Lira acelera votação da reforma, anima o mercado, mas deixa setores apreensivos

Medicamentos, saneamento, alimentos, mineração e petróleo são alguns dos setores que atuam fortemente nos bastidores

Brasília

O presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira (PP-AL), acelerou a tramitação da regulamentação da reforma tributária na Casa às vésperas do recesso parlamentar. Numa tentativa de realizar uma força-tarefa para analisar os projetos de lei, Lira suspendeu as reuniões das comissões temáticas da Casa até quinta-feira (11) e pautou para esta terça (9) a votação em plenário do requerimento de urgência do primeiro texto enviado pelo Executivo.

O requerimento foi aprovado por 322 votos favoráveis e 137 contrários, além de três abstenções. Agora, os deputados deverão apreciar o mérito da proposta no plenário da Casa na quarta-feira (10), com sessão começando pela manhã e se estendendo ao longo do dia. A iniciativa gerou incômodo em deputados, que se queixaram à reportagem pela velocidade da tramitação de uma matéria considerada complexa.

O movimento de Lira, no entanto, teve respaldo do governo federal. Na terça, o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, se reuniu com o presidente da Casa e lideranças partidárias para apresentar cálculos do impacto das mudanças no projeto na alíquota média de referência dos novos impostos.

O presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira (PP-AL)
O presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira (PP-AL)

A regulamentação da reforma tributária é considerada a principal prioridade do Executivo na Câmara neste semestre. O governo também tem pressa para aprovar esse tema num momento em que o mercado sinaliza positivamente ao andamento da reforma tributária.

Além da aposta em corte de juro em setembro nos Estados Unidos e melhora do ambiente fiscal, depois que o presidente Lula assumiu compromisso com o arcabouço fiscal, fortalecendo Haddad, a aceleração da votação da reforma animou o mercado financeiro.

Para os analistas, é importante o andamento da agenda de reformas que terão impacto no crescimento do país.

Na véspera da votação, a Câmara ficou repleta de lobistas de setores apreensivos com o risco de não terem sido atendidos, mas também com esperança de emplacar ainda mudanças no parecer final que será levado à votação do plenário. Outros querem se certificar de que foi decidido no parecer inicial seja mantido.

Assim como ocorreu na tramitação da PEC (proposta de emenda à Constituição) da reforma tributária na Câmara no ano passado, a expectativa é que os pontos considerados polêmicos sejam resolvidos no momento em que o texto for discutido no plenário.

A inclusão das carnes na cesta básica nacional com imposto zero é o mais polêmico, mas outros pleitos, se atendidos, podem ter impacto na alíquota média do IBS e CBS de 26,5%, calculada pela Fazenda com base no projeto do Executivo que foi enviado ao Congresso.

O valor da alíquota segue indefinido e foi o principal tema da reunião de líderes com Haddad nesta terça. Lira indicou que vai calibrar as alterações finais com base no impacto da alíquota.

Setores de medicamentos, saneamento, alimentos, mineração, petróleo, automóveis elétricos, armas de fogo, construção civil, livros, igrejas, bets (jogos de azar) e refrigerantes atuam fortemente nos bastidores.

Por outro lado, outros setores querem garantir o texto do primeiro parecer do grupo de trabalho, divulgado na semana passada. É o caso da indústria de armas, que ficou fora da lista dos produtos que terão incidência do Imposto Seletivo, mas seguem ameaçados. As montadoras do Nordeste também querem manter o texto do relatório, que ampliou os benefícios concedidos a elas.

Os setores que garantiram a imunidade tributária (não pagam o imposto) na emenda constitucional, como as igrejas, pressionam para recuperar os créditos das cadeias anteriores. É o caso também da indústria do livro.

Técnicos do governo estão sem dormir fazendo as contas a pedido do grupo de trabalho da regulamentação da forma e seguem sem saber até agora qual será o impacto da alíquota. O primeiro parecer praticamente não alterou a alíquota média porque a flexibilização das regras para a construção (a com maior impacto) foi compensada pela inclusão dos jogos de azar (bets) e dos carros elétricos no IS, mais conhecido como imposto do pecado.

O setor de medicamentos é uma dos mais inquietos na expectativa de conseguir mudanças nesta reta final da votação na Câmara. Cinco entidades do setor (Acessa, Alanac, Febrafar, Grupo FarmaBrasil e PróGenéricos) fazem uma ofensiva na Câmara para garantir alíquota reduzida para todos os medicamentos.

A proposta é que haja duas faixas apenas de alíquota: desconto de 60% e 100% (zero). Eles querem eliminar a lista do projeto que contém medicamento com pagamento integral (alíquota cheia), sem desconto. Pelos cálculos do setor, o projeto deixa de contemplar 56% dos medicamentos, principalmente aqueles de uso popular, como antigripais e para o tratamento da diabetes.

"Estamos num processo de aguardar o que vai sair. A causa é muito justa. Estamos conversando com os líderes", disse à Folha o presidente do Grupo Farma Brasil, Reginaldo Arcuri.

O presidente do IBP (Instituto Brasileiro de Petróleo e Gás), Roberto Ardenghy, também conta com mudanças no projeto para garantir que ele seja aprovado prevendo alíquota zero do imposto do pecado, garantindo também que não haja tributação das exportações.

Ele considera que a inclusão do petróleo e mineração na lista do IS é um ponto fora da curva da reforma. "É uma maneira equivocada de se tratar o imposto seletivo, que, por definição, em todos os lugares do mundo, inclusive no Brasil, no passado, sempre foi [cobrado] no consumidor final. É o sujeito que vai comprar um maço de cigarro ou vai beber uma dose de alguma bebida alcoólica e ele vai pagar, como consumidor final, aquela onerosidade por um hábito que a gente quer desestimular", disse.

Para o setor, a cobrança é inconstitucional e, se aprovada, vai levar à judicialização da reforma. " Tem também outro efeito negativo. Ele é inflacionário e vai diminuir a competitividade do Brasil, porque o petróleo brasileiro vai ficar mais caro e ainda vai reduzir a arrecadação dos estados e municípios", diz ele.

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