• Alice Coy
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Look da linha Tommy Adaptive (Foto: Divulgação)

Look da linha Tommy Adaptive (Foto: Divulgação)

Notório por seu tino de negócios, Tommy Hilfiger começou seu império com US$ 150, mas não é apenas o business que o move. Pai de três filhos com espectro autista, sua marca é hoje a maior referência em moda adaptável e inclusiva entre os grandes players do mercado, justamente por ele ter visto de perto a dificuldade que membros de sua família encontravam ao se vestir. A Tommy Adaptive, lançada em 2016, desembarca agora no Brasil com as linhas feminina e masculina disponíveis no e-commerce da label. “Sempre foi o meu sonho construir uma grife global da qual todos possam fazer parte. Tenho conhecimento de causa de como é difícil para algumas pessoas com deficiência se vestirem. A moda é sobre a autoexpressão, e ninguém deveria ficar de fora dessa experiência”, diz o sr. Hilfiger em entrevista por videoconferência.

O design adaptativo, que ajusta as modelagens das roupas para PCDs, tem um valor de mercado potencial de US$ 64,3 bilhões, de acordo com a Coresight Research, mas que segue pouco explorado. “Eu queria que outras grifes seguissem os nossos passos, mas isso tem acontecido de maneira muito devagar, o que para mim é incompreensível. Não sei por que mais labels não estão se juntando a nós.” As modificações precisam ser diversas e específicas para considerar a ampla gama de necessidades, desde as sensibilidades vivenciadas com um cliente com autismo, até a especificidade de uma pessoa com paraplegia. Pesquisas e muito feedback de usuários são cruciais no processo. Uma calça para um cadeirante, por exemplo, precisa levar em conta o posicionamento de costuras e bolsos para garantir o conforto e a facilidade de movimento. Zíperes que podem ser acionados com uma única mão, botões magnéticos e fechamentos com velcro são alterações a serem consideradas. Quando o sr. Hilfiger entrou neste mercado, ele era ocupado basicamente por marcas de roupas funcionais e terapêuticas, pensadas sobretudo para idosos. “Desde que lançamos, seguimos aumentando a oferta de produtos e oferecendo designs mais alinhados com as tendências. Começamos com básicos, mas esses consumidores também querem roupas fashion.”

Manter a estética da label nas peças adaptadas é uma prioridade inabalável, ele garante. “Não queremos que as pessoas saibam que há uma diferença. É importante ter a mesma qualidade, as mesmas cores, o mesmo design. Eu sei que as pessoas querem sair na rua sem chamar atenção para si, querem usar as mesmas roupas que os seus amigos. Existem tribos na moda – as pessoas do streetwear, as do athleisure, quem só quer usar jeans. Há diferentes grupos e é importante que quem tem deficiência possa estar em qualquer turma que quiser.”

Look da linha Tommy Adaptive (Foto: Divulgação)

Look da linha Tommy Adaptive (Foto: Divulgação)

O MERCADO PCD
No Brasil, há 45 milhões de pessoas (24% da população) com algum tipo de deficiência (algum grau de dificuldade para enxergar, ouvir, caminhar, subir degraus ou deficiência mental/ intelectual), enquanto 12,5 milhões de brasileiros (6,7% da população) possuem grande ou total dificuldade nestas habilidades, de acordo com um levantamento do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) de 2010. Além disso, dados da Subsecretaria de Inspeção do Trabalho, do Ministério da Economia, divulgados em 2021, apontam que o número de PCDs no mercado de trabalho é de cerca de 372 mil, um aumento de 14,11% em relação às vagas ocupadas por este público em 2015, que somavam pouco mais de 326 mil. Mas a percepção é de que este grupo que trabalha e que possui poder de compra ainda passa despercebido pelo mercado. Em termos globais, segundo estimativa do Banco Mundial, 15% da população (aproximadamente 1 bilhão de indivíduos) possui alguma forma de deficiência.

Paulo Matos, diretor da Tommy Hilfiger no Brasil, afirma que, com o lançamento da linha Adaptive no país, não buscam um crescimento agressivo ou lucros, mas sim olhar e atender esse cliente e suas necessidades para que ele seja de fato incluído na moda. A princípio projetam vender 25 peças por mês, número que deve aumentar quando alcançarem reconhecimento entre o público-alvo.

Um ponto importante neste debate é que o capacitismo (discriminação de pessoas com alguma deficiência) ainda é uma questão no atendimento PCD, seja ele presencial ou virtual. Uma loja adaptada precisa, por exemplo, de provadores acessíveis a cadeiras de rodas, mais espaço para circulação, araras de diversas alturas, sinalizadores de preços pensados para quem não vê ou enxerga pouco e treinamento em inclusão para vendedores. Em relação às compras online, é crucial usar fontes, cores e layouts inclusivos para uma variedade de necessidades visuais e cognitivas, além de disponibilizar vendas guiadas por navegação de voz e levar em conta embalagens que são fáceis de abrir quando chegam ao destinatário.

Mas a mudança mais importante para atender a esta demanda envolve praticar a inclusão. Empregar PCDs e integrá-los em cada processo da produção é o caminho certeiro. Quando indagado sobre sua posição como pioneiro neste movimento, o sr. Hilfiger responde com modéstia. “Isso não é sobre mim. Por muitos anos, as pessoas com deficiência tiveram que descobrir como se vestir com roupas feitas para as massas. É uma enorme alegria saber que isso está mudando.” Sem dúvida, um avanço.