que at� agora os �ndices de imigra��o nos EUA pouparam amplamente o pa�s dos desafios que enfrentam pa�ses industriais avan�ados como o Jap�o e a Alemanha, que n�o conseguem substituir os trabalhadores envelhecidos com rapidez suficiente.

    Ao cortar a imigra��o, disse Frey, o pa�s poder� acabar com escassez de m�o de obra e outros problemas de disponibilidade de for�a de trabalho.

    Mas embora alguns dos mais fervorosos apoiadores de Trump vejam a conten��o da imigra��o como uma maneira de reverter a r�pida transforma��o racial e �tnica dos EUA, Frey disse que � uma meta irrealista.

    Em 2020, as proje��es do Censo mostram que as minorias v�o representar mais da metade da popula��o menor de 18 anos, por causa das taxas de nascimento mais altas em popula��es n�o brancas.

    E at� 2026 o n�mero estimado de brancos dever� come�ar a diminuir em n�meros absolutos, disse ele, conforme as mortes superarem os nascimentos.

    "Voc� pode desacelerar o ritmo da imigra��o de latino-americanos, mas isso n�o tornar� a popula��o mais branca", disse Frey. "Apenas a tornar� menos branca em um ritmo mais lento."

    Trump continua insistindo que seu governo construir� um muro na fronteira, apesar do custo exorbitante projetado e de autoridades do Departamento de Seguran�a Dom�stica dizerem que uma estrutura de 3.200 km � impratic�vel.

    Seus apoiadores dizem admirar o presidente por seguir adiante em seus esfor�os de reorganiza��o e veem uma mudan�a hist�rica e geracional a caminho.

    "H� mais de uma maneira de se alcan�ar o objetivo", disse Dane. "As solu��es legislativas s�o �timas, mas o governo claramente fez coisas nos bastidores... Os resultados foram dram�ticos."

    Tradu��o de LUIZ ROBERTO MENDES GON�ALVES

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