"Minhas gêmeas estavam lutando pela vida dentro do útero, mas contrariando as expectativas, hoje estão saudáveis", relata mãe

Os médicos chegaram a discutir com Laura Watson, de 29 anos, a possibilidade de interromper a gravidez quando suas gêmeas desenvolveram uma condição que colocava as vidas de ambas em risco dentro do útero. Entenda

Por Crescer online


Uma mãe da Irlanda do Norte compartilhou sua alegria após a recuperação milagrosa de suas gêmeas prematuras, que estavam enfrentando uma situação perigosa dentro do útero. Em entrevista ao tabloide britânico The Mirror nesta quarta-feira (12), Laura Watson, 29 anos, relembrou momentos de extrema preocupação que passou durante a gravidez, chegando ao ponto de não comprar roupas de bebê devido às incertezas sobre a sobrevivência de suas filhas.

Disseram à mãe Laura que era improvável que suas filhas sobrevivessem — Foto: Reprodução Mirror

As gêmeas foram diagnosticados com Síndrome de Transfusão Feto-Fetal, uma condição que afeta o fluxo sanguíneo entre os dois bebês, resultando em um desenvolvimento desigual. Os médicos do Royal Jubilee Maternity Hospital, em Belfast, na Irlanda, indicaram um procedimento especializado que ajudaria a equilibrar o fluxo sanguíneo e os nutrientes entre as bebês para postergar o parto o máximo possível, a fim de dar às duas uma "chance de lutar" após o nascimento.

"Eu não tinha opções fáceis. Elas estavam lutando entre si no útero. Disseram-me que eu não poderia fazer nada e que provavelmente perderia ambas ou teria que fazer uma cirurgia com uma taxa de sobrevivência de 30%. Até me perguntaram se eu gostaria de interromper a gravidez. Mas eu não conseguiria fazer isso, eu tive que dar uma chance para ambas", disse a mãe ao tabloide britânico Mirror.

Embora soubesse que era extremamente arriscado, a família viajou para a Inglaterra, para fazer o procedimento no St George's Hospital, em Londres. Os cirurgiões realizaram uma cirurgia de ablação intrauterina a laser, um procedimento que visa desconectar os vasos sanguíneos para distribuir os nutrientes de forma mais equilibrada para cada bebê, mas, infelizmente, a cirurgia não teve o efeito desejado. Após cinco semanas, um exame revelou que a gêmea menor estava sofrendo de anemia grave devido à diminuição do fluxo sanguíneo.

Diante dessa situação, os médicos optaram por realizar uma cesariana de emergência, na 23ª semana de gestação, para garantir a segurança e o bem-estar das bebês. "Os médicos nos disseram que elas estariam mais seguras fora do útero - foi aterrorizante", disse Laura.

Laura com as filhas na maternidade e agora em casa — Foto: Reprodução Mirror

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Assim, às 13h08 do dia 3 de outubro de 2022, a primeira bebê, Meabh Weir, veio ao mundo pesando cerca de 650g . Pouco depois, às 13h09, sua irmã, Clodagh Weir, nasceu pesando cerca de 700g. "Quando finalmente as seguramos, nem consigo encontrar palavras para descrever a intensidade daquele momento. Perdi a esperança durante a gravidez e simplesmente não conseguia acreditar que elas haviam sobrevivido ao parto", diz. Clodagh precisou ficar na UTI Neonatal por 63 dias, enquanto sua irmã, Meabh, permaneceu por 82 dias. Devido à pressão adicional no útero, Clodagh desenvolveu um defeito cardíaco congênito, o que exigirá acompanhamento ao longo da vida.

Apesar das dificuldades enfrentadas durante a gravidez, as gêmeas, agora com nove meses, estão bem depois de passarem meses no hospital. "Eu nunca imaginei que traria as duas para casa depois de tudo o que passamos. Agora elas estão aqui, são felizes e eu ainda não consigo acreditar. Meabh é muito descontraída e adora se divertir rolando pelo chão, enquanto Clodagh é uma apaixonada por abraços", acrescentou Laura, que também é mãe de James, de 3 anos.

Entenda a Síndrome de Transfusão Feto-Fetal

A condição rara pode acontecer em gestações gemelares apenas nos casos em que os dois fetos dividem a mesma placenta e saco gestacional (gestação monocoriônica). Também chamada de Sequência Poliúria-oliguria dos Gêmeos, ela atinge de 10% a 15% desse tipo de gestação.

Por que acontece?

A síndrome é causada pela conexão vascular entre os bebês, por meio de veias ou artérias do cordão umbilical interligadas, fazendo com que o sangue seja distribuído de maneira desequilibrada. “Diferente do que alguns dizem, esse desequilíbrio não está relacionado com a absorção maior ou menor de nutrientes, ou seja, um bebê não 'rouba' os nutrientes do outro. O que ocorre, na realidade, é que o volume de sangue fica desigual entre os bebês. Um feto torna-se receptor e o outro doador”, explica o ginecologista Javier Miguelez, especialista em medicina fetal, de São Paulo.

Quais são as consequências?

São diferentes para cada gêmeo: o chamado “receptor” fica com um volume excessivo de sangue, o que faz o coração precisar trabalhar mais, causando uma hipertrofia do músculo. “Além disso, por conta dessa absorção, a eliminação de liquido é maior e a bexiga se dilata. E por isso o saco gestacional deste fica com uma quantidade maior de líquido amniótico (em sua maior parte constituída por urina fetal)”, diz Javier. Já o gêmeo doador, justamente por estar doando o sangue que deveria ser consumido por ele, desenvolve-se menos e a bexiga fica menor, já que o sangue não é filtrado e com isso, o volume de líquido amniótico é baixo.

Como é feito o diagnóstico?

O momento ideal para identifica-la é entre 8 e 10 semanas. O diagnóstico também pode ser feito com segurança durante a ultrassonografia morfológica de primeiro trimestre, com 12 semanas. A síndrome dá sinais entre a 16ª e 24ª semana, sendo muito raro aparecer antes ou depois. Esse período é de extrema importância nas gestações monocoriônicas. “É a avaliação cuidadosa que permitirá a identificação do problema. A avaliação da membrana amniótica é o principal critério para fazer o diagnóstico, pois o bebê doador geralmente fica comprimido e a membrana fica grudada, o embala, por conta da menor quantidade de líquido amniótico”, explica Javier.

O médico ressalta a importância de se procurar um especialista em medicina fetal, pois as características podem confundir quem não tem experiência no assunto, podendo acarretar o atraso do diagnóstico e até impossibilitar o tratamento. “Embora seja mais comum o receptor ser maior que o doador, a diferença de tamanho entre os bebês não é um critério do diagnóstico e não tem importância para o prognóstico”, completa o especialista. O importante é a distribuição do líquido amniótico.

Como é o tratamento?

Identificado o problema, há casos em que a distribuição do sangue retoma o equilíbrio, por isso há uma classificação do estágio em que a doença está. Com algumas exceções, é a partir do segundo estágio que a intervenção deve ser realizada. “Nesses casos, a mortalidade dos fetos é de mais de 90%, caso o diagnóstico não tenha sido feito no momento certo e o tratamento correto realizado”.

O tratamento utilizado na medicina moderna é a intervenção intrauterina chamada “coagulação a laser por fetoscopia”, que além da retirada do excesso de líquido amniótico, coagula os vasos sanguíneos e transforma a placenta única funcionalmente em duas. “A coagulação visa impedir o maior desequilíbrio da circulação sanguínea dos fetos. Os casos de sucesso chegam a 80% das intervenções realizadas”, explica.

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