Saúde

Por Ignacio J. Molina Pineda de Las Infantas* | The Conversation

Para nos defendermos adequadamente de qualquer patógeno que possa entrar em nosso organismo, as células do sistema imune devem estar em contínuo movimento, de maneira que exerçam um trabalho de vigilância até nos mais recônditos lugares de nosso corpo.

As células da imunidade inespecífica (granulócitos, macrófagos, células dendríticas, células NK e mastócitos, entre outras) têm uma distribuição muito dispersa, mas as células da imunidade específica se encontram sobretudo nos órgãos imunes secundários, em que se vai produzir a apresentação do antígeno e a estimulação dos linfócitos capazes de reconhecê-lo.

O caráter disperso do sistema imune apresenta três interessantes incógnitas muito difíceis de resolver: quantas células imunes temos, quantas temos exatamente em cada órgão e qual é seu peso total.

Um interessante estudo recém-publicado trata de responder a estas perguntas. Como contar uma a uma as células é completamente impossível, os autores usaram uma tripla estratégia.

Em primeiro lugar, realizaram uma extensa revisão bibliográfica, coletando todos os dados disponíveis referentes à presença de células imunes nos tecidos. De concreto, trataram de compilar as distintas densidades celulares, quer dizer, o número de células por grama de tecido, além de dados histológicos.

Em segundo lugar, empregaram imagens de células em canais múltiplos, uma nova tecnologia que permite identificar muitos biomarcadores de maneira simultânea. Isto permite reconhecer tecidos e fenótipos celulares complexos.

E, em terceiro lugar, lançaram mão da deconvulação baseada em padrões de metilação. Ainda que o nome possa parecer rocambolesco, a deconvulação celular consiste em estimar, mediante técnicas computacionais, a proporção de células que existe em um tecido concreto. Como cada célula tem um padrão de metilação característico, a combinação de ambas técnicas permite identificar as diferentes subpopulações celulares presentes em uma amostra.

Nosso sistema imune tem 1,8 trilhão de células

O uso e a validação cruzada destas três técnicas permitiu aos autores chegar à conclusão de que uma pessoa prototípica — isto é, homem de 20 a 30 anos, com 176 cm de altura e 73 kg de peso — tem um total de 1,8x10¹² células. Quer dizer, quase dois trilhões de células. São muitas, especialmente se levarmos em conta que os tecidos muscular e adiposo constituem 75% do total da massa corporal, mas que, por se tratarem de células muito grandes, só representam 0,2% de todas as células de nosso organismo.

A maioria das células imunes está em dois lugares: a medula óssea e o tecido linfático. A medula óssea contém cerca de 40% desta astronômica quantidade total de células — e cerca de 80% delas, neutrófilos. No tecido linfático estão 39% das células imunes, com um importante predomínio de linfócitos. A pele, os pulmões e o trato gastrointestinal abrigam, cada um deles, modestos 3% do total.

Distribuição das células imunes no corpo humano. Estimativas das populações de células imunes por tipo de célula e tecido agrupadas por tecidos e sistemas primários. GI significa ‘Trato Gastrointestinal’ — Foto: Ignacio J. Molina Pineda de las Infantas/The Conversation
Distribuição das células imunes no corpo humano. Estimativas das populações de células imunes por tipo de célula e tecido agrupadas por tecidos e sistemas primários. GI significa ‘Trato Gastrointestinal’ — Foto: Ignacio J. Molina Pineda de las Infantas/The Conversation

Os macrófagos, que têm uma escassa representação em muitos tecidos, se acumulam no fígado, onde representam 70% das células imunes deste órgão. Também residem aqui cerca de 30% de todas as células NK. Daí se deduz que o fígado tem um importante papel na resposta imune, em especial no que se refere à eliminação de antígenos que entraram pela via digestiva.

Se o sistema imune fosse um órgão sólido, pesaria mais de um quilo

O estudo oferece alguns achados surpreendentes. Por exemplo, que se o sistema imune fosse um órgão sólido, pesaria 1,2 kg. Ou teria quase o mesmo peso do fígado, considerado o maior e mais pesado órgão.

Deste 1,2 quilos, os macrófagos, que representam apenas 15% do total de células imunes, pesariam 600 gramas. E as ainda mais escassas células dendríticas pesariam outros 100 gramas mais. Por quê? Devido ao grande tamanho destes dois tipos de células, que se contrapõem aos pequenos linfócitos, que apesar de seu elevado número, só representariam menos de 200 gramas em seu conjunto. A massa de células imunes contidas na medula óssea e no tecido linfático é a mais relevante de todas (30% e 27% do total, respectivamente).

Não obstante, a maior surpresa está relacionada com o trato gastrointestinal. Diferentemente do que se pensava, aqui só estão cerca de 3% do total de células imunes, muito menos do que esperado. E resulta também surpreendente que no sistema digestivo se acumulem ao redor de 70% das células plasmáticas totais, que são as produtoras de anticorpos.

Olhando para o futuro

Este estudo é relevante porque combina múltiplas aproximações para resolver problemas que não permitem uma abordagem direta, e que poderia ser de interesse para determinar o número de células pertencentes a outras linhagens.

E o que é mais importante ainda, termos uma distribuição global das células do sistema imune pode nos ajudar a entender melhor sua organização global e, portanto, como modulá-lo para desenvolver terapias inovadoras.

*Ignacio J. Molina Pineda de las Infantas é professor de Imunologia no Centro de Investigação Biomédica da Universidade de Granada.

Este artigo foi publicado originalmente em espanhol no The Conversation.

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