Era uma vez, em um reino não tão distante, na cidade do Rio de Janeiro, uma jovem mulher que não usava tiara nem tinha pais importantes, mas, quando saía de casa, era abordada por homens desconhecidos que a chamavam de princesa.
Costumava agradecer ao suposto elogio —que preferia chamar de assédio— mostrando o dedo do meio, ainda que o gesto lhe parecesse um tanto falocêntrico. Sim, nossa mocinha era feminista e lutava por um mundo em que mulheres pudessem passear sozinhas no bosque sem se sentir ameaçadas.
Até que, certa noite, num karaokê, ela se arriscou a cantar uma música da Kate Bush, quase estourou os copos sujos do estabelecimento, e chamou a atenção de um rapaz que em nada parecia um príncipe. Ele não enalteceu seus atributos físicos, não tentou beijá-la quando ela estava quase inconsciente de tanto beber cachaça de jambu, nem a perseguiu quando ela decidiu ir embora.
Era o início de uma história de amor. Mas nossa antiprincesa estava decidida a vivê-la sem abrir mão de sua individualidade. O que ela não sabia é que estava prestes a protagonizar uma releitura contemporânea do mais abominável dos contos de fada, "A Bela e a Fera".
Ele era avesso a redes sociais, o que parecia extremamente sexy em meio à surra de selfies e superexposição à qual ela estava acostumada. Mas uma simples busca no Google foi suficiente para desconstruir o tal desconstruído. E assim ela descobriu que seu grande amor era... Cancelado. Um desabafo publicado pela ex-namorada dele sobre a relação abusiva que os dois tiveram repercutiu entre mulheres que viveram situações semelhantes.
Ele tentou se justificar. Disse que sua ex sofria de transtornos psicológicos (o famoso conto da "ex louca"). Que não era mais aquele cara de outrora (o famoso conto do "juro que vou mudar"). E implorou para que ela não desistisse de uma relação tão especial (o famoso conto do "você não vai encontrar nada melhor").
Mesmo sem acreditar em contos de fadas, ela sabia que era mais provável reverter a maldição de uma bruxa do que um cancelamento. E eles não foram felizes para sempre.
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