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estresse (Foto: Ilustração Ivana Cruz)

O estresse é contagioso? (Foto: Ilustração Ivana Cruz)

Eu consigo detectar o estresse do meu marido na maneira como ele anda; a raiva da minha filha, de nove anos, em suas reclamações e gemidos baixos e duradouros. Em questão de minutos, essa tensão superficial faz meu maxilar cerrar. Hoje em dia, as emoções voam em torno de nossa casa como um jogo rápido de pingue-pongue – e absorver o mau humor de uma pessoa e depois descontar essa energia negativa em outra é facílimo.

Com a pandemia nos forçando a ficar em um ambiente fechado, a ameaça de absorver o estresse alheio – seja de membros da família, colegas de quarto ou até mesmo de interações sociais online – parece sempre presente. Fiquei grata em saber que esse espiral não está só na minha cabeça – é, na verdade, comprovado pela ciência: muitas evidências mostram que o estresse é uma forma do chamado "contágio emocional" e pode, de fato, se espalhar entre os membros de um grupo rapidamente e ter um efeito prolongado que dura horas, até dias.

“Naturalmente e inconscientemente nós captamos as emoções de outras pessoas, da mesma maneira como podemos pegar um resfriado”, diz Laurie Santos, Ph.D., cientista cognitiva e professora de psicologia na Universidade de Yale, à frente do podcast The Happiness Lab. “Somos muito mais afetados pelas pessoas ao nosso redor do que podemos imaginar, em termos de comportamentos e hábitos”.

A pesquisa mostra que observar as pessoas passando por momentos estressantes – como fazer uma apresentação ou uma conta matemática de cabeça na frente de outras pessoas – pode aumentar a frequência cardíaca e os níveis de cortisol dos observadores, diz Tony Buchanan, Ph.D., co diretor do programa de neurociência na Saint Louis University. Buchanan ajudou a desenvolver um paradigma de pesquisa, o Emphatic Trier Social Stress Test, para ilustrar este fenômeno. O efeito cascata, diz ele, está programado em nossa biologia para a sobrevivência. “Em animais que vivem em grupos, como os humanos, suas chances de sobrevivência são maiores se você prestar atenção ao estresse dos outros, como um sinal de alerta de perigo, e mobilizar recursos internos para fazer seus músculos trabalharem para fugir dessa situação”, ele explica.

Hoje, a ameaça de ser comido por um predador praticamente não existe, mas ainda captamos esses sinais – mesmo que de maneiras muito sutis. Jaideep Bains, Ph.D., professor de fisiologia e pesquisador do laboratório Stressynomics da University of Calgary, no Canadá, descobriu que ratos estressados emitem um odor, um "feromônio de alarme", que é detectado por outros ratos, o que poderia explicar o caminho do contágio emocional em nós também. “Os circuitos do cérebro que respondem ao estresse são semelhantes em ratos e humanos”, diz ele. Curiosamente, nossos mecanismos de enfrentamento podem diferir por sexo – em um estudo em que ratos fêmeas compartilharam seu estresse com um parceiro, seus níveis de estresse diminuíram, mas o mesmo não aconteceu com ratos machos. Conclusão: os métodos calmantes não são universais – o que funciona para você pode não confortar os outros.

Na minha casa, o tempo de tela e passeio pelo feed do Instagram costuma ser uma fuga de vibrações negativas, mas as interações virtuais também podem provocar uma resposta ao estresse, afirma Stephanie Dimitroff, Ph.D, pesquisadora de neuropsicologia na clínica da Universidade de Konstanz, na Alemanha. Em um estudo de 2017, Dimitroff recrutou voluntários em idade universitária, conectou-os a monitores de eletrocardiograma e os fez assistir a uma série de vídeos de pessoas passando por diferentes níveis de estresse. “A frequência cardíaca dos observadores mudou com base no nível de estresse dos vídeos, e aumentou rapidamente em pessoas que tinham um alto nível de empatia afetiva – ou a capacidade de sentir automaticamente as emoções das pessoas ao seu redor”, diz ela. Isso pode explicar por que assistir ao noticiário induz muitos ao pânico, e a exposição às telas não-opcionais, como sentar-se por horas em reuniões no Zooms com colegas de trabalho angustiados, também pode deixá-lo tenso.

Surpreendentemente, Dimitroff insiste que absorver o estresse dos outros pode ser uma coisa boa. “É a base para a empatia e, sem contágio emocional, seria mais difícil nos colocarmos no lugar do outro”, enfatiza. Ainda assim, a pesquisadora faz a distinção entre estresse agudo – aquelas chatices temporárias, como ficar preso no trânsito ou falhar em um teste – e estresse crônico a longo prazo, que pode durar meses e ter efeitos prejudiciais à saúde. Independentemente do tipo de estresse, ela diz: “Não há cura mágica, infelizmente, mas existem algumas técnicas que surtiram efeitos benéficos”. Começando com esta: reformule a situação. “Reconheça que o estresse não é uma falha, ele existe por uma razão evolutiva”, diz Dimitroff. “E se você está propenso ao contágio de estresse, é provável que capte todas as emoções dos outros, incluindo a felicidade".

Aqui, mais estratégias cientificamente comprovadas para não se tornar imune ao estresse alheio, mas aprender a lidar com ele, para que você possa se recuperar e interromper a propagação do sentimento no seu círculo social.

Dê um passo para trás
As mudanças cerebrais podem ser detectadas quase instantaneamente quando o corpo é exposto ao estresse e, dependendo do contexto, os efeitos podem "durar de minutos a dias se você for continuamente exposto", diz Buchanan. Quando você não consegue se afastar da fonte estressante (oi, filhos e parceiros), “experimente uma técnica de terapia cognitivo-comportamental e veja o estresse como um desafio a ser superado, em vez de uma ameaça pessoal”, diz Buchanan. É semelhante ao desapego compassivo – você pode ser gentil, atencioso e respeitoso, mas traçar uma linha na hora de se tornar emocionalmente envolvido em consertar coisas que estão além do seu controle.

A ajuda da respiração
“Acho que mais do que nunca estamos lidando com uma quantidade de estresse sem precedentes”, diz Maryam Ajayi, curandeira energética baseada em Los Angeles e fundadora da Dive In Well. Sua estratégia: “Quando me sinto ansiosa, me pergunto se o que estou sentindo é meu estresse ou de outra pessoa”. Isso geralmente cria um amortecedor mental e, a partir daí, ela se debruça na respiração para acalmar seu sistema nervoso, focando especialmente no método da caixa: inspire lentamente por quatro contagens, prenda a respiração por quatro contagens e depois expire contando até quatro. “Faça isso por quatro minutos”, diz Ajayi, que também está lançando uma associação de respiração online neste mês.

Acalme-se
O estresse do observador pode mexer com nosso cérebro da mesma forma que o estresse primário – ele altera os neurônios do hormônio liberador de corticotropina, que controlam a liberação de cortisol, entre outras ações, diz Bains. Para neutralizar essa reação, considere exercícios físicos, que podem ter efeitos positivos no cérebro. É importante ressaltar, porém, que a atividade deve ser prazerosa, diz Bains. “Caso contrário, é um exercício forçado e isso pode exacerbar o estresse em vez de minimizá-lo”. Quer você corra, pule ou dance, mantenha a diversão em primeiro lugar invés de se concentrar demais em métricas como quilômetros corridos ou calorias gastas.

Pratique uma boa higiene emocional
Ligar ou enviar mensagens de texto para um amigo para desabafar pode ser bom no momento, mas também passa seu estresse para o receptor. Em vez disso, Ajayi prefere o diário como uma forma saudável de liberação. “Eu faço algumas páginas todas as manhãs – não precisa ser poético, apenas fluxos de consciência fluindo livremente. Deixe todas as suas emoções virem à tona”. Em seguida, feche o livro e prossiga com o dia. Também útil: faça anotações de coisas pelas quais você se sente grato, para mudar sua perspectiva. “É um alicerce nestes tempos estressantes”, diz Ajayi.

Aumente o seu sistema imunológico emocional
Não podemos ficar calmos diante da tensão se já estivermos exaustos, diz Ajayi. Quando você atender às suas necessidades primeiro, se tornará mais resistente e menos propenso a reagir aos gatilhos de estresse dos outros. Faça o que quer que seja para se acalmar: Ajayi investe em caminhadas simples, mas eficazes, para limpar a cabeça e tomar um banho noturno: “Adoro encher a banheira com sais de Epsom, óleos essenciais e flores. O ritual me enche de força e limpa meu corpo de tudo que não serve mais”.