• Redação Galileu
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Pesquisa detecta alterações no DNA de pessoas que sofreram abusos na infância (Foto: Pixabay / qimono)

Cientista planeja realizar alterações no DNA de bebês (Foto: Pixabay / qimono)

O biólogo molecular Denis Rebrikov afirma que pretende editar os genes de bebês humanos e colocar em prática seus experimentos até o final deste ano. Para seguir com o planejamento de inseminar embriões modificados em mulheres, ele deve receber a  permissão do governo, como afirma a revista científica Nature. Rebrikov seguiria os passos do cientista chinês He Jiankui, responsável por anunciar em novembro de 2018 que gerou os primeiros bebês geneticamente modificados. 

Rebrikok diz que seu experimento terá como alvo o mesmo gene usado por Jiankui, o chamado CCR5. Mas Rebrikov afirma que sua técnica oferecerá maiores benefícios, representará menos riscos e será mais eticamente justificável e aceitável para o público. O biólogo russo dirige um laboratório de edição de genoma na maior clínica de fertilidade da Rússia, o Centro de Pesquisa Médica Nacional Kulakov para Obstetrícia, Ginecologia e Perinatologia, em Moscou, e é pesquisador da Universidade Russa de Pesquisa Russa Pirogov, também em Moscou. 

Ele afirma que planeja desativar o gene que codifica uma proteína que permite que o HIV entre nas células em embriões que serão implantados em mães HIV-positivas, reduzindo o risco de transmitirem o vírus para o bebê no útero. De acordo com Rebrikov, ele já tem um acordo com um centro de HIV na cidade para recrutar mulheres infectadas com HIV que querem participar do experimento.

A Nature contatou cientistas e bioeticistas contatados para saber suas opiniões sobre o plano de Rebrikov. "A tecnologia não está pronta", diz Jennifer Doudna, bióloga molecular da Universidade da Califórnia em Berkeley, que foi pioneira no sistema de edição de genoma CRISPR-Cas9 que Rebrikov planeja usar. Já Alta Charo, pesquisadora em bioética e direito na Universidade de Wisconsin-Madison, diz que os planos de Rebrikov não são um uso ético da tecnologia. "É irresponsável prosseguir com este protocolo neste momento", acrescenta Charo, que participa de um comitê da Organização Mundial da Saúde que está formulando políticas de governança ética para a edição do genoma humano.

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O russo Denis Rebrikov durante uma palestra em 2010 (Foto: Reprodução/ YouTube)

O russo Denis Rebrikov durante uma palestra em 2010 (Foto: Reprodução/ YouTube)

O biólogo encontra outro desafio em seu projeto, já que a implantação de embriões geneticamente modificados é proibida em muitos países. No caso da Rússia, existe uma lei que proíbe a engenharia genética na maioria das circunstâncias, mas não está claro se ou como as regras seriam aplicadas em relação à edição de genes em um embrião. Rebrikov afirma que espera que o Ministério da Saúde esclareça as regras sobre o uso clínico da edição genética de embriões nos próximos nove meses e que sente um senso de urgência para ajudar as mulheres portadoras do vírus HIV.

Uma razão pela qual os embriões geneticamente modificados criaram um enorme debate global é que, se permitida a transformação em bebês, as edições podem ser passadas para gerações futuras — uma intervenção de longo alcance conhecida como alteração da linhagem germinativa. Os pesquisadores concordam que a tecnologia pode, um dia, ajudar a eliminar doenças genéticas, como a anemia falciforme e a fibrose cística, mas muito mais testes são necessários antes de serem usados em seres humanos.

Rebrikov afirma que planeja implantar embriões apenas em um subgrupo de mães HIV positivas que não respondem aos medicamentos anti-HIV, em que o risco de transmitir a infecção para a criança é maior. Se a edição desabilitar com sucesso o gene CCR5, esse risco seria bastante reduzido, afirma o pesquisador russo. "Esta é uma situação clínica que exige esse tipo de terapia", diz ele.

Ainda assim, a maioria dos cientistas diz que não há justificativa para editar o gene CCR5 em embriões porque os riscos não superam os benefícios. Mesmo que a terapia siga o planejado, e ambas as cópias do gene CCR5 nas células estejam desativadas, ainda há uma chance de que esses bebês possam se infectar com o HIV. Acredita-se que a proteína da superfície celular codificada pelo CCR5 seja a porta de entrada para cerca de 90% das infecções por HIV, mas se livrar dela não afetará outras rotas de infecção pelo HIV.

He Jiankui, médico chinês, fez os primeiros bebês geneticamente modificados (Foto: Reprodução/YouTube)

He Jiankui, médico chinês que realizou a primeira edição genética de bebês (Foto: Reprodução/YouTube)

Os primeiros bebês geneticamente modificados 
Em novembro do ano passado, o cientista chinês He Jiankui afirmou durante a Segunda Cúpula Internacional sobre a Edição do Genoma Humano que seu projeto de editar genes humanos foi realizado com sucesso: de acordo com o pesquisador, duas meninas gêmeas que passaram por alterações genéticas para serem resistentes à infecção por HIV nasceram saudáveis naquele mês. O cientista afirmou que realiza esse trabalho há três anos, conduzindo os experimentos em segredo.

A repercussão negativa na comunidade científica internacional foi imediata e Jiankui passou a ser investigado pelo governo chinês. Em entrevista à emissora CCTV, o vice-ministro da Ciência e Tecnologia, Xu Nanping, afirmou que a edição humana de genes é ilegal e inaceitável. "O incidente envolvendo os bebês geneticamente modificados violou descaradamente as leis e regulações relevantes do nosso país", afirmou o político.

A Universidade de Ciência e Tecnologia do Sul, localizada na província de Shenzhen e a qual Jiankui era vinculado, abriu uma investigação para averiguar o projeto conduzido pelo médico e disse em comunicado que não tinha conhecimento da realização desse trabalho. Desde então, o cientista é mantido sob guarda em seu apartamento e não deu mais declarações públicas. 

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