Cientistas analisaram as condições meteorológicas que afetam o sul do Brasil entre o final de abril e início de maio e confirmaram que as mudanças climáticas tornaram as chuvas 15% mais intensas. O estudo foi publicado nesta sexta-feira (10).
Isso pode ter levado ao agravamento da tragédia no Rio Grande do Sul, que afetou 428 dos seus 497 municípios, deixando 107 mortos, de acordo com dados da Defesa Civil.
O estudo faz parte do projeto ClimaMeter que, com investimento da União Europeia e do Centro Nacional de Investigação Científica (CNRS) francês, mostra as mudanças climáticas sendo o principal fator para o agravamento das chuvas, embora o El Niño também tenha tido algum impacto.
“As tempestades que geraram chuva extrema nos últimos sete dias decorrem de complexa situação atmosférica formada sobre o Rio Grande do Sul. Os contrastes entre a onda de calor no centro do Brasil e o ar frio de origem antártica ao sul, associado a ciclones extratropicais, favorecem eventos extremos em um planeta mais quente”, conta Francisco Eliseu Aquino, climatologista e Chefe do Departamento de Geografia da Universidade Federal do Rio Grande do Sul, em comunicado.
Aquino complementa que o trabalho de investigação de eventos extremos realizado nas últimas décadas já previa que a mudança climática se somaria aos fatores naturais. Isso intensifica as ocorrências climáticas e meteorológicos extremos no mundo, principalmente no sul do Brasil.
Foram usados como base os dados meteorológicos dos últimos 40 anos, comparando os sistemas de baixa pressão no final do século 20 (1979-2001) com as últimas décadas (2002-2023), quando as mudanças climáticas se tornaram mais evidentes. Também foi levada em consideração a influência de fenômenos naturais, como o El Niño, que está atualmente em curso e é conhecido por aumentar a precipitação no sul do país.
A análise do consórcio concluiu que a chuva causada pelas enchentes massivas no estado, resultando na maior tragédia climática da região, foi intensificada pelas mudanças climáticas causadas pelo ser humano. Embora o El Niño e outros fenômenos naturais possam ter contribuído para agravar a situação, sua influência foi menor em comparação ao impacto do aquecimento global.
"Os achados do ClimaMeter destacam que as inundações no Rio Grande do Sul foram intensificadas pela queima de combustíveis fósseis, não pelo El Niño. Essas inundações impactam de forma desproporcional comunidades vulneráveis, que são injustamente sobrecarregadas pelas consequências, apesar de terem pouca responsabilidade pelas mudanças climáticas”, diz Davide Faranda, pesquisador do Instituto Pierre-Simon Laplace de Ciências do Clima e um dos autores do estudo.
A pesquisadora Luiza Vargas, da UFRGS, enfatiza que é possível reduzir os riscos associados às mudanças climáticas por meio da abordagem das questões em escalas regional e global. Isso pode ajudar a proteger vidas humanas e a limitar a frequência e a intensidade dos eventos climáticos extremos. Para isso, é necessário reduzir imediatamente as emissões de combustíveis fósseis e implementar medidas preventivas para proteger áreas vulneráveis dos efeitos de padrões de precipitação cada vez mais imprevisíveis. Essa tomada de decisões eficazes imediatamente é crucial para criar comunidades mais resilientes diante dos desafios climáticos que enfrentaremos no futuro.