Atrevido, Merquior foi uma figura central
Quando conheci Merquior, em 1969, ele era um jovem secret�rio de embaixada em Paris. Diplomata formado no per�odo democr�tico, anterior ao golpe, ele n�o se curvava �s restri��es impostas pela ditadura e tratava de manter a amizade e a conversa com intelectuais de esquerda, com os quais tinha interesses e bibliografia em comum. No ambiente policial que reinava, essa independ�ncia, certamente honrosa, requeria alguma coragem.
Com o tempo, Merquior evoluiu para o ataque � esquerda, cujas ideias entretanto o interessavam vivamente, levando-o a posi��es paradoxais. Assim, em plena ditadura, ele publicou um panorama das posi��es est�tico-sociais de Marcuse, Benjamin e Adorno, cheio de assuntos avan�ados, que para os militares seriam tabu. Era um atrevimento, mas um atrevimento com cobertura, pois a tese do trabalho era de que esses autores representavam o atraso, bem ao contr�rio de Heidegger –o que salvo engano invertia tudo.
Com estrat�gia parecida, sempre em nome da raz�o, Merquior polemizava contra o marxismo, a psican�lise e a arte moderna, numa esp�cie de cr�tica ao pensamento cr�tico e � negatividade, ou seja, a tudo que apontasse para al�m da ordem burguesa. Resultava da� uma esp�cie desconcertante de guerrilha a favor do establishment, ou de conformismo combativo.
A massa de refer�ncias art�sticas, te�ricas e hist�ricas que Merquior mobilizava em seus estudos fazia dele um caso � parte em nossa cr�tica. N�o est�vamos acostumados a ver os nossos autores submetidos a uma reflex�o t�o numerosa e cosmopolita.
Pode ser que houvesse alguma despropor��o entre esse aparato conceitual imponente e os resultados da an�lise, mas n�o h� d�vida de que a leitura da cr�tica de Merquior ajudava e de que ele foi uma das figuras centrais de minha gera��o.
Dito isso, a literatura e as ideias para ele contavam mais que o resto. A sua conversa inesgot�vel, sempre interessante e civilizada, que jorrava como uma for�a da natureza, era um espet�culo memor�vel.
ROBERTO SCHWARZ, 76, � cr�tico liter�rio e escritor, autor de "A Lata de Lixo da Hist�ria" (Companhia das Letras).
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