Descrição de chapéu Europa Guerra da Ucrânia

Europa faz maior expedição aérea contra China e Rússia no Pacífico

Alemanha, França e Espanha unem 48 aviões em 5 exercícios militares do Alasca à Índia

São Paulo

Em uma demonstração de força para os aliados China e Rússia, três países europeus montaram a maior expedição aérea de sua história para atuar em cinco diferentes exercícios militares no Indo-Pacífico, o foco estratégico de Pequim na Guerra Fria 2.0 com os Estados Unidos.

Alemanha, França e Espanha mobilizaram 48 aeronaves, entre caças, aviões de transporte, reabastecimento aéreo e helicópteros, para uma jornada de 58 mil km que começou no dia 27 de junho e se estenderá até 15 de agosto.

Silhueta no céu cinzento mostra quatro aviões menores em torno de um maior, com quatro motores
Dois Eurofighter (esq.), um A400M (centro) e dois Tornado (dir.) da Força Aérea alemã, que irão participar do Pacific Skies, sobrevoam navio que deixava o porto de Wilhelmshaven rumo ao Pacífico - Focke Strangmann - 7.mai.2024/AFP

É a missão Pacific Skies (céus do Pacífico, em inglês), que também é o primeiro teste de ação integrada do programa FCAS (Sistema de Combate Aéreo do Futuro). A iniciativa une os três países no desenvolvimento de um caça da chamada sexta geração e de drones que serão comandados a partir dele, previstos para entrar em operação na década de 2040.

Do ponto de vista político, esta é também uma resposta europeia ao temor de que uma eventual vitória de Donald Trump na eleição americana afete novamente as relações transatlânticas. Quando esteve no poder, de 2017 a 2021, o republicano deixou às moscas a Otan, aliança que os EUA lideram e que terá sua cúpula anual a partir da próxima terça (9).

Ao escolher o Indo-Pacífico para seu show, a trinca europeia busca mostrar que não está presa apenas à grave crise de segurança que a Guerra da Ucrânia trouxe às suas fronteiras, mas de olho no grande jogo do século 21, a rivalidade entre o Ocidente liderado pelos EUA e a China, que traz os russos e seu enorme arsenal nuclear a tiracolo.

Por óbvio, há limites à pretensão, e eles começam pelo bolso. Os EUA, maior potência militar da história, despendem 70% do total de gasto com defesa da Otan, que une Washington ao Canadá e a 31 países europeus. Suas capacidades expedicionárias são inigualáveis.

A ideia da operação conjunta é, assim, também econômica, unindo tanto forças quanto orçamentos em missões futuras.

Para tanto, o trio montou um circo respeitável. A Alemanha traz 12 aviões de ataque Tornado, 8 caças Eurofighter, 4 aviões de transporte pesado A400M, 4 helicópteros H145 e 3 aviões-tanque A330-MRTT, esses da força europeia de reabastecimento. A França emprega 4 caças Rafale, 3 A400M e 3 A330-MRTT. Os espanhóis, sócios minoritários do grupo, vêm com 4 Eurofighter, 2 A400M e 1 A330 de transporte de pessoal.

A ação começa nesta segunda (8) sobre o maior campo de provas militares do mundo, no Alasca. O exercício Arctic Defender, liderado pelos EUA, irá treinar defesa de área e ataques de precisão ao solo —função dos Tornado alemães em sua despedida de viagens internacionais, já que serão substituídos na missão de ataque com bombas nucleares táticas pelo F-35.

Nesta primeira etapa, que vai até o dia 18, participarão 60 aviões e 500 militares americanos. De lá, o grupo segue para o Japão para participar do Nippon Skies, na primeira vez em que caças alemães irão treinar lado a lado com seus antigos aliados derrotados na Segunda Guerra Mundial (1939-1945).

Parte do contingente alemão, contudo, irá se separar para integrar as manobras anuais da Marinha americana no Havaí, o Rimpac.

Depois do exercício japonês, o grupo irá para a Austrália, aliada fundamental dos EUA no Pacífico, para o exercício Pitch Black. Por fim, as frotas alemã e francesa irão de lá para a Índia, onde a capaz Força Aérea local liderará a simulação Tarang Shakti.

Ali, os Rafale e Eurofighter terão oportunidade de enfrentar os caças russos Sukhoi Su-30 da Índia, país que mantém excelente relação com a Rússia, mas é adversária estratégica da China na Ásia —apenas um exemplo das complexas camadas que compõem a nova Guerra Fria.

Haverá dois eventos paralelos ao Pacific Skies: uma visita dos A400M alemães à Nova Zelândia e uma segunda frota, composta por 3 Rafale, 3 A330-MRTT e 3 A400M da França, que participará de um outro exercício australiano, o Griffith Strike, com um grupo de aviação britânico.

O Pacific Skies, como se vê, envolve os rivais diretos de China e Rússia no ambiente global. Desde que firmaram sua "amizade sem limites", 20 dias antes da invasão da Ucrânia, em fevereiro de 2022, Vladimir Putin e Xi Jinping escalaram suas operações militares conjuntas.

Patrulhas de bombardeiros e manobras navais de ambos são uma constante, e nesta semana China e Rússia lançaram mais uma ação de suas forças com embarcações no Pacífico.

Para os europeus, é um ensaio da tentativa de colocar de pé o novo sistema de armas. Até aqui, a indústria europeia de aviação militar se dividia entre os franceses (que têm o Rafale como principal produto hoje), consórcios europeus (Eurofighter) e os suecos (o Gripen, comprado pelo Brasil).

A inundação do mercado por caças F-35, da chamada quinta geração, furtivos a radares, travou esse nicho para os europeus. Restou a eles somarem força para a próxima etapa da evolução dos caças. O papel da Suécia é incerto, e analistas creem que ela só decidirá entre seguir com um avião próprio ou se unir aos parceiros da Otan à qual acaba de se unir na próxima década.

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