Quando a população de um predador de topo diminui, é comum que um predador menor veja sua população crescer – afinal, nesse caso, a quantidade de recursos disponíveis aumenta ao passo que a competição por presas diminui.
No entanto, pouco se sabe sobre os efeitos do declínio de um predador de topo sobre a genética evolutiva de um predador menor. Por isso, um estudo publicado na revista Nature no último 8 de janeiro buscou entender essa questão a partir de uma análise do diabo-da-Tasmânia (ou demônio-da-tasmânia), espécie ameaçada de extinção, e do gato-tigre (Dasyurus maculatus), também conhecido como quoll rabo-manchado.
Os diabos-da-tasmânia têm sido afetados por um tipo de câncer letal infeccioso conhecido como doença tumoral facial dos diabos ou tumor facial do diabo-da-tasmânia (TFDT), que é transmitido por meio de mordidas. Sua população diminuiu em quase 70% de 1996 a 2020, indo de 53 mil indivíduos para pouco menos de 17 mil.
O diabo-da-tasmânia e o gato-tigre são marsupiais ativos à noite – período em que saem em busca de comida –, e também têm dietas são semelhantes. Como são maiores e mais agressivos, os diabos tendem a ser evitados pelos gatos-tigre.
Para a pesquisa, foram analisadas 3.431 variantes genéticas nos genomas de 345 quolls em 15 gerações. O objetivo era encontrar evidências de mudanças na variação e seleção de genes que pudessem estar associados à prevalência de DFTD nos diabos e à densidade populacional deles.
Os cientistas observaram nos quolls 12 variações genéticas ligadas justamente à densidade populacional dos diabos. Além disso, outras 10 variações estavam associadas ao número de anos em que a doença é predominante nesses predadores maiores. Entre esses genes, alguns são relacionados ao movimento e ao desenvolvimento muscular, bem como ao comportamento alimentar.
Além disso, foi verificado que quolls que viviam em regiões com taxas semelhantes de disseminação de TFDT eram geneticamente mais parecidos entre si do que aqueles com taxas diferentes da doença das densidades populacionais de diabos-da-tasmânia.
E se, por um lado, a distribuição de variação genética está crescendo entre os quolls, a troca genética – isto é, o movimento de genes para dentro ou fora das populações – está diminuindo. Isso pode acontecer devido à falta de necessidade dos quolls se movimentarem tanto em áreas em que não há mais uma população de diabos-da-tasmânia. Deslocando-se menos, esses pequenos predadores têm menos chances de encontrar outras populações da sua espécie.
"Menos trocas genéticas entre as populações acabará levando a uma menor diversidade genética dentro das populações. E isso tem consequências evolutivas", disse Andrew Storfer, geneticista evolucionário da Universidade Estadual de Washington, nos EUA, à Nature. "E nós realmente não sabemos quais são elas."